quarta-feira, 20 de abril de 2011

Despertar árabe e excepcionalismo da Síria





Alastair Crooke





7/4/2011, Alastair Crooke, Foreign Policy

“The Arab awakening and Syrian exceptionalism”



Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu



“Se a Síria, que é muito mais importante, na escala regional, que a Líbia, e ameaça muito mais diretamente Israel, alcançar qualquer melhor democracia, numa transição pacífica, com Assad ou sem ele, mediante levante civil ou pela via de reformas que Assad conceda ou o povo conquiste, as ‘potências ocidentais’ terão motivos muito mais poderosos para atacar a Síria... do que tiveram para sua leviana, mal pensada, temerária invasão à Líbia de Muammar Gaddafi”.(em “Interessante, sobre a Síria”, 26/3/2011, Simon Tisdall, The Guardian, UK, traduzido )







A clivagem na cultura política entre o doméstico e o externo não poderia ser mais bem ilustrada que na fala televisionada do presidente Bashar Assad, dia 30 de março, quando se dirigiu ao povo sírio. O presidente estava visivelmente cansado, com expressão exausta e perturbada, e a fala foi recebida em todo mundo com desdém – considerada insuficiente e mal pensada.

Mas na Síria, onde eu estava, o efeito foi muito diferente, pelo menos para grande parte dos sírios. Entender por que as reações foram tão divergentes, ajuda a ver uma outra lógica por trás daquela fala, em tudo diferente da lógica que se viu ativa nos comentários políticos que a imprensa ocidental divulgou pelo mundo. A seu modo, o evento mostra o quanto a situação de Assad é profundamente diferente da de Mubarak ou Ben Ali – os únicos parâmetros pelos quais a situação de Assad tem sido analisada sobretudo no ocidente.



A cultura ocidental entende que crises gravíssimas exigem formalidade absoluta: o presidente deve aparecer sempre com rosto sério, sentado à uma imponente mesa de trabalho, exibindo todos os símbolos da autoridade, com bandeiras artisticamente dispostas ao fundo, tudo para sublinhar a gravidade do momento. Mas Assad fala sem pompa ao parlamento, veste-se sem formalidade e às vezes ri. Algumas vezes conversa descontraído, com quem esteja à frente. “Pouco presidencial”, devem ter pensado vários analistas ocidentais, que concluíram: “e sem especificidade no que diga respeito a reformas”.



Para os sírios, a situação é outra: Assad nunca é formal e, exceto pela fisionomia cansada, era, na fala de março, o mesmo homem que os sírios conhecem: um presidente jovem, que não se deixou ossificar nem pelo tempo nem pela ritualidade do poder e das convenções. Os sírios que o ouviram falar viram, bem claramente, que, sim, Assad acredita em reformas. A idéia de que Assad não é presidente à antiga é amplamente majoritária na população síria, inclusive por muitos dos que estão saindo às ruas para manifestar-se. Muitos sírios sabem que Assad não ordenou e, sim, que proibiu, que as forças de segurança atirassem contra os manifestantes. Essa é profunda diferença entre a Síria e, digamos, o Egito. No Egito, a rua sabia que Mubarak jamais, nunca, em nenhum caso, aceitaria reformas. Os sírios sabem que Assad é, por instinto e convicção, reformista.



Em vários sentidos, a fala de Assad foi extremamente audaciosa – cuidadosamente calibrada mais para o específico contexto sírio, não para o contexto mais amplo de outros estados árabes, e atenta ao fervor revolucionário que agita o mundo. Em entrevista que deu em janeiro ao Wall Street Journal [1], Assad já falara muito claramente sobre a absoluta necessidade de reformas internas e sobre a importância de os cidadãos sentirem-se respeitados em sua dignidade:



“Trata-se de ter de fazer alguma coisa para mudar, e a Síria tem de manter-se afinada com as mudanças, como estado e como instituições (...). Trata-se de um sentimento popular, o povo sente-se digno e respeitável, e quer participar das decisões políticas do país. Essa é outra questão importante: não se pode governar sem íntima conexão com as crenças e desejos do povo. Essa é a questão central. Se há divergência entre as políticas de estado e o que o povo pensa, sente e quer, cria-se um vácuo no qual prosperam todas as agitações. As pessoas não vivem só pelos interesses, vivem também pelas coisas nas quais creem e pelas coisas que desejam”.



Muito claramente, Assad, desde janeiro, já se comprometia com as reformas. Na fala de março, ele repetiu: “Sem reformas, estamos no caminho da destruição”, mas optou deliberadamente por não oferecer uma lista de concessões aos que se manifestavam nas ruas. Essa opção foi o aspecto mais cuidadosamente deliberado do discurso de março. Lembremos que o estado sírio não estava ameaçado. Ninguém desertou do governo e o exército continua leal ao governo de Assad. As manifestações em Daraa não prosperaram em outras cidades. As manifestações contra o governo em Damasco, Aleppo e Hama, três das maiores cidades da Síria, foram mínimas, se comparadas às massivas manifestações de apoio ao governo, nas mesmas cidades.



Mesmo em Daraa, onde houve as maiores demonstrações e onde os manifestantes foram atacados a tiros, os habitantes da cidade afirmam saber quem, da Polícia, ordenara os tiros e a quem está ligado. É verdade que as pessoas estão furiosas demais para serem usadas como fontes fidedignas de informação, mas a fúria das ruas não se dirige contra o presidente.



A imprensa ocidental simplificou o contexto sírio, até reduzi-lo a uma questão de ou branco ou preto, em termos de “o presidente fará reformas ou enterrará as reformas?” De fato, não é essa a questão na Síria – embora seja quase essa, na maior parte do mundo árabe. Não há qualquer disputa sobre fazer ou não fazer as reformas: o que a Síria discute é como proceder. O verdadeiro debate se trava sobre como melhor implementar as reformas, de forma a não permitir que sejam usadas por uma minoria, para desacreditar o processo e, no final, degradar e até bloquear qualquer reforma.



Assad já reconhecera implicitamente a insatisfação nacional com a administração do estado (muitas vezes inepta e quase sempre corrupta). Também já reconheceu que a nova consciência popular no mundo árabe exige que haja real participação de todos nas tomadas de decisões. Mas, simultaneamente, afirmou que, no plano internacional, a Síria manteve-se do lado certo da história – um ponto chave, que distingue a Síria dentre a maioria dos estados árabes: Assad sempre se opôs à invasão do Iraque e sempre apoiou a resistência palestina.



Para o Wall Street Journal, Assad destacou que, em termos de política exterior, seu governo sempre esteve intimamente conectado ao núcleo duro das crenças e ideologia da maioria dos sírios – o que o torna completamente diferente de outros governantes árabes, como Mubarak, que era tido, no mundo árabe, como fantoche do ocidente e de Israel. E Assad disse, bem claramente, que se trata, nas reformas, de aplicar esse mesmo princípio, também na esfera doméstica, nacional.



As posições da Síria, no cenário internacional, deram a Assad forte popularidade na região e em seu país. Mas, simultaneamente, atraíram inimigos poderosos contra a Síria. É claro que muitos, na região e fora de lá, atribuiriam ao governo de Assad qualquer incômodo que a política externa da Síria gerasse, investindo assim na possibilidade de enfraqucê-lo internamente. Assim como muitos entendem que a queda de Mubarak enfraqueceu o Fatah, assim também muitos esperam que uma eventual derrubada do governo de Assad enfraquecerá o Hamás e o Hezbollah.



Em Israel, comentaristas políticos não se cansam de sugerir nas últimas semanas, que o despertar das populações árabes pode levar a resultado que interessa a Israel: com Assad “mais democrático”, aproxima-se o momento de Assad ser obrigado a desistir de sua militância a favor do eixo da resistência palestina e aceitar a paz com Israel. Israel não está sozinha nessa empreitada: outros governos árabes acalentam a mesma esperança, menos declaradamente, e embora menos preocupados com alguma paz com Israel e mais interessados, isso sim, em enfraquecer o braço islâmico da resistência, que vêm como ameaça à sobrevivência de suas respectivas ditaduras.



A ameaça de intervenção na Síria, sobretudo pelos serviços secretos ocidentais, não é efeito de delírio ou mania de perseguição. Tem sido tema sempre presente ao longo dos anos, e ninguém duvida de que o governo de Assad tenha relatos de inteligência e provas bem documentadas de ações planejadas na Europa, Arábia Saudita e Jordânia, para gerar agitação interna na Síria e inflá-las até uma confrontação fortemente polarizada. Deve preocupar-nos, sobretudo, a evidência de que Sheikh Yusuf al-Qaradawi já caracterizou as manifestações na Síria como “divisão sectária”: seria um conflito entre sunitas governados por alawita (Assad é alawita). Em Latakia, há provas de que houve tentativas de implantar essas divisões sectárias.



Nessas circunstâncias, o que significam as massivas manifestações pró-Assad? Parece-me que muitos dos que saem as ruas já conhecem o dano que as disputas sectárias causaram ao Iraque (há mais de um milhão de refugiados iraquianos na Síria); e muitos também estão irados contra a intervenção de exércitos ocidentais na Líbia, onde já se criou ameaça de guerra civil. Os sírios já viram acontecer antes, exatamente como veem acontecer agora. Os sírios também querem reformas: partilham a opinião de Assad, que quer reformas, e manifestam-se, nas ruas, contra os que os sírios veem como agitadores que visam, exatamente, a mergulhar o país em disputas internas, que podem levar à guerra civil, que destruirá qualquer esperança de reformas. Muitos sírios suspeitam que qualquer ideia de reforma, que chegue à Síria de fora para dentro, venha como Cavalo de Troia, usado contra a Síria e, mais amplamente, contra todo o eixo da resistência.



Assad, pois, na fala de março, dirigiu-se aos que o acompanham dentro da Síria e a favor da resistência pró-Palestinos – grupo de opinião que existe difuso, mas não existe constituído, em nenhum outro estado da região. Os manifestantes pró-Assad esperavam – e receberam do presidente – um sinal de autoconfiança. Ao mesmo tempo em que receberam, formalizada, a promessa de reformas. Agora, os sírios pró-resistência contra Israel e favoráveis às reformas, passam a esperar que Assad cumpra o que prometeu.



Nada autoriza a suspeitar que Assad venha a esquecer a promessa de por fim às leis de emergência, que não levante as restrições à imprensa e não sancione leis que permitam a formação de partidos políticos. Tudo autoriza a esperar que cumprirá, rapidamente, o que prometeu. Evidentemente, o sucesso desse projeto depende crucialmente de o presidente Assad conseguir controlar as forças organizadas contra ele, contra seu governo e contra a resistência palestina, e de que, assim, consiga fazer parar os ataques a tiros contra manifestantes.



Se Assad for bem sucedido no seu projeto de reformas – e até aqui parece continuar a andar nessa direção – começa a fracassar a previsão, já divulgada por muitos analistas ocidentais, de que Assad sairia enfraquecido, em contexto de maior participação popular democrática, na Síria.



Parte importante da popularidade pessoal de que Assad goza em seu país é resultado direto das posições de seu governo no contexto da política externa, área em que se tem mantido muito próximo do sentimento popular. Muito mais provável é que Assad saia fortalecido da atual crise, num contexto de Síria com mais e melhor democracia, e com a Síria reposta no caminho de volta à sua posição central tradicional na política do mundo árabe. Corretamente explicada e entendida, uma Síria democraticamente fortalecida, e com Assad, garante melhores chances de sucesso na solução das atuais tensões no mundo árabe, do que cria algum risco de agravá-las.



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Operação Alvorada Da Mudança De Regime






Pepe Escobar






20/4/2011, Pepe Escobar, Asia Times

Mission regime changeTraduzido pelo pessoal da Vila Vudu




Como se converte uma “ação militar cinética” – não há guerra – em algum tipo de arremate de males, desrespeitando uma resolução da ONU que só foi aprovada para minimizar grave ameaça de tragédia humanitária? Basta publicar coluna de pé quebrado em qualquer jornal. Foi o que fizeram Los Tres Amigos – o presidente dos EUA Barack Obama, o primeiro ministro David Cameron e o neonapoleônico presidente da França, Nicolas Sarkozy.



Em coluna conjunta publicada na 6ª-feira, 15/4 [1], Los Tres Amigos insistiram que não querem derrubar Muammar Gaddafi da Líbia, pela força. Mas continuam a insistir na via de implantar democracia à bomba (supostamente para proteger civis que lutam pela democracia). E tudo isso, porque Gaddafi “deve sair e sair por bem [2]”.



E que se dane o mandato original da ONU. E que se dane qualquer cessar-fogo. O ocidente “ilustrado” e sua coalizão de semivontades não querem cessar-fogo, embora os BRICS – os principais poderes emergentes, Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – tenham oficialmente condenado o bombardeio e exigido uma muito necessária reforma do Conselho de Segurança da ONU.



O presidente russo Dmitry Medvedev acusou a minúscula coalizão de semivontates e a OTAN de agirem como braço armado dos ‘rebeldes’. Em suas palavras, “as forças da ONU deveriam ajudar a desarmar os dois lados, e em nenhum caso poderiam deixar um dos lados sem qualquer assistência.”



No que tenha a ver com Washington, Londres e Paris, não interessa o que se diga. Agora é oficial. O bombardeio prosseguirá até não haver mais Gaddafi. É a Operação Alvorada da Mudança de Regime.



A história se repete



Não surpreende que toda a resolução 1.973 aí esteja, exposta como a farsa que é – como é farsa também a “revolução” líbia fabricada, essencialmente orquestrada pelo serviço secreto francês, pelo M16 dos britânicos e pela CIA-EUA desde que o ex-chefe de cerimonial de Gaddafi, Nuri Mesmari, desertou para Paris, em outubro de 2010.



Abundam os exilados do mesmo tipo – da rede do príncipe Mohammed el-Senoussi apoiado pelos britânicos e atualmente exilado em Londres, a Khalifa Hilter, ex-agente da CIA que até há pouco tempo vivia perto de Langley, na Virginia, de onde partiu de volta à Líbia onde se autonomeou “comandante militar” dos “rebeldes”.



Os “rebeldes” agora querem que a zona aérea de exclusão atabalhoadamente “implementada” pela OTAN seja convertida – farsescamente – em corredor para suprimento de armas: espécie de reprise em pleno século 21 do que foi feito nos anos 1980s no Afeganistão para armar os mujahideen; daquela vez, onde hoje estão Arábia Saudita, Paquistão e os EUA, lá estavam Grã-Bretanha, França e o Qatar.



E, sim, mais cedo do que se pensa, haverá coturnos (ocidentais) em solo – dado que a narrativa já começa a ser implantada pela mídia-empresa atlântica.



Próximo capítulo de glórias: uma coluna dos gloriosos tanques M1 Abrams toma Trípoli, com pique de cavaleiros cruzados, os ‘revolucionários’ farrapos recebidos com flores (Se você vai à Tripolitania, “não esqueça de por flores no cabelo” [3]). Não deu certo em Bagdá em 2003 sob patrocínio neoconservador; vai-se ver, talvez funcione em Trípoli patrocinado por imperialismo humanitário.



Com os “rebeldes” embaçados nessa viagem de Lucy in the Sky with Diamonds, não surpreende que tenha dado em nada a missão da União Africana que tentava estabelecer um cessar-fogo. O que esses rebeldes com causa não sabem é que a única causa que conta é a causa dos chefes deles. São rebeldes completamente descartáveis, como foram descartáveis os “contras” na Nicarágua e os mujahideen afegãos.



Me levem prá Somália



Tampouco surpreende que o tema apocalíptico da hora seja “Somália”. Dia 2 de março, a secretária de Estado dos EUA Hillary Clinton alertou para o perigo de a Líbia converter-se “numa Somália gigante”. Dia 30 de março, o ex-ministro do exterior e atual elogiado desertor Moussa Koussa disse que temia uma guerra civil, sob a qual “a Líbia virará uma nova Somália”.



A “intervenção humanitária” primeiro do AFRICOM-EUA, depois da OTAN, está de fato criando todas as condições para a somalização da Líbia. A muralha de animosidade e desconfianças que cresceu entre o governo de Gaddafi e os “rebeldes” já é insuperável e pode, sim, degenerar em Somália.



A repressão que Gaddafi impôs ao que, essencialmente, foi uma tentativa de golpe de Estado e se metamorfoseou em revolta armada, foi brutal. Não se discute a brutalidade da repressão. Mas nada disso sequer se aproxima da definição de genocídio e nem de longe justifica a reação R2P (“responsabilidade de proteger”). Pelo mesmo critério, a ONU teria de mandar a OTAN implantar zona de exclusão aérea também se a China ameaçar reprimir uma insurreição no Tibete.



E, francamente, é piada trágica, cruel, cumprir, com bombardeio, a responsabilidade de proteger. Sobretudo se se compara o bombardeio em curso com a nenhuma reação, reação zero, da ONU e da OTAN, ao massacre real, verdadeiro, massacre hardcore, em 1991, quando quem reprimia rebeliões de massa era Saddan Hussein, no norte e no sul do Iraque. Ali morreram 200 mil iraquianos. Na Líbia houve repressão, mas não houve genocídio. No Iraque de Saddam, sim, houve genocídio.



No Iraque em 1991, Washington ativamente incitou os xiitas a rebelarem-se contra Saddam – exatamente como, hoje, a CIA ajuda os “rebeldes” líbios contra Gaddafi. E depois, em 1991, quando a matança começou, Washington fez absolutamente nada. E havia lá, sim, implantada, uma zona aérea de exclusão (os EUA levantaram aquela zona aérea de exclusão, para que os aviões de Saddam pudessem metralhar xiitas sem obstáculos). Farsa, farsa, a mãe de todas as farsas.



A agenda do Pentágono



Do ponto de vista do Pentágono, Gaddafi é grave estorvo: está impedindo o “progresso” do AFRICOM; comanda faixa de litoral estrategicamente crucial do Mediterrâneo; e negocia com a China. Nacionalista, com extensão africanista, ao dar acesso à China até o Mediterrâneo, Gaddafi se candidata ao posto de inimigo n.1 da agenda do AFRICOM, que quer militarizar a África a serviço dos EUA. Gaddafi tem de ser, no mínimo, isolado.



Mas derrubar Gaddafi não é prioridade. O Pentágono dispõe-se a negociar, ou não negociar, com um Gaddafi encurralado numa Tripolitania miserável. O que o Pentágono não quer é ter de enfrentar uma Líbia poderosa, unificada, que pode no futuro levantar-se contra os desígnios imperialistas do ocidente. O Pentágono “vota” pela balkanização da Líbia.



No momento, o Pentágono – via AFRICOM e OTAN – está cuidando do Grande Quadro, no ar e nos mares, ao mesmo tempo em que terceiriza eventuais operações em terra, entregues aos subalternos europeus. Vai tudo muito bem – o Sudão foi dividido, e a somalização da Líbia parece próxima. Quando os coturnos pisarem o chão, serão coturnos dos subalternos europeus. Vejam a França, por exemplo, na Costa do Marfim.



Mais tumulto está por vir. A OTAN, como braço armado da ONU, já está, de fato, com os coturnos em terra, Se a OTAN livrar-se de Gaddafi, o próximo alvo é a Síria. Assim como a Líbia garante aos chineses acesso comercial ao sul do Mediterrâneo, a Síria garante à marinha russa acesso ao leste do Mediterrâneo.



A agenda de Pentágono/OTAN/AFRICOM-EUA não mudará. Para evitar qualquer real emancipação do mundo árabe. Para evitar qualquer real emancipação ou unidade continental na África. Com todos seus muitos erros como governante, Gaddafi é mau exemplo. Com o espectro das chantagens do FMI rondando todos os países africanos mais pobres, Gaddafi financiava projetos de desenvolvimento locais nos países africanos.



Não se trata só da Líbia, não, longe disso. O que estamos vendo é a mensagem das elites governantes em Washington – e de suas satrapias em Londres e Paris – dirigida à África. Daqui partimos diretamente para a subjugação militar da África e para o controle dos recursos naturais da África. Continuem a negociar com a China, e vão ver o que acontece com vocês. Com a OTAN como Robocop global, nada nos deterá – com ou sem mudança de regime. E, aconteça o que acontecer, defenderemos a farsa.