segunda-feira, 20 de junho de 2011

Petróleo saudita: músculos para a Palestina



20/6/2011, Lawrence Davidson, Consortium.News
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Lawrence Davidson é professor de História na West Chester University na Pennsylvania. É autor de Foreign Policy Inc.: Privatizing America’s National Interest;America’s Palestine: Popular and Offical Perceptions from Balfour to Israeli Statehood; e Islamic Fundamentalism.
Ver também:
-- 10/6/2011, “EUA pró-Israel: favoritismo fracassado”,Turki al-Faisal, Washington Post, EUA 
18/6/2011, 18/6/2011, Uri Avnery, Gush Shalom [Bloco da Paz], Israel Negar! Não aceitar! Dizer NÃO!
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Os sauditas não estão gostando do que têm ouvido do presidente Barack Obama, sobretudo ‘instruções’ que, aos olhos de Riad, parecem extremamente perigosas, como dizer aos sauditas e ao resto dos governantes árabes, que se antecipem aos movimentos de protesto popular e promovam reformas democráticas.

Os sauditas não têm qualquer tradição democrática além do conselho consultivo das tribos. Antes de serem reis e príncipes, são xeiques do deserto. Por isso, os conselhos de Obama soam como fala de aliado de muito tempo que, de repente, os aconselhe a render-se. Na tradição beduína, líderes fortes não se rendem sem luta.

Os sauditas já manifestaram por várias vias, sua decepção com Washington. Uma dessas vias foi enviar tropas para ajudar a monarquia do Bahrain (mais um xeique que se autodenomina rei) e apoiar a reação fascista que o regime impunha com violência contra a maioria xiita.

Os sauditas são sunitas wahhabitas, o ramo mais conservador do islamismo, e pouco se importam com o destino dos xiitas, que consideram heréticos. Os sauditas suspeitam que os xiitas do Bahrain estejam sendo orquestrados pelo Irã (que os sauditas muito temem, como potência xiita emergente na região).

Riad vê o terror no Bahrain como necessário e útil – por mais que muitos, em todo o mundo, inclusive eu, interpretemos como violência injustificável o modo como os sauditas encaminharam a questão do Bahrain.

Uma segunda via pela qual os sauditas já demonstraram o quanto estão frustrados com os discursos de Obama é denunciar a hipocrisia de Washington. Semana passada, o príncipe saudita Turki al-Faisal publicou no Washington Post um importante documento, bem arrazoado, sob o título de “EUA pró-Israel: favoritismo fracassado” - 10/6/2011, Turki al-Faisal,Washington Post, EUA; em português.  
Turki foi embaixador saudita nos EUA e no Reino Unido e foi chefe da inteligência saudita. Embora esteja hoje fora do governo (motivo pelo qual, provavelmente, assina o artigo publicado nos EUA), o que lá se lê pode ser considerado manifestação direta de sentimentos e pensamento do governo saudita. E o que diz Turki?

1. Referindo-se a Obama, no discurso sobre o Oriente Médio, Turki escreve que “[Obama] chamou a atenção de governos árabes para que abraçassem a democracia”, mas, simultaneamente, nada disse na direção de exigir os mesmos direitos de autodeterminação para os palestinos – apesar de o território palestino estar ocupado pela mais forte potência militar da região.” 

2. Turki descreve como “deprimente” ver o Congresso dos EUA aplaudir quando se negavam “aos palestinos os direitos humanos mais básicos”, durante recente visita do primeiro-ministro de Israel Binyamin Netanyahu ao Congresso norte-americano. 

3. Considerados em conjunto, os dois eventos – os EUA aplaudirem os israelenses por negarem direitos humanos básicos aos palestinos, ao mesmo tempo em que Obama exige que os mesmos direitos humanos básicos sejam respeitados no resto do mundo árabe, são, do ponto de vista dos sauditas, indicação clara de que “os planos de paz inventados por EUA e Israel já se revelaram inviáveis e o conflito Israel-Palestinos continuará perfeitamente sem solução à vista, enquanto as políticas dos EUA continuarem a dar injustificável prioridade aos interesses de Israel”. 

4. Assim sendo, “na falência de quaisquer negociações produtivas, é chegada a hora de os palestinos deixarem de lado EUA e Israel e buscarem reconhecimento internacional do estado palestino diretamente na ONU.” Nesse movimento, serão firmemente apoiados pela Arábia Saudita.

Os sauditas erraram no Bahrain, mas acertaram integralmente na Palestina. E o recado não para aí. Pode-se dizer que Turki de fato ‘jogou a luva’, em declarado desafio a Obama e aos EUA.

5. “Os políticos norte-americanos não se cansam de repetir que Israel é seu ‘aliado indispensável’. Logo aprenderão que há outros atores na região – além da rua árabe – que podem ser aliados, se não muito mais, pelo menos igualmente ‘indispensáveis’”. 

“Haverá consequências desastrosas para as relações EUA-Sauditas, se os EUA vetarem na ONU o reconhecimento do estado palestino”.

Deve-se considerar que não há qualquer base legal para esse veto, na Assembleia Geral da ONU. Mas o governo Obama pode dificultar muito as coisas, simplesmente torcendo braços e apertando gargantas em número suficiente, entre as nações que dependem de Washington, para conseguir que votem “Não” ao reconhecimento do estado palestino.

Foi exatamente o que o governo Truman fez em 1948, para conseguir o número de votos necessários para aprovar o reconhecimento do estado de Israel (por pequena diferença). Será muito triste ironia, se o governo Obama recorrer à mesma tática, para, outra vez, derrotar os palestinos.

6. Turki conclui: “Nós árabes muitas vezes dissemos não à paz. E em 1967 pagamos o preço pelas muitas vezes que erramos. Em 2002, o rei Abdullah ofereceu o que viria a ser chamado de Iniciativa da Paz Árabe (...). Mas, dessa vez, são os israelenses, que dizem não à paz. Espero não estar por perto, quando os israelenses tiverem de pagar o preço pelo erro que estão cometendo.”

Seria temeridade decidir que a Arábia Saudita blefa. Turki tem bastante razão ao dizer que há outros parceiros no Oriente Médio que são mais indispensáveis para os EUA e para o ocidente em geral, que Israel. Por exemplo, qualquer dos grandes produtores de petróleo que há por lá.

Para provar o que dizem, os sauditas nem precisarão repetir o embargo do petróleo de 1973. Basta que reduzam gradual, mas ininterruptamente, o ritmo da produção, e pressionem outros produtores árabes para que façam o mesmo. Se o fizerem, o presidente Obama terá de lutar pela reeleição, em 2012, com o preço da gasolina acima de $5 o galão.

E o preço não cairá apenas por o vencedor ser algum Mitt Romney ou qualquer outro em fantasia de elefante. E pode não cair até que os palestinos recebam o direito de conseguir uma paz justa. (...)

O poder de Israel 

Contra essa referência muito clara ao poder dos sauditas, temos a mais recente chicanice de Netanyahu, primeiro-ministro de Israel.

Em conferência de imprensa em Roma, Netanyahu, estimulado pelos sorrisos de aprovação de Silvio Berlusconi, disse ao mundo que “o problema não são os ‘assentamentos’ (colônias exclusivas para judeus). A raiz do conflito é que os palestinos recusam-se a reconhecer a existência do estado judeu” [sobre isso, ver 18/6/2011, Uri Avnery, “Negar! Não aceitar! Dizer NÃO”]. 

Mais tarde,. Netanyahu elaborou: “É conflito insanável, porque não se disputa território (...). Até que os palestinos aceitem Israel, não só como país, mas como estado judeu, é impossível avançar.” 

Todos os líderes israelenses parecem ser tomados pelo delírio de inventar ilusões. Aqui, Netanyahu manifesta o mesmo delírio, tentando paralisar todo o processo de paz por efeito de suas palavras. Mas o ato de mágica engana espectadores sem qualquer memória ou perspectiva histórica. E Netanyahu consegue repetir suas bobagens sem história que as confirme, e nem por isso é desmentido. 

Mas muitos conhecem os vários fatos que Netanyahu omite. Eis alguns:

1. Em 1993, a Organização de Libertação da Palestina, liderada então por Yasir Arafat, reconheceu formalmente o estado de Israel. Naquele momento, todos sabiam exatamente o que significava “estado de Israel”. Ninguém jogava com ases tirados da manga, nem tentava introduzir na definição do estado termos jamais definidos com clareza, como o adjetivo “judeu”. 

O próprio Arafat disse depois ao jornal britânico Guardian que era “claro e óbvio” que Israel era e sempre seria judaica e que o problema dos refugiados teria de ser resolvido de modo que permitisse manter aquele traço judeu.

2. E há também informação vazada nos Palestine Papers (Janeiro, 2011), segundo a qual Mahmoud Abbas (também chamado Abu Mazen) e seus seguidores ofereceram aos israelenses absolutamente tudo que exigiram.

Como escrevi naquela época, Abbas e seus colegas “estavam dispostos a concordar com os bantustões, a ceder praticamente toda Jerusalém, a dar as costas a 99% dos refugiados, a fingir que não viam que a população de Gaza estava sendo massacrada e a servir, como aliados, à ocupação da Cisjordânia pelos exércitos de Israel.

“Ao final daquela ‘negociação’, já praticamente nada restava pelo qual valesse a pena lutar. Como o principal negociador da Autoridade Nacional Palestina, Saeb Erekat, disse aos enviado dos EUA ao Oriente Médio George Mitchell, os palestinos haviam feito tudo, exceto “converter-se ao sionismo”. Mesmo assim, os israelenses ignoraram todas as concessões feitas pelos palestinos.”

Ora, pode-se dizer que Netanyahu é homem de visão tão estreita e tão mal informado que não lembra de 1993 nem sabe do que Arafat explicou aoGuardian. Pois ainda assim teria de lembrar da capitulação tão fartamente noticiada nos Palestine Papers. Afinal de conta, aconteceu, em grande parte, sob seus próprios olhos.

E o que dizer da exigência de reconhecer o tal “estado judeu”? A única conclusão a que se pode chegar é que o primeiro-ministro Netanyahu é daqueles comediantes que depende de um ‘escada’, e que supõe que o resto do mundo, que, para ele, estaria representado no Congresso dos EUA, vive de lhe dar as ‘deixas’ sem as quais não teria como apresentar seu ‘número’. 

Contra todas esses delírios, há a realidade: a liderança política em Israel não tem qualquer interesse em fazer a paz. A paz deve ser evitada a todo custo, porque interromperá, necessariamente, o continuado roubo de terra palestina, por israelenses. Por isso, de fato, para Netanyahu, “é impossível avançar” rumo a qualquer paz.

E o vencedor? 

O que acontece se os sauditas decidem, mesmo, que chegou a hora de aplicar seu imenso poder econômico para ajudar os palestinos? O poder dos comediantes israelenses bastará para competir com os sauditas? Bem, há alguns argumentos a considerar:

1. O poder dos sionistas, fora da Palestina, está confinado a apenas alguns poucos pontos. Não significa que não exista, mas significa que tem base real bem reduzida. O poder do sionismo repousa sobre duas torres gêmeas: a culpa ocidental pelo holocausto e a influência do lobby pró-Israel. Esse último, pelo menos nos EUA, aparece sob a forma de dinheiro pago a políticos e campanhas eleitorais.

Os sionistas também têm poder sobre a ‘mídia’, mas é hoje poder bem menos extensivo do que já foi. Não se sabe exatamente o quanto esse poder ‘midiático’ dos sionistas conseguiria influir, em circunstâncias em que houvesse, ativados, consideráveis contrapesos econômicos e financeiros.

2. O poder da Arábia Saudita, por sua vez, é realmente internacional-global e é poder com importantes bases econômicas bem reais. Se o preço dos combustíveis disparar, por ativa manipulação pelos sauditas e outros produtores árabes de petróleo, não há o que os sionistas possam fazer para ‘revidar’.

E, agora? O que farão os norte-americanos e os europeus? Invadir a Arábia Saudita, o Kuwait, o Bahrain, o Qatar et allii? São ideias que ocorrem a roteiristas de romances e filmes ‘de espionagem’ e só serão ‘promovidas’ por terroristas limítrofes, tipo John Bolton. Na vida real, nunca aconteceu.

Não. O novo tipo de confrontação não pode ser vencida pelos sionistas. É interessante observar que praticamente nada disso aparece discutido na ‘mídia’ norte-americana. Provavelmente, os sionistas e seus cúmplices creem que, se fecharem os olhos e ouvidos e fingirem que a Arábia Saudita não disse o que disse, a Arábia Saudita sumirá para sempre. Talvez estejam contando com energiafusion, ainda em setembro desse ano! Ou, vai-se ver, decidiram que o príncipe Turki al-Faisal blefou, pelo Washington Post.

Pessoalmente, entendo que pode ter chegado a vez da Arábia Saudita. Talvez os sauditas possam impor uma paz justa entre Washington e Telavive. Ninguém espere notícias pela ‘mídia’, mas, para ajudar os palestinos, estou disposto a pagar o preço que os sauditas resolverem cobrar, para encher o tanque! 

O reino saudita adverte que democracia deve ser pra todos.


EUA pró-Israel: favoritismo fracassado

Turki al-Faisal

10/6/2011, Turki al-Faisal, Washington Post, EUA
Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu

O príncipe Turki al-Faisal é diretor do Centro de Pesquisas e Estudos Islâmicos de Riad. Foi chefe da inteligência saudita de1977 a 2001 e embaixador nos EUA de 2004 a 2006.

O presidente Obama fez importante chamamento à ação no controverso discurso, mês passado, em que chamou a atenção de governos árabes para que abraçassem a democracia e garantissem a liberdade de suas respectivas populações. Nós, na Arábia Saudita, levamos a sério aquele chamamento. Mas observamos que o presidente, nada disse na direção de exigir os mesmos direitos de autodeterminação para os palestinos – apesar de o território palestino estar ocupado pela mais forte potência militar da região.

Pouco adiante, Obama outra vez pôs-se no papel de farol dos direitos humanos, quando permitiu que o primeiro-ministro de Israel definisse os termos da agenda do processo de paz entre Israel e os palestinos. E ainda mais deprimente que ver o Congresso dos EUA aplaudir a atitude de negar aos palestinos os direitos humanos mais básicos, foi ver os EUA darem as costas a todos os ideais e valores de que tanto falam.

Apesar das críticas de Israel à ideia do presidente Obama, de que se usem as fronteiras de 1967 como base para futuros acordos, a ideia nada trouxe de mudança substantiva na política dos EUA. A única meta que os EUA têm a propor ainda é a Solução de Dois Estados, na direção da qual os EUA decidiram que se façam as negociações, partindo da divisão do território entre Israel e os palestinos pelas fronteiras que havia antes da Guerra dos Seis Dias, em 1967.

Obama tem razão no que disse, porque as linhas de 1967 são o único ponto de partida possível para quaisquer conversações e, portanto, para que se chegue a alguma paz. A ideia de que os palestinos aceitariam quaisquer outros termos para as negociações simplesmente não é realista. Apesar de Netanyahu ter rejeitado as sugestões (“Não podemos voltar àquelas fronteiras indefensáveis e teremos presença militares de longo prazo ao longo do [rio] Jordão”), os dois lados, há muito tempo, já aceitaram as fronteiras de 1967 como ponto de partida. 

Em 2008, Ehud Olmert, então primeiro-ministro, disse ao Parlamento israelense: “Temos de desistir dos bairros árabes em Jerusalém e voltar ao núcleo do território do Estado de Israel de antes de 1967, com pequenas trocas ditadas pela realidade criada desde então.”

Em novembro passado, a secretária de Estado Hillary Clinton e Netanyahu declararam, em documento que assinaram em conjunto, que “os EUA creem que mediante negociações de boa fé, as partes podem chegar a um acordo que ponha fim aos conflitos e reconcilie o objetivo dos palestinos, de terem estado independente e viável, baseado nas fronteiras de 1967, com trocas negociadas, e o objetivo de Israel, de ter um estado judeu com fronteiras seguras e reconhecidas que reflitam desenvolvimentos posteriores e satisfação as necessidades de segurança de Israel.”

Pode-se extrair uma conclusão dos eventos recentes: que os planos de paz inventados por EUA e Israel revelaram-se inviáveis e que o conflito Israel-Palestinos continua perfeitamente sem solução à vista, enquanto as políticas dos EUA continuarem a dar injustificável prioridade aos interesses de Israel. Mais do que pelas diferenças com Netanyahu, Obama está paralisado também por outras forças, na tentativa de desempenhar papel construtivo. 

Às vésperas de ano eleitoral, o governo Obama sem dúvida se curvará às pressões de interesses e de um Congresso dominado por Republicanos, e não insistirá em forçar Israel a aceitar os termos concretos que poderiam levar os palestinos à mesa de negociação.

Mas não se pode aceitar que a política doméstica dos EUA e a intransigência de Israel impeçam que os palestinos tenham direito a um futuro, com qualidade decente de vida e oportunidades semelhantes às de que gozam todos os que vivem em país livre de soldados estrangeiros de ocupação. Por isso, na falência de quaisquer negociações produtivas, é chegada a hora de os palestinos deixarem de lado EUA e Israel e buscarem reconhecimento internacional do estado palestino diretamente na ONU. 

A Arábia Saudita, outros países árabes e a vasta maioria da comunidade internacional – todos nós que desejamos solução equilibrada para a tragédia dos palestinos e um Oriente Médio estável – apoiaremos integralmente os palestinos nessa luta.

Obama criticou esse plano que, para ele, seriam “esforços para deslegitimar Israel”. E sugeriu que essas “ações simbólicas para isolar Israel” acabariam em fracasso. Mas por que os palestinos não fariam jus aos mesmos direitos que a mesma ONU assegurou ao estado de Israel ao criá-lo em 1947? 

O presidente Obama deve dar-se conta de que o mundo árabe não mais permitirá que os palestinos sejam deslegitimados por atos dos israelenses que os impedem de se movimentar; que estão destruindo a economia dos palestinos; e que já destruíram até casas dos palestinos.

A Arábia Saudita não se manterá calada e inativa enquanto Washington e Telavive nada fazem além de repetir intenções que não se realizam, nada fazem para por em execução seus muitos planos e então, à falta de planos propostos por eles próprios, trabalham para impedir que se construa e para minar o que já se construiu na direção de impor a legítima presença dos palestinos no cenário internacional.

Como principal apoiador político e financiador da luta dos palestinos em busca do direito de autodeterminação, a Arábia Saudita não abrirá mão da posição que tem, excepcionalmente forte. A riqueza do reino, o crescimento sustentado e a estabilidade da Arábia Saudita são fundamentais para todo o Oriente Médio. Berço do Islã, a Arábia Saudita saberá unir simbolicamente todos os muçulmanos do mundo. Em setembro, o reino mobilizará seu considerável poder diplomático para apoiar os palestinos na luta por reconhecimento internacional.

Os políticos norte-americanos não se cansam de repetir que Israel é seu “aliado indispensável”. Logo aprenderão que há outros atores na região – além da rua árabe – que podem ser aliados, se não muito mais, pelo menos igualmente “indispensáveis”. 

O jogo de sempre favorecer Israel ainda não trouxe qualquer vantagem aos EUA. Em breve se verá que foi movimento ainda mais insano do que parece.

Muitos comentaristas previram que a Arábia Saudita estaria deixando de ser a “usina” regional. Desapontaram-se amargamente. A história também mostrará o quanto se enganam todos os que crêem que o futuro da Palestina será decidido por EUA e Israel. 

Haverá consequências desastrosas para as relações EUA-sauditas, se os EUA vetarem na ONU o reconhecimento de um estado palestino. Teremos chegado ao ponto mais baixo de relações que existem há décadas; estará para sempre comprometido qualquer processo de paz entre Israel e palestinos; e a reputação dos EUA entre os países árabes será muito gravemente atingida. Aumentará a distância que separa o mundo muçulmano e o Ocidente em geral – e sumirão boas oportunidades de amizade, negócios e cooperação entre todos.

Nós árabes muitas vezes dissemos não à paz. E em 1967 pagamos o preço pelas muitas vezes que erramos. Em 2002, o rei Abdullah ofereceu o que viria a ser chamado de Iniciativa da Paz Árabe. Baseado na resolução n. 242 do Conselho de Segurança da ONU, a Iniciativa da Paz Árabe pede o fim dos conflitos das trocas de terra por paz: os israelenses retiram-se de todas as terras ilegalmente ocupadas, inclusive de Jerusalém Leste; encontram solução que todos aprovem para o problema dos refugiados palestinos; e reconhecem o estado palestino. Em troca, Israel será reconhecida por todo o mundo árabe e pelos estados muçulmanos; por-se-á fim às hostilidades; e se construirão relações normais com Israel. Mas, dessa vez, são os israelenses, que dizem não à paz. 

Espero não estar por perto, quando os israelenses tiverem de pagar o preço pelo erro que estão cometendo.

Número dois anuncia mudanças no jornalismo da globo.


Chama atenção a dança das cadeiras na TV Globo por várias razões.
Primeiro, quem fez o anúncio foi Carlos Henrique Schroder, o número dois, e não Ali Kamel, o número um. Corre pelos corredores da emissora a notícia de que Ali atualmente não apita mais tanto quanto antes. Contribuiram para sua derrocada, o tipo de jornalismo que ele empreendeu, desde que assumiu, centralizando as decisões e condicionando a cobertura à sua vontade (ou seria à vontade expressa do patrão?).
Outro episódio definitivo para a queda teria sido o "bolinhagate", a tentativa de comprovar que o então candidato à presidência José Serra tinha sofrido um traumatismo craniano, depois de atingido por uma bolinha de papel. Até o perito Ricardo Molina foi convocado às pressas para dar legitimidade ao caso, que atingiu em cheio a credibilidade da emissora.
Sabe-se que naquela noite o Jornal Nacional foi vaiado pelos próprios jornalistas e que, em Brasília, a exemplo do que aconteceu em São Paulo em 2006, a diretora de jornalismo Silvia Faria teria dito o mesmo que Mariano Boni em São Paulo, anos antes: "quem não estiver satisfeito procure a Record".
Quem frequenta a emissora conta que, agora, raramente Ali desce do quarto andar onde se refugiou para escrever seus artigos, comprar suas polêmicas e processar seus "detratores". Agora há dois subalternos que fazem o serviço para ele no Jornal Nacional: Renato Ribeiro (ex-editor chefe do Jornal Nacional) e Luis Claudio Latgé (ex-diretor de jornalismo de São Paulo). Ali só é consultado quando o assunto é muito cabeludo. O sinal já havia sido dado no começo do ano, quando o diretor superintendente Octávio Florisbal anunciou em alto e bom som que o jornalismo da emissora ía mudar.
Recente pesquisa mostra preocupação com os índices de audiência do jornalismo, sobretudo no periodo matutino onde, não raro, a emissora amarga o segundo lugar durante toda a manhã.
Não por acaso a dança das cadeiras começou por Renato Machado, que será uma espécie de embaixador em Londres. Para quem gosta de vinho e música clássica, como ele, é um prêmio e tanto para quem se dedicou 15 anos ao Bom Dia Brasil, acordando às 4 horas da manhã. Renato estará a um passo de Paris, Geneve, Roma e Frankfurt. É tudo o que ele sempre pediu a Dionísio.
Para o seu lugar assume Chico Pinheiro. O veterano jornalista e apresentador vai tentar popularizar o jornal. Está sendo reabilitado depois de amargar uma geledeira no SPTV. É sinal também de que a emissora está disposta a atrair os extratos mais à esquerda do espéctro político de seu público. Chico - como antítese de Renato - é a MPB e a caipirinha no poder.
Outra veterana da apresentação, Mariana Godoy, segue agora para o Jornal das 10 da Globo News, reflexo do incômodo causado pela chegada de Heródoto Barbeiro à Record News. Para o seu lugar vai César Tralli, que realiza um sonho antigo, que é ocupar uma bancada de telejornal. Na reportagem ele se consagrou, mas pagou um preço muito alto: os colegas detestam seu estilo e seus modos, considerados por muitos bastante pragmáticos, se é que podemos dizer assim.
Se a volta de Schroder pode aplacar os ânimos? Só o tempo dirá. Minha aposta é que sim. Ele tem o apoio da família Marinho e uma capacidade de sobrevivência invejável. Ele pode ser reabilitado e quem sabe a emissora faça as pazes com a notícia. Talento dos colegas e recursos técnicos não faltam. Mas como na Globo tudo demora um pouco, as mudanças só virão quando entrar setembro. Portanto, o inverno tem tudo para ser quente.