segunda-feira, 6 de junho de 2011

Procurador Geral diz que Palocci não cometeu nenhum crime.

PGR arquiva representações contra Palocci
Imprimir 6/6/2011

De acordo com Roberto Gurgel, representações não apresentam fatos que justifiquem instauração de inquérito

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, decidiu pelo arquivamento das representações contra o ministro-chefe da Casa Civil, Antônio Palocci. As representações foram apresentadas pelo deputado federal Rubens Bueno e pelos senadores Álvaro Fernandes Dias, Itamar Augusto Cautiero Franco, Demóstenes Lazaro Xavier Torres, Randolph Frederich Rodrigues Alves e Jarbas de Andrade Vasconcelos, solicitando a apuração do crime de tráfico de influência e possível prática de improbidade administrativa.

De acordo com Gurgel, “a lei penal não tipifica como crime a incompatibilidade entre o patrimônio e a renda declarada”. Ele explica que tal fato só configura crime quando a origem do dinheiro é ilícita, o que não é possível concluir a partir das informações constantes das representações e daquelas enviadas nos esclarecimentos prestados pelo representado. “As quatro representações não vieram instruídas com qualquer documento. Nenhum elemento que revelasse, ainda que superficialmente a verossimilhança dos fatos relatados”, informa.

“A mera afirmação, articulada de forma genérica e desacompanhada de qualquer elemento indiciário, de que o representado adquiriu bens em valor superior à renda que auferiu como parlamentar, não enseja evidentemente a instauração de inquérito. A uma, porque, como visto acima, o fato isoladamente considerado não constitui crime – o que seria suficiente para impedir a realização de atos investigatórios -, e, a duas, também porque não permite a especificação de eventuais diligências que pudessem ser requeridas ao órgão judicial”, esclarece o procurador-geral.

Gurgel argumenta que o deferimento de diligências para comprovar a existência do crime necessitam de indícios concretos da sua existência e que os fatos apresentados não apresentam causa que justifique a quebra de sigilos do representado, de sua empresa ou de eventuais clientes.

“Segundo o que consta dos documentos apresentados pelo representado, especificamente as Declarações de Informações Econômico Fiscais, a empresa Projeto, da qual o representado foi sócio administrador desde a sua constituição, em julho de 2006, até a 4ª alteração contratual, em junho de 2010, não celebrou contrato com pessoa jurídica de direito público nem gozou de favores decorrentes de contratos dessa natureza, o que afasta eventual suspeita de que o representado agiu ilicitamente ao manter-se na administração da Projeto durante o período em que exerceu o mandato parlamentar”, explica Gurgel.

Para o PGR, “a despeito da insuficiência absoluta de indícios”, a enorme repercussão do caso talvez recomendasse a continuidade da investigação como caminho mais simpático para o Ministério Público, seguindo argumentos triviais como “procurando, vai achar” ou “certamente há algo de errado”. No entanto, “a Constituição e as graves responsabilidades da instituição e do seu cargo não autorizam o Procurador-Geral da República a ceder a tais bordões”.

Roberto Gurgel ainda lembra que a Procuradoria da República no Distrito Federal instaurou procedimento para apurar a prática de improbidade administrativa por parte do ministro-chefe da Casa Civil. Este procedimento continuará em andamento, já que neste caso não cabe foro no Supremo Tribunal Federal.

Veja a íntegra da manifestação.

http://noticias.pgr.mpf.gov.br/noticias/noticias-do-site/copy_of_geral/pgr-decide-arquivar-pedido-de-investigacao-com-palocci

Íntegra da decisão do Procurador Geral que inocentou Palocci.


PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA
Processos MPF/PGR 1.00.000.006832/2011-45, 1.00.000.006833/2011-90,
1.00.000.007013/2011-15 e 1.00.000.007016/2011-59
Representantes: Senador Álvaro Fernandes Dias
Senador Itamar Franco
Senador Demóstenes Torres
Senador Randolfo Rodrigues
Senador Jarbas de Andrade Vasconcelos
Deputado Federal Rubens Bueno
Representado: Ministro Antonio Palocci Filho
I


1. Em exame procedimentos administrativos instaurados
diante de representações formuladas pelo Deputado Federal Rubens
Bueno e pelos Senadores Álvaro Fernandes Dias, Itamar Augusto
Cautiero Franco, Demóstenes Lazaro Xavier Torres, Randolph
Frederich Rodrigues Alves e Jarbas de Andrade Vasconcelos,
noticiando supostos fatos ilícitos de autoria, em tese, do Ministro-
Chefe da Casa Civil, Antonio Palocci Filho.
2. Relatam os representantes, tendo por base notícias
publicadas pelo jornal Folha de São Paulo, edições dos dias 15 e 17
de maio último, os seguintes fatos, em síntese:
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2
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a) o representado, no período de 2006 a 2010, quando
exercia o mandato de Deputado Federal, percebeu
renda aproximada de R$ 974.000,00, tendo adquirido
no mesmo período, em nome de sua empresa Projeto
Administração de Imóveis, dois imóveis no valor total
de R$ 7.574.000,00 (sete milhões, quinhentos e
setenta e quatro mil reais);
b) a disparidade entre a estrutura empresarial da
Projeto e a receita auferida pela empresa seria
“incompatível com o que de cotidiano ocorre no
mercado de prestação de serviços de consultoria” - a
empresa Projeto teria o mesmo patamar de renda das
maiores empresas de consultoria do país sem que
tivesse estrutura empresarial para o exercício de
atividades que justificassem a receita obtida, sendo
que o aumento significativo de sua receita ocorreu
exatamente no período em que o representado esteve à
frente da campanha eleitoral da atual Presidente da
República, Dilma Roussef;
c) a disparidade entre o patrimônio e a renda obtidos
no período em que o representado exerceu o mandato
parlamentar e a sua recusa em declinar quem seriam
os seus clientes “permitem supor que tão vultosos
pagamentos feitos, a título de consultoria, relacionamse
intimamente à influência do ministro Palocci dentro
do governo federal”;
d) o COAF teria registro, como movimentação suspeita,
de operação financeira de compra, pela Projeto, de
imóvel de propriedade de uma empresa cujos sócios
estariam sob investigação policial;
e) a Projeto teria como clientes empresas que
efetuaram doações ao Partido dos Trabalhadores por
ocasião das eleições de 2010;
f) a relação entre as empresas Projeto, WTorre e
Engevix com o Partido dos Trabalhadores “aponta de
forma mais clara para o esquema de tráfico de
influência operado pelo Ministro da Casa Civil,
Antônio Palocci”: a WTorre, que teria contrato com a
Projeto, “fechou negócios com os fundos de pensão
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FUNCEF (Caixa Econômica Federal) e Previ (Banco do
Brasil) e coma Petrobras que somam 1,3 bilhão de
reais”, tendo, no mesmo período feito doações à
campanha eleitoral do representado, no valor de R$
119.000,00, e da Presidente Dilma Roussef, no valor
de R$ 2.000.000,00;
g) o representado teria utilizado a estrutura
governamental “para obter ganhos desproporcionais
em relação à atividade econômica que exerce,
acrescentando seu patrimônio sem que para isso haja
outra explicação que não o tráfico de influência”;
h) o representado apresentou emenda individual ao
Orçamento da União, de nº 3599004, de 17 de
novembro de 2008, destinando recursos à Fundação
Feira do Livro de Ribeirão Preto, que teria como vicepresidente
a esposa do seu irmão, Heliana da Silva
Palocci.
3. Concluem os representantes afirmando que os fatos
noticiados configurariam atos de improbidade administrativa
definidos na Lei nº 8.429/92 e crime de tráfico de influência
tipificado no art. 332 do Código Penal.
II


4. Registro, de início, que, não competindo ao Supremo
Tribunal Federal processar e julgar atos de improbidade
administrativa atribuídos a autoridades com prerrogativa de foro, não
detém o Procurador-Geral da República atribuição para a análise das
representações sob tal perspectiva, incumbindo-lhe o seu exame
exclusivamente no aspecto penal.
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5. Assinalo também, que tramita na Procuradoria da
República no Distrito Federal inquérito civil instaurado para apurar,
sob a ótica da improbidade administrativa, os mesmos fatos
noticiados pelos representantes.
III


6. O fato central atribuído ao representado consiste na
suposta incompatibilidade entre o seu patrimônio e a renda auferida
como parlamentar. Dizem os representantes que, durante o período
compreendido entre 2006 e 2010, o representado teve evolução
patrimonial “que não pode ser justificada pelos ganhos que auferiu
com o exercício de mandato parlamentar como Deputado Federal”.


7. A evolução patrimonial apontada como suspeita estaria
consubstanciada na aquisição de dois imóveis na cidade de São
Paulo, no valor total de R$ 7.482.000,00 (sete milhões, quatrocentos
e oitenta e dois mil reais), pela empresa Projeto Consultoria
Financeira e Econômica Ltda.1, da qual o representado era sócio
majoritário.


8. Partindo da consideração de que o representado2 não
teria renda para a aquisição dos imóveis, concluem os representantes
1 Extinta em dezembro de 2010.
2 Constatação feita com base exclusivamente na matéria veiculada pela Folha de São Paulo
no dia 15 de maio de 2011.
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que a receita auferida pela empresa Projeto e a consequente aquisição
dos imóveis, seriam fruto de atividade ilícita do representado, que
teria usado da função para promover interesses de clientes de sua
empresa perante a administração pública.


9. Para justificar a conclusão, dizem os representantes
que a Projeto Consultoria Financeira e Econômica Ltda., que seria
uma empresa de pequeno porte, obteve no ano de 2010 receita
equivalente à das grandes empresas de consultoria do país, o que por
si só constitui indício de que o representado valeu-se da função
pública para intermediar interesses de terceiros perante a
administração pública, conduta que configuraria o crime de tráfico de
influência.


10. Os fatos, entretanto, tais como descritos nas
representações, não configuram infração penal.


11. Com todas as vênias devidas, ao contrário do que
asseveram os representantes, a lei penal não tipifica como crime a
incompatibilidade entre o patrimônio e a renda declarada. Trata-se de
fato que, em tese, poderá configurar ato de improbidade
administrativa, definido no art. 9º, VII, da Lei nº 8.429/92 (adquirir,
para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função
pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução
patrimonial ou à renda do agente público).
PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA
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12. Em nosso ordenamento jurídico, a existência de
patrimônio incompatível com a renda somente adquire relevância
penal quando tenha origem ilícita, porque havido pela prática de
crime, contra a administração pública – peculato, corrupção,
concussão – ou de outra natureza – tráfico de drogas, crime contra o
sistema financeiro, estelionato –, revelando o acréscimo patrimonial a
ação de inserir no mercado formal recursos oriundos da conduta
delituosa – lavagem de dinheiro.


13. No presente caso, examinadas as representações, com
toda a atenção que a alta qualificação dos seus autores e a gravidade
do seu conteúdo impõem, e as matérias jornalísticas bem como as
informações e os esclarecimentos prestados pelo representado,
acompanhados de documentos, não é possível concluir pela presença
de indício idôneo de que a renda havida pelo representado como
parlamentar, ou por intermédio da Projeto, adveio da prática de
delitos nem que tenha usado do mandato de Deputado Federal para
beneficiar eventuais clientes de sua empresa perante a administração
pública.


14. As quatro representações não vieram instruídas com
qualquer documento. Nenhum elemento que revelasse, ainda, que
superficialmente, a verossimilhança dos fatos relatados.
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15. Os representantes transcreveram a íntegra de duas
matérias veiculadas pela Folha de São Paulo, que não contêm,
entretanto, a indicação de um fato específico, identificável no tempo e
no espaço, de onde se possa extrair elementos da eventual prática de
uma infração penal.


16. A mera afirmação, articulada de forma genérica e
desacompanhada de qualquer elemento indiciário, de que o
representado adquiriu bens em valor superior à renda que auferiu
como parlamentar, não enseja evidentemente a instauração de
inquérito. A uma, porque, como visto acima, o fato isoladamente
considerado não constitui crime – o que seria suficiente para impedir
a realização de atos investigatórios -, e, a duas, também porque não
permite a especificação de eventuais diligências que pudessem ser
requeridas ao órgão judicial.


17. A investigação de fatos que envolvem transações
imobiliárias e receitas ilícitas não prescinde da realização de
diligências que naturalmente constrangem a privacidade do
investigado e de terceiros com quem tenha mantido relações
financeiras, tais como quebras de sigilo bancário e fiscal.


18. É claro que a garantia constitucional da privacidade
não constitui direito absoluto. Nesse sentido, a jurisprudência
pacífica do Supremo Tribunal Federal:
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“(...)


2. O sigilo bancário, espécie de direito à privacidade
protegido pela Constituição de 1988, não é absoluto,,
pois deve ceder diante dos interesses público, social e
da Justiça. Assim, deve ceder também na forma e com
observância de procedimento legal e com respeito ao
princípio da razoabilidade.” (AI 655298, Rel.: Min.
EROS GRAU, DJ de 27.9.2007)
“(...)


VI. - O entendimento desta Suprema Corte consolidou-se
no sentido de não possuir caráter absoluto a garantia
dos sigilos bancário e fiscal, sendo facultado ao juiz
decidir acerca da conveniência da sua quebra em caso
de interesse público relevante e suspeita razoável de
infração penal. Precedentes.” (AI 541265, Rel.: Min.
CARLOS VELLOSO, DJ de 4.11.2005)


19. No entanto, o deferimento de diligências dessa
natureza somente legitima-se diante da existência de indícios
concretos da prática de crime que autorize a sua realização, de modo
a impedir que a quebra de sigilo seja usada como instrumento de
devassa indiscriminada na esfera de intimidade do cidadão:
“(...)


- A quebra de sigilo, para legitimar-se em face do
sistema jurídico-constitucional brasileiro, necessita
apoiar-se em decisão revestida de fundamentação
adequada, que encontre apoio concreto em suporte
fático idôneo, sob pena de invalidade do ato estatal que
a decreta. A ruptura da esfera de intimidade de
qualquer pessoa - quando ausente a hipótese
configuradora de causa provável - revela-se
incompatível com o modelo consagrado na Constituição
da República, pois a quebra de sigilo não pode ser
manipulada, de modo arbitrário, pelo Poder Público ou
por seus agentes. Não fosse assim, a quebra de sigilo
converter-se-ia, ilegitimamente, em instrumento de
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busca generalizada, que daria, ao Estado - não
obstante a ausência de quaisquer indícios concretos - o
poder de vasculhar registros sigilosos alheios, em
ordem a viabilizar, mediante a ilícita utilização do
procedimento de devassa indiscriminada (que nem
mesmo o Judiciário pode ordenar), o acesso a dado
supostamente impregnado de relevo jurídico-probatório,
em função dos elementos informativos que viessem a
ser eventualmente descobertos. (....)” (MS nº 23851/DF,
Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJ de 21.6.2002)


20. As representações ora em análise e as matérias
jornalísticas a que se referem não contêm, reitere-se, a descrição de
um único fato que constitua causa idônea e hábil a autorizar o
requerimento de quebra de sigilo do representado, de sua empresa e
de eventuais clientes.


21. Quando de sua indicação para o cargo de Ministro-
Chefe da Casa Civil da Presidência da República, o representado
informou à Comissão de Ética da Presidência da República a sua
situação patrimonial, com a relação detalhada de todos os seus bens,
as rendas que auferiu nos últimos doze meses e as atividades que
exerceu no mesmo período, mencionando inclusive a participação
societária na Projeto.


22. Especificamente quanto à empresa Projeto, os
documentos que instruem as manifestações do representado são
suficientes para um juízo seguro sobre a improcedência, tal como
articuladas, das acusações formuladas pelos representantes de
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práticas criminosas decorrentes da sua atuação como sócio
administrador da empresa. Não há sequer indício da prática do crime
de sonegação fiscal3.


23. A empresa foi constituída em julho de 2006 com a
denominação Projeto – Consultoria, Planejamento e Eventos Ltda.,
figurando o representado como o seu administrador. O objeto social
era a prestação dos seguintes serviços: a) consultoria empresarial e
planejamento estratégico de negócios; b) planejamento e elaboração
de orçamentos financeiros; c) planejamento, organização e realização
de eventos, palestras e seminários. Até dezembro de 2010, quando foi
extinta, foram feitas 5 (cinco) alterações contratuais.


24. A primeira, em novembro de 2006, para modificar a
denominação social da empresa, que passou a ser Projeto –
Consultoria Financeira e Econômica Ltda. e o objeto social:
consultoria empresarial e planejamento estratégico de negócios,
consultoria financeira e econômica e planejamento, organização e
realização de palestras e seminários. Nessa mesma alteração foi
admitido o sócio Lucas Martins Novaes e retirou-se Margareth Rose
Silva Palocci.


3 De qualquer modo, diante da certidão negativa emitida pela Receita Federal, é
irrelevante, neste momento, a indagação sobre a existência de sonegação fiscal pois,
a teor da Súmula Vinculante nº 24, do Supremo Tribunal Federal, “Não se tipifica
crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei no 8.137/90,
antes do lançamento definitivo do tributo”.
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25. A segunda, em outubro de 2007, alterou o endereço e o
objeto social da empresa, que passou a ser: a) consultoria
empresarial e planejamento estratégico de negócios; b) consultoria
financeira e econômica e, c) planejamento, organização e realização
de palestras e seminários.


26. A terceira, em outubro de 2009, alterou o endereço da
empresa e aumentou o capital social.


27. A quarta, em junho de 2010, aprovou as contas do
administrador, aumentou o capital social e registrou a renúncia do
sócio Antonio Palocci ao cargo de administrador da sociedade, que
passou a ser gerida pelo sócio Celso dos Santos Fonseca.


28. Por último, a quinta, em dezembro de 2010, extinguiu
a Projeto – Consultoria Financeira e Econômica Ltda. e criou a
Projeto - Administração de Imóveis Ltda.


29. A Constituição Federal, em seu art. 54, inciso II, “a”,
proíbe aos Deputados e Senadores, desde a posse, “ser proprietários,
controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de
contrato com pessoa jurídica de direito público, ou nela exercer função
remunerada”.
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30. Segundo o que consta dos documentos apresentados
pelo representado, especificamente as Declarações de Informações
Econômico Fiscais, a empresa Projeto, da qual o representado foi
sócio administrador desde a sua constituição, em julho de 2006, até
a 4ª alteração contratual, em junho de 2010, não celebrou contrato
com pessoa jurídica de direito público nem gozou de favores
decorrentes de contratos dessa natureza, o que afasta eventual
suspeita de que o representado agiu ilicitamente ao manter-se na
administração da Projeto durante o período em que exerceu o
mandato parlamentar.


31. Tem-se nos autos dos procedimentos administrativos
as informações fiscais relativas ao imposto de renda da Projeto desde
a sua constituição, em 2006, até a sua extinção, em dezembro de
2010, com a identificação das receitas obtidas em cada ano, os
valores pagos por cada cliente e a comprovação dos impostos pagos.


32. Como afirmado pelo representado, inclusive aos
diversos meios de comunicação, no mês de dezembro de 2010, a
Projeto – Consultoria Financeira e Econômica Ltda. encerrou as suas
atividades e extinguiu os contratos em curso, recebendo naquele
mês, por força da extinção dos contratos, receita anômala, em valor
significativamente superior à receita obtida nos meses anteriores, do
que decorreu o pagamento, a título de imposto de renda e demais
impostos e contribuições devidos, de valor bem superior ao que havia
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sido pago pela empresa nos meses anteriores. Registro que os valores
declarados aproximam-se dos que foram afirmados pelos
representantes como sendo a renda auferida pela empresa Projeto no
ano de 2010.


33. Instruem também as manifestações do representado
declarações do COAF e da Polícia Federal, o primeiro atestando que
não enviou à Polícia Federal registro de operação financeira suspeita
relacionada ao representado ou à Projeto, e a segunda esclarecendo
que não solicitou ao COAF informação sobre a empresa Projeto ou
sobre o Ministro Antonio Palocci e que não tem inquérito ou
investigação criminal instaurada sobre a empresa Projeto ou sobre o
Ministro Antonio Palocci.


34. Não há igualmente indício idôneo da prática do crime
de tráfico de influência, que, segundo os representantes, decorreria
necessariamente do fato de clientes da empresa Projeto terem
celebrado contratos com entidades que integram a administração
indireta e fundos de pensão.


35. A circunstância isolada, dissociada de outros
elementos indicativos de eventual ação ilícita do representado, de
clientes da empresa Projeto terem celebrado contratos com a
Petrobras ou com fundos de pensão – como afirmado pelos
representantes – , não constitui indício suficiente de que esses
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contratos foram celebrados com a intervenção do representado.


36. Ressalte-se que, salvo em relação à empresa WTorre,
não há nas representações a indicação de um único contrato
celebrado pelos clientes da Projeto com órgãos da administração
direta e indireta, de que se pudesse inferir uma eventual intervenção
ilícita do representado.


37. Quanto à empresa WTorre, os representantes apontam
como fato específico, que revelaria a existência do crime de tráfico de
influência, a suposta relação entre as empresas Projeto, WTorre,
Engevix e o Partido dos Trabalhadores.


38. Pelo que se extrai do relato, a WTorre seria cliente da
Projeto e, nos anos de 2009 e 2010, realizou negócios envolvendo
vultosos valores com a FUNCEF, a Previ e a Petrobras, consistente na
aquisição de imóveis – Complexo WTorre Nações Unidas e Centro
Empresarial Senado – e na construção de um dique seco no estaleiro
Rio Grande no litoral do Rio Grande do Sul. Há referência também ao
repasse da WTorre à Engevix de centenas de milhões de reais em
ações do estaleiro Rio Grande.


39. Em decorrência desses negócios, que, de acordo com
os representantes, teriam sido intermediados pelo representado e que
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seria "o elo final dessa engenhosa cadeia de transferência financeira",
a WTorre teria feito doações da ordem de 3,4 milhões de reais ao
Partido dos Trabalhadores.


40. O relato, entretanto, além de não demonstrar em que
medida os negócios da WTorre com os fundos de pensão e a
Petrobras teriam relação com o repasse de ações da WTorre à
Engevix e qual a relação dessas transações comerciais e societárias
com as doações eleitorais da WTorre ao Partido dos Trabalhadores,
não traz um único fato idôneo no sentido de que os contratos e
negócios da WTorre foram intermediados pelo representado, nem que
as doações eleitorais representaram uma espécie de pagamento ou de
compensação por eventual patrocínio do representado aos interesses
da WTorre. Nada, absolutamente nada, há nesse sentido.


41. Aliás, como pode ser facilmente verificado no sítio do
Tribunal Superior Eleitoral, as doações eleitorais da WTorre foram
declaradas à Justiça Eleitoral e beneficiaram não somente o Partido
dos Trabalhadores mas também o PT do B, o PMDB e o PSDB.


42. Em suma, as conjecturas feitas pelos representantes,
embora importantes, não encontram apoio em um único fato.
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43. Além da ausência de indício idôneo da existência da
afirmada ação do representado perante os órgãos públicos para
beneficiar os clientes da Projeto, tem-se que os fatos, do modo como
descritos nas representações, não se enquadram, sequer em tese, no
crime de tráfico de influência.


44. Analisando o tipo em causa, afirma Rui Stoco o
seguinte:
“Pune a lei a obtenção da vantagem em troca de ilusória
intervenção do delinquente junto a funcionário, para
conseguir o objetivo de quem a dá. Atua o sujeito ativo
como corretor da pseudo corrupção. De um lado, ele
frauda o adquirente, de outro desprestigia a
Administração o inculcado “vendedor” do ato ou
providência. Há destarte comportamento fraudulento.
Em regra, existirá, como no estelionato, uso de ardis ou
artifícios, mas sendo suficiente a simples mentira, a
afirmação do sujeito ativo.
(...)


O elemento material do crime, na modalidade do caput
do art. 332, consiste em fazer supor ou persuadir, ou
não desmentir a suposição de que goza, junto ao
funcionário, de prestígio (decorrente de amizade,
parentesco, camaradagem política etc) capaz de
influenciá-la no sentido dos desejos do interessado, ou,
na modalidade do parágrafo único, em fazer crer na
venalidade do funcionário e, em consequência, seja
num, seja noutro caso, obter a vantagem ou promessa
de vantagem.”4


45. No mesmo sentido, Júlio Fabrini Mirabete: "As
condutas típicas são: solicitar, ou seja, pedir, procurar, buscar; exigir,
4 Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial, Revista dos Tribunais, Volume 2, Parte
Especial, 7ª edição, pág. 4016/4017).
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que significa mandar, reclamar, impor; cobrar, que é pedir pagamento;
e obter, receber, conseguir, adquirir vantagem ou promessa de
vantagem, sob o pretexto de influência junto a funcionário público. Há a
fraude contra o comprador de influência, que pode ocorrer mediante
uso de artifício, ardil ou qualquer outro meio influente, inclusive a
simples mentira. É preciso, para a configuração do crime, que o agente
alardeie prestígio, atribuindo-se influência sobre o funcionário público.
É a venditio fumi dos romanos, ou seja, a "venda da fumaça" que ilude
o "comprador"."5.
46. O tipo compõe-se, portanto, dos seguintes elementos:
a) a ação de solicitar, exigir, cobrar e obter vantagem indevida; b) a
promessa de influir sobre funcionário público; c) a fraude contra a
pessoa que promete ou paga a vantagem indevida.


47. Esses elementos não se fazem presentes no caso. Não
há indicação de que o representado teria solicitado, exigido, cobrado
ou obtido vantagem indevida valendo-se de algum artifício, ardil ou
mentira para fazer crer, aos clientes da sua empresa, que teria
influência com servidores públicos para obter os negócios ou
contratos que pretendiam. A mera afirmação genérica de que a
Projeto não teria estrutura empresarial para a receita que auferiu no
ano de 2010 não é suficiente para justificar a conclusão de que a
receita foi havida por meio de atos ilícitos do representado,
5 Código Penal Interpretado, Jurídica Atlas, 7ª edição, pág. 1905.
PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA
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consistentes em “solicitar, exigir, cobrar ou obter” vantagens para os
clientes da empresa.


48. Por último, a questão da emenda parlamentar nº
3599004, de 17 de novembro de 2008, de autoria do representado,
que dirigiu recursos da União à Fundação Feira do Livro de Ribeirão
Preto.


49. Os representantes invocam a vedação contida no art.
36, § 3º, da Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei nº 11.768/2008) –
que proíbe a destinação de recursos a entidade privada que tenha
como dirigente parente em linha reta, por afinidade, até o segundo
grau, do agente político de Poder – para afirmar que o fato tipifica o
crime de prevaricação.


50. O delito de prevaricação tem como elemento
constitutivo a ação do agente de “retardar ou deixar de praticar,
indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa
de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”.


51. A questão que se põe é saber se a circunstância de a
cunhada do representado, parente por afinidade, ser vice-presidente
da Fundação Feira do Livro de Ribeirão Preto configuraria o especial
fim de agir que integra o tipo da prevaricação.
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52. Entendo que não. O fato de a cunhada do representado
ser dirigente da Fundação, quando muito, poderia ensejar
investigação, em sede própria, por ato de improbidade. O dolo
específico somente estaria configurado se presente alguma situação
que revelasse que a destinação dos recursos à Fundação Feira do
Livro foi movida pelo interesse do representado de beneficiar-se ou de
beneficiar a um terceiro, que, no caso, não pode ser a própria
Fundação.


53. Já decidiu o Supremo Tribunal Federal que, "para a
configuração do crime de prevaricação é necessário que fique
demonstrado que o agente agiu por interesse ou sentimento pessoal". A
prática do ato em descumprimento à lei, por si só, não tipifica a
prevaricação.


54. Ademais, não há indicação – e sequer foi ventilado
pelos representantes – , de que os recursos destinados à Fundação
Feira do Livro de Ribeirão Preto foram aplicados em finalidade diversa
da prevista ou que houve desvio dos recursos, o que afasta a
ocorrência de outros crimes contra a administração pública.
IV


55. Portanto, com a mesma firmeza com que sustentei
oralmente, no plenário do Supremo Tribunal Federal, a acusação
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contra o representado na PET 3.898, entendo que os elementos
trazidos pelas representações dos eminentes parlamentares e mesmo
pelas matérias jornalísticas são absolutamente insuficientes para um
juízo de reprovação no campo penal, ainda que em momento de
prelibação.


56. A enorme repercussão do caso, que tem estado nas
primeiras páginas dos grandes jornais há semanas, em razão da
notória importância do representado no cenário político nacional,
talvez recomendasse, como caminho mais simpático para o Ministério
Público que, a despeito da insuficiência absoluta de indícios,
promovesse a continuidade da investigação, porque “procurando, vai
achar”, porque “certamente há algo de errado” e outras trivialidades.


57. A Constituição e as graves responsabilidades da
instituição e do seu cargo não autorizam, porém, o Procurador-Geral
da República a ceder a tais bordões. Como destaquei em meu
discurso de posse, reiterando compromisso assumido perante o
Senado, o Ministério Público, a despeito de não se afastar do exato
cumprimento do dever de apurar desmandos e desvios na conduta
dos agentes públicos, não se prestará a servir de instrumento do
enfraquecimento institucional de qualquer dos poderes, por todos os
motivos indesejável para a democracia e, por isso mesmo, contrário
aos mais altos interesses da sociedade brasileira.
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58. A instauração de inquérito tem por pressuposto a
existência de indícios da ocorrência de um crime. Cuida-se de
exigência decorrente do próprio conceito de investigação criminal e da
finalidade a que se propõe o inquérito.


59. Bruno Calabrich, em estudo sobre o tema, definiu
investigação criminal como a “sequência de atos preliminares direta ou
indiretamente voltados à produção e à colheita de elementos de
convicção e de outras informações relevantes acerca da materialidade e
autoria de um fato criminoso”6.


60. Em tese, a atividade persecutória do Estado somente
justifica-se diante da notícia de um fato penalmente relevante. A
investigação tem por objetivo exatamente o conhecimento desse fato
para efeito de comprovar a sua materialidade e colher indícios de
autoria.
61. Não existindo indícios de que o fato noticiado configure
infração penal, é dever Ministério Público recusar a instauração do
procedimento investigatório ou arquivar o procedimento já
instaurado, fazendo-o fundamentadamente.


6 Investigação Criminal pelo Ministério Público, fundamentos e limites constitucionais, São
Paulo, Revista dos Tribunais, 2007, p. 54.
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62. Na lição de Júlio Fabbrini Mirabete, “o inquérito não
deve ser instaurado, entretanto, na hipótese já mencionada do fato
atípico, (...) e quando não forem fornecidos os elementos indispensáveis
para se proceder às investigações”7.


63. É também o que afirma Romeu Pires de Campos
Barros: “Sem o conhecimento de indícios de um fato criminoso não se
inicia o processo. Indispensável é pelo menos ter a “suspeita” da
existência do fato, este representa o pressuposto material do início
duma investigação, ou seja, o mínimo exigido à materialidade do objeto
eventual do processo”8.


64. Justifica-se, nesses casos, a recusa na instauração do
procedimento investigatório ou o arquivamento do que foi instaurado
na convicção de que o inquérito, sem que exista crime, em tese, a ser
apurado, constitui violação ao estado de dignidade do investigado,
causando-lhe graves lesões em seu patrimônio moral.


65. Não é por outra razão que a Lei nº 11.719/2008, ao
alterar a redação do art. 395 do Código de Processo Penal, fez incluir
a falta de justa causa para o exercício da ação penal entre as causas
de rejeição liminar da denúncia ou da queixa, erigindo-a ao patamar
de uma quarta condição ao exercício do direito de ação, ao lado da
7 Processo Penal, Editora Jurídico Atlas, 2000, 1ª edição, pág. 84.
8 Sistema do Processo Penal Brasileiro, Editora Forense, Vol. I, pág. 248/249.
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legitimidade, do interesse de agir e da possibilidade jurídica do
pedido.


66. Afirma Eugênio Pacelli que “o Código de Processo Penal
permite à autoridade policial a recusa de instauração de inquérito
quando o requerimento do ofendido ou seu representante não
apresentar conjunto indiciário mínimo à abertura das investigações, ou
quando o fato não ostentar contorno de criminalidade, isto é, faltar a
ele quaisquer dos elementos constitutivos do crime”9. Por óbvio, esse
entendimento também aplica-se ao Ministério Público naqueles casos
em que, tratando-se de autoridade com prerrogativa de foro, a
investigação é instaurada por sua iniciativa exclusiva.


67. Por isto, continua Pacelli, “não se pode perder de vista
que o primeiro cuidado do órgão a que se destina a notitia criminis é
verificar se o fato atribuído a alguém está descrito como crime em
alguma norma do direito legislado, ou seja, se existe um modelo legal
para tal conduta. Assim, a tipicidade da conduta é a primeira
preocupação para movimentação de qualquer dos órgãos persecutórios.
(...) se o fato narrado como notitia criminis não é típico, não existe
aquela relevância que justifique a atuação do órgão persecutório.”10.
9 Curso de Processo Penal, Lumen Juris Editora, 2010, 13ª edição, pág. 62.
10 Romeu Pires de Campos Barros, ob. cit. pág. 253.
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68. Referindo-se à doutrina de Jiménez de Asúa sobre o
valor jurídico da tipicidade penal, ensina Frederico Marques que “a
ausência de fato típico torna inadmissível a persecução penal contra o
autor de uma conduta que possa ser tida como ilícita ou antijurídica.
Notitia criminis é notícia da ocorrência de acontecimento enquadrável
numa das figuras típicas com que a lei define e estrutura as infrações
penais. (...) Vê-se, pois, que o problema da adequação típica é de
grande relevância no processo penal. O enquadramento de um fato ou
acontecimento na descrição legal de norma incriminadora está presente
em todos os momentos da persecutio criminis, justificando e graduando
a potestas coercendi e a potestas cognoscendi dos diversos órgãos do
procedimento penal.”11.


69. E adverte o renomado processualista: “A suspeita de
crime, ou opinio delicti, base e fundamento da acusação, consiste
sobretudo na possibilidade de existência de crime decorrente da prática
presumível de fato típico.12”


70. O Supremo Tribunal Federal, muito embora restrinja
as hipóteses de admissibilidade do habeas corpus impetrado com o
objetivo de trancar o inquérito policial ou a ação penal, tem afirmado,
sem divergência de relevo, a impossibilidade de instauração do
inquérito ou o ajuizamento de ação penal em “situações que se
11 Elementos de Direito Penal, Editora Bookseller, Vol. I, 1997, pág. 130.
12 José Frederico Marques, ob. cit., pág. 130.
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reportem a conduta não-constitutiva de crime em tese, ou quando já
estiver extinta a punibilidade, ou ainda, se inocorrentes indícios
mínimos da autoria”13.


71. E assim tem feito partindo da premissa de que o fato
criminoso é o fundamento de toda e qualquer investigação criminal,
não admitindo a ordem jurídica investigações que tenham por objeto
fatos que não encontrem correspondência em algum tipo penal.


72. A Constituição Federal, ao erigir a dignidade da pessoa
humana como fundamento do Estado brasileiro, vedou a adoção pelo
Estado de qualquer medida que direta ou indiretamente viole o status
dignitatis do indivíduo. Inclui-se nessa vedação a instauração de
inquéritos ou o ajuizamento de ações penais sem que se tenha a
necessária justa causa.


73. Nas palavras sempre precisas do Ministro Celso de
Mello, “a imputação penal – que não pode constituir mera expressão da
vontade pessoal e arbitrária do órgão acusador – deve apoiar-se em
base empírica idônea, que justifique a instauração da “persecutio
criminis”14.
13 HC nº 87310/SP, Rel. Min. Carlos Britto, DJ de 17.11.2006.
14 Inq. 1978/PR, Pleno, DJ de 17.8.2007.
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74. Por isto, “a mera instauração de inquérito, quando
evidente a atipicidade da conduta, constitui meio hábil a impor violação
aos direitos fundamentais, em especial ao princípio da dignidade
humana”15.


75. O conceito de justa causa encerra noção que engloba,
além da existência de suporte probatório mínimo apto a justificar a
demanda penal, a tipicidade do fato, que deve corresponder a um tipo
legalmente definido.


76. Em suma, a despeito da possibilidade de investigar-se
condutas ilícitas a partir de representações, é imprescindível que a
notícia aponte a existência de elementos, ainda que mínimos, da
prática de algum crime.


77. Na ausência desses elementos e na impossibilidade de
extrair-se da representação dados capazes de ensejar a realização de
atos investigatórios para a apuração do fato, a instauração de
inquérito representa inegável afronta aos princípios que norteiam a
atividade persecutória do Estado, por absoluta ausência de justa
causa.


78. Ressalto, mais uma vez, que o Ministério Público
Federal, tendo presentes os mesmos fatos que motivaram as
15 HC nº 82969/PR, Segunda Turma, DJ de 17.10.2003.
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representações ora analisadas, instaurou inquérito civil para apurar
eventuais atos de improbidade de autoria do representado.
V


79. Ante o exposto, determino o arquivamento dos
procedimentos administrativos em causa, ressalvado o que dispõe o
art. 18 do Código de Processo Penal.
Brasília, 6 de junho de 2011
ROBERTO MONTEIRO GURGEL SANTOS
PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

Dilma demonstrou lealdade a Palocci. A contrapartida é discutível.

Por José Roberto Toledo.

O ministro Antonio Palocci se transformou em um cadáver político ambulante. Perdeu aliados à esquerda e à direita. Virou a antítese de Midas, a pessoa menos indicada para coordenar qualquer coisa além de sua defesa. O governo já saiu de Palocci; falta Palocci sair do governo.


Pode-se argumentar que Palocci foi alvo de injustiça pois não há provas contra ele, apenas indícios. Mas o ministro fez a própria cama ao mostrar ser mais leal e preocupado com seus ex-clientes empresariais do que com a atual chefe. Entre o público e o privado, não restam dúvidas quanto à sua preferência.

Virou lugar-comum comparar a atitude de Palocci com a de seu antecessor Henrique Hargreaves, que, sob suspeita em 1993, afastou-se da Casa Civil para não contaminar o governo do seu amigo Itamar Franco. Ele acabou voltando ao cargo meses depois. As diferenças são grandes, porém.

Hargreaves não só voltou ao ministério. Continuou sendo o braço-direito do ex-presidente quando este foi eleito governador de Minas Gerais em 1998. Foi seu principal secretário. Hoje, representa o governo mineiro em Brasília. Hargreaves nunca saiu do governo e o governo nunca saiu dele.

Caso Palocci deixe o governo Dilma, o comportamento do ministro durante a crise indica que ele voltará a ser consultor de empresas. Com o sucesso financeiro que Palocci obteve nos últimos anos, quem poderá recriminá-lo se fizer essa opção?

Um inconveniente é que as idas e vindas entre o setor público e o privado provocam incompatibilidades e conflitos de interesse. Palocci foi ingênuo (atendendo seu apelo por boa fé) ao dizer que setores atendidos por ele, como o financeiro e de mercado de capitais, não têm interesses diretos no governo, que seus negócios são estritamente privados.

Impostos, taxas, licenças, licitações, normas, regulamentações, leis, julgamentos, contas, publicidade oficial são apenas algumas das muitas interfaces entre empresas de quaisquer setores econômicos e o governo. Sempre há relações entre o público e o privado, e quem tem o pé em ambas as canoas é valorizado por facilitar o tráfego de um lado a outro.

Outra inconveniência é a contaminação. Sobram indícios de que a crise pessoal de Palocci está prejudicando o governo. O melhor indicador são as incontáveis declarações de apoio de próceres do PMDB à permanência do ministro no cargo.

Pode parecer incongruente que a pessoa com quem Palocci discutiu asperamente ao telefone, o vice-presidente Michel Temer (PMDB), seja quem mais repete que o ministro deve ficar no governo. Não é: quanto mais tempo Palocci permanecer, mais Dilma terá que ceder aos peemedebistas. O tal diamante vale muito mais do que R$ 20 milhões, e é pago a prestações.

Se Palocci não é capaz de reconhecer isso, quão hábil ele ainda pode ser como articulador político? É insubstituível para Dilma? A se tomar como exemplo a votação do Código Florestal, não. Numa democracia, os ocupantes de cargos públicos não devem importar mais do que suas funções.

Ceder anéis brilhantes aos aliados não foi a única consequência dos problemas causados pelo principal auxiliar da presidente. Mesmo que o governo não fique paralisado, a crise de Palocci ofusca qualquer outra iniciativa governamental. Mesmo que não haja uma crise de fato, a aparência é de que há.

Mal comparando com uma tragédia real, enquanto não forem descobertos e punidos os assassinos de líderes extrativistas na Amazônia, os fantasmas dessas mortes assombrarão governo e sociedade com a lembrança indelével de que vastas áreas do Brasil estão além do alcance da lei. Casos assim precisam de investigação profunda, até uma conclusão inconteste.

Dilma demonstrou lealdade a Palocci. A contrapartida é discutível. Se demiti-lo por pressão externa parece sinal de fraqueza, mantê-lo insepulto é ainda mais desgastante. O velório interminável atrapalha o governo e enfraquece a imagem da presidente. Falta a pá de cal.

Imprensa de Minas oculta denúncia sobre ocultação de patrimônio de Aécio.




MATÉRIA SOBRE AÉCIO PROVOCA NOVA CENSURA NA ALMG



O jornal Folha de São Paulo, caderno “Poder”, desta quarta-feira (01/06/2011), trouxe matéria informando representação levada à Procuradoria Geral da República (PGR), solicitando investigações sobre fortes indícios de ocultação de patrimônio, crime fiscal e improbidade administrativa envolvendo o senador Aécio Neves.

Estranhamente, pela segunda vez, a assessoria de imprensa da Assembleia Legislativa de Minas Gerais “omite”, no clipping diário distribuído nesta Casa, matéria que traz menções negativas ao ex-governador Aécio Neves. O bloco Minas Sem Censura solicitou, mais uma vez, a apuração dessa falta grave.

A matéria, que teve repercussão no blog do Noblat e nas redes sociais, destaca a representação feita pelo bloco MSC na PGR, em face de que sua condição de senador lhe garante foro privilegiado.

O bloco Minas Sem Censura aproveita para esclarecer que seus líderes estiveram também com coordenadores da bancada de apoio à presidenta Dilma, na Câmara dos Deputados, discutindo a gravidade dos fatos relativos ao ex-governador de Minas. Com o detalhamento feito às lideranças federais presentes, que por sua vez reagiram com perplexidade frente aos dados informados, ficou acertado que a bancada federal da “maioria” acompanhará as apurações das denúncias feitas.

Única retificação que se faz necessária à matéria do jornal Folha de São Paulo é que aquilo que motiva a representação apresentada na PGR são as fortes suspeitas de uso de dinheiro público em rádio de propriedade do senador, suas vinculações com o presidente da CODEMIG, co-proprietário do jatinho usado para deslocamentos do atual senador, e as repercussões em termos de provável crime fiscal, ocultação de patrimônio, dentre outras irregularidades.

No mais, é sempre importante registrar que as cobranças do MSC sobre os fatos que se iniciaram com a ocorrência policial no Leblon/RJ, precedem a polêmica envolvendo o ministro Palocci.

A apuração de denúncias, doa em quem doer, não pode ser objeto de trocas ou negociações.



Veja cópia da matéria publicada na Folha:



Anexo: FSPhoje.doc

Como o “lobby” israelense congela o debate sobre o Oriente Médio







MJ Rosemberg





4/6/2011
 Al-Jazeera, QatarHow Israel’s lobby chills Middle East debate

Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu



Essa semana, depois da escandalosa recepção ao primeiro-ministro Netanyahu no Congresso dos EUA, quero partilhar uma lembrança pessoal de como o status quo no Oriente Médio é preservado no Capitólio.



Era 1988, e eu trabalhava como assessor para política exterior do senador Carl Levin (Democrata, Michigan). Um dia, em fevereiro, Levin chamou-me a sua sala. Estava muito preocupado com uma declaração que lera no New York Times aquele dia. Um artigo citava o primeiro-ministro de Israel, Yitzhak Shamir, que dissera que rejeitava a ideia de retirar-se de qualquer parte da terra que Israel ocupara na guerra de 1967: “O ministro Shamir disse em entrevista a uma rádio, que ‘é claro que, para mim, nenhuma troca de território por paz será jamais aceitável’” (matéria de arquivo, só acessível para assinantes do jornal).



Levin entendeu perfeitamente o que Shamir estava fazendo: estava repudiando duas Resoluções do Conselho de Segurança da ONU, n. 242 e 338 (de cuja redação Israel participou) e que ordenavam “a retirada das forças armadas de Israel dos territórios ocupados no recente [1967] conflito” em troca de paz e segurança. Aquelas resoluções manifestavam então, como manifestam até hoje, a política oficial dos EUA e da ONU. Mas, em 1988, Shamir as declarara nulas e sem efeito.



Levin pediu-me que redigisse uma carta dirigida ao secretário de Estado George Shultz, declarando que o Senado dos EUA entendia que as resoluções da ONU permaneciam plenamente válidas e manifestavam a política dos EUA, Shamir gostasse ou não. A carta foi escrita, não exatamente nesses termos, é claro: uma carta muito polida. E Levin queria que a carta fosse endereçada a Shultz, não ao próprio Shamir, para evitar arrepiar demais os falcões de Israel.



Escrevi um primeiro rascunho. Levin editou e reeditou. Em seguida, convocou o presidente do AIPAC, Thomas A. Dine, para que examinasse os termos da carta. Tom aprovou: na avaliação dele, a carta estava “ótima”. Levin disse a Dine que manteria em sigilo o fato de que a carta fora aprovada por ele, para evitar-lhe qualquer embaraço.



Levin então pediu-me que entregasse a carta ao secretário de Estado, mas pediu algum tempo porque, antes, queria tentar reunir algumas outras assinaturas de senadores. Em uma hora, a carta estava assinada por 30 senadores. Não fosse sexta-feira, Levin teria facilmente reunido mais uma centena de assinaturas, mas era tarde, e a Casa já estava praticamente vazia.



Entreguei a carta. Levin não queria excessivo alarde sobre a carta e, por isso, o gabinete do senador não informou a imprensa. Na prática, era iniciativa secreta.



Mas um dos senadores passara cópia da carta ao New York Times. E em minutos os telefones começaram a tocar. Repórteres e financiadores do AIPAC (que não sabiam que Dine conhecia e aprovara o texto) estavam furiosos.



Levin foi procurado para entrevistas pelos três principais programas de notícias das manhãs de domingo. Não aceitou. De fato, como previsto há muito tempo, embarcou no sábado para Moscou.



No domingo, a primeira página do New York Times estampava manchete e longa matéria sobre a “Carta dos 30”, de Levin:



“Trinta senadores dos EUA, inclusive muitos dos principais apoiadores de Israel, enviaram carta em que criticam o primeiro-ministro Yitzhak Shamir e seu Partido Likud, sugerindo que estariam obstruindo esforços para um acordo de paz no Oriente Médio.



A extraordinária crítica pública a Israel veio em carta dirigida ao secretário de Estado George P Shultz, que retornou hoje de viagem de vários dias ao Oriente Médio. O secretário Shultz propôs, nessa viagem, as linhas gerais de um acordo provisório entre Israel e os palestinos (...).



Os senadores que assinaram a carta declaram-se preocupados ante a continuada resistência, por Israel, à ideia de ceder terras ocupadas em troca de paz, pedra angular dos esforços do secretário Shultz. Embora a carta também critique outros estados árabes, exceto o Egito, auxiliares do senador informaram que a intenção foi, principalmente, mandar recado claro ao primeiro-ministro Shamir e ao bloco do Likud.”



Era tão significativo o fato de que, antes, nenhum senador dos EUA jamais criticara qualquer política de Israel (nem indiretamente), que, no domingo, o Sunday Times insistiu no assunto e publicou a carta na íntegra.



Na segunda-feira, o mundo veio abaixo. Como Levin estava na Rússia, seus assessores tiveram de responder aos telefonemas dos jornais e às ameaças de doadores de campanha, eleitores e organizações ‘pró-Israel’, todos furiosos. E, às tantas, aconteceu algo absolutamente inimaginável.



Um alto funcionário da embaixada de Israel veio ao gabinete, para apresentar pessoalmente mensagem de protesto do primeiro-ministro Shamir. O chefe de gabinete do senador Levin, Gordon C Kerr, disse-lhe que não fazia sentido algum um funcionário de embaixada apresentar qualquer protesto contra carta de senadores norte-americanos dirigida ao próprio governo dos EUA. Disse-o, é claro, em termos absolutamente polidos. O funcionário da embaixada de Israel insultou Levin e fez-lhe graves ameaças. Kerr expulsou-o do gabinete.



Simultaneamente, Levin recebeu mensagem do presidente Ronald Reagan em que o presidente agradecia a contribuição de organizar apoio à posição do seu governo; e Shamir pôs-se a telefonar para os senadores, dizendo-se “atônito” por suas políticas estarem sendo alvo de críticas.



Aconteceu então o momento que, para mim, foi a experiência mais chocante de todos os anos em que trabalhei para o governo dos EUA. William Safire, o colunista mais influente do New York Times, telefonou-me, em fúria. Disse que sabia, de fonte segura, que nem Levin nem eu escrevêramos aquela carta. Disse que sabia que a carta fora escrita por um assessor do líder do Partido Labour de Israel, Shimon Peres.



Disse que aquele assessor, alguém chamado Yossi Beilin, entregara-me um rascunho manuscrito da carta e que eu convencera Levin a assinar e reunir apoios. Disse-me que eu trabalhava para derrubar o governo de Shamir e substituí-lo por governo de Peres. Por pouco não deixei escapar uma gargalhada.



A simples ideia de que um assessor de senador tivesse tanto poder já era, só ela, um absurdo. Mas Safire fez ameaças. Perguntou se eu achava correto que um assessor de um senador dos EUA estivesse a serviço de partido político estrangeiro, e se eu sabia o que aconteceria quando Levin descobrisse sobre mim, na coluna de Safire no New York Times. Assustador. Como assessor de senador, eu jurara fidelidade aos EUA e à Constituição. Tinha passe livre, dado pela segurança. As consequências seriam arrasadoras.



Eu disse a Safire que eu rascunhara a carta e que Levin reescrevera, ele mesmo, longos trechos. Disse que jamais ouvira falar de Beilin (pura verdade). Safire, então, enlouqueceu. Disse que sabia que eu estava mentindo, porque recebera a história “real” de fontes seguras: de Benyamin Netanyahu, então embaixador de Israel na ONU, e de Steve Rosen, número dois do comando do AIPAC (que, mais tarde, foi acusado de espionagem).



Respondi que não me interessava quem lhe tivesse contado. Que era mentira. E que Levin tomara a iniciativa de escrever ao secretário de Estado para ajudar Israel, porque entendia que, se Israel se opusesse à retirada dos territórios palestinos ocupados, o conflito jamais teria fim.



A conclusão da conversa foi que Safire recuou, não antes de me ameaçar mais uma vez: se ele descobrisse que eu mentira, eu estaria “acabado”. Disse que não escreveria a coluna, porque – acredite quem quiser – acreditava mais em mim que em suas fontes.



E foi isso. Ninguém mais falou sobre a “Carta dos 30”, exceto para lembrar que, depois dos ataques viciosos contra Levin, poucos senadores dos EUA voltaram a desafiar o governo de Israel e o AIPAC.



E qual é a moral da história?



É a seguinte: criticar Israel é muito perigoso. Não fosse o medo, o que levaria um poderoso colunista do New York Times a telefonar a um assessor de senador e ameaçá-lo nos termos em que Safire ameaçou-me, de destruir minha carreira? Só o medo. E o que faria um colunista do New York Times agir como empregado do governo de Israel? Naquele dia, Safire não foi nem jornalista: trabalhava como agente do governo de Israel.



Quem, sabendo disso, surpreender-se-ia com o circo em que se converteu o senado dos EUA, aos pulos nas cadeiras, levanta e senta, levanta e senta, gritando de amores por Netanyahu? Quem se atreveria a vaiar um gorila de uma tonelada? Com certeza, não os eleitos para o Congresso dos EUA.



A parte boa de toda essa história, é que Levin apoiou-me 100%.



A carta criou-lhe muitos problemas com doadores de campanha, mas ele sempre a defendeu – e de lá até hoje já foi reeleito quatro vezes. De fato, disse-me, há muito tempo, que se orgulha muito de ter redigido aquela carta. Ele redigiu. Não eu.



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