terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Folião preso denuncia acordão no carnaval de SP



Folião preso denuncia acordão no carnaval de SPFoto: PAULO FISCHER/AGÊNCIA ESTADO

POLÍCIA INFORMA QUE OS DOIS PRESOS QUE RASGARAM ENVELOPES E INCITARAM VIOLÊNCIA REVELARAM "ACORDO DE CAVALHEIROS" PARA NENHUMA ESCOLA SAIR CAMPEÃ; MOCIDADE ALEGRE ESTAVA FATURANDO O TÍTULO SÓ COM NOTAS 10 ATÉ O MOMENTO DA CONFUSÃO; ESCOLAS ESTÃO REUNIDAS PARA DECIDIR SE APURAÇÃO SERÁ CANCELADA

21 de Fevereiro de 2012 às 20:27
247, com informações de agências - A Polícia Civil de São Paulo informa que os dois foliões presos nesta terça-feira, 21, revelaram um "acordo de cavalheiros" das escolas de samba de São Paulo para nenhuma agremiação sair campeã. O dirigente da Império da Casa Verde Tiago Ciro Tadeu Faria (foto), 29, e o torcedor da Gaviões da Fiel Cauê Santos Ferreira, 20, se envolveram no tumulto e acabaram detidos. Os dois vão responder pelos crimes de supressão de documento e depredação do patrimônio público.
De acordo com eles, o acordo foi uma resposta à mudança de última hora na escolha de jurados pela Liga das Escolas de Samba, efetuada na quinta-feira, 16. O presidente da Vai-Vai, Neguitão, foi um dos que incitaram a violência no sambódromo. Segundo o Estadão, ele disse: "Tá tudo vendidinhi, tá tudo vendidinho", referindo-se aos jurados.
As escolas de samba seguem reunidas para bater martelo sobre a apuração. Afinal, os votos serão cancelados? Em tempo: o regulamento da liga determina que escolas com integrantes envolvidos em "comportamento inadequado" estão fora da competição.
Para saber momento a momento o que aconteceu no Anhembi, neste domingo, clique aqui.

Sobre a crônica reacionária de Nelson Rodrigues





>Nelson RodriguesNelson Rodrigues: "Sou um ex-covarde"
Nelson Rodrigues, reacionário ou revolucionário?  Essa questão, colocada por Sábato Magaldi, dá panos pra manga e exige, sem dúvida, que se dê tratos à bola.  Magaldi a colocou como conclusão definitiva, no fecho do longo prefácio que escreveu para oTeatro Completo.:
Um dia, será necessário rever o epíteto de reacionário que o próprio Nelson se afixou.  Na verdade, há muito de feroz ironia nesse qualificativo.  Porque Nelson Rodrigues foi reacionário apenas na medida em que não aceitou a submissão do indivíduo a qualquer regime totalitário.  Quando a pessoa humana for revalorizada, também desse ponto de vista ele será julgado revolucionário. (MAGALDI, Prefácio in RODRIGUES, 1993: 131)
Retomo-a como ponto de partida.  Antes, porém, vale indagar qual é o conceito que se faz Magaldi da revalorização da pessoa humana.  Ele emprega um "quando", o que aponta para um tempo por vir; uma utopia, por conseguinte.  Como ele se imaginaria esse tempo utópico?  Em que consistiria essa revalorização?  A que plano ele se referiria: ao das relações interpessoais, ao das relações ético-comunitárias marcadas pela vizinhança ou ao das relações sociais extensivas?  Quais os conceitos de reacionário e revolucionário que Magaldi se fazia?
Ao se declarar reacionário, Nelson assumiu uma posição de direita, sem subterfúgios.  Pode-se acusá-lo do que for, menos de dissimulação.
A distinção entre reacionário e revolucionário ─ ou, o que dá no mesmo, entre esquerda e direita ─ soa claramente desconfortável para Magaldi, Rui Castro, Wilson Figueiredo e outros autores.  E o próprio Nelson finalmente repetiria, em diversas entrevistas, a resposta à indefectível pergunta: ─ "O senhor é reacionário?"  ─ "Não, sou um libertário.  Reacionária é a URSS". (CASTRO, 1992: 414)
Para Magaldi, Nelson apenas não aceitava "a submissão do indivíduo a qualquer regime totalitário".  Mas será mesmo?  E a submissão à ditadura militar brasileira?
Esse desconforto em ser reacionário talvez seja revelador de um engajamento ideológico com a sua conseqüente posição política não assumida.  Afinal, nunca se soube de um esquerdista que se sentisse desconfortável em ser de esquerda, a não ser nas masmorras da ditadura.  Mas Nelson, para se assumir de direita, precisou de uma longa justificativa, pessoalíssima, durante a qual desfilou suas tragédias familiares para finalmente arrematar com um desabafo: "Sou um ex-covarde".
Nesta crônica, publicada em O Globo de 18 de outubro de 1968, menos de dois meses antes do AI-5, ele chamou os estudantes que participavam das manifestações contra a ditadura militar de "jovens canalhas".  Ao fazê-lo, ele estava pondo o dedo na ferida da direita bem-pensante, chamando-a de hipócrita.  Mas, talvez, inconscientemente, ele estivesse apenas revelando a sua irritação com o isolamento crescente da ditadura militar, por ele apoiada.  Porque havia uma direita que dava as caras e apoiava abertamente o regime autoritário, inclusive invadindo apresentações teatrais e espancando atores.  Mas com essa direita ele não queria se identificar.  Chegou a protestar contra ela.
Que situação era aquela?  A sociedade se recuperava do golpe militar de 64. Havia uma espécie de nostalgia da liberdade. A música popular brasileira explodia nas paradas de sucesso com Nara Leão e Elis Regina. O teatro encenava musicais e peças engajadas: Opinião, com Maria Bethânia cantando "Carcará" ("pega, mata, come"); LiberdadeLiberdade, com Paulo Autran. O movimento cineclubista recuperava público para o cinema novo, que questionava o golpe com desafio, de Paulo César Sarraceni.  Na poesia, Thiago de Mello desafiava o regime com Faz escuro mas eucanto, e João Cabral de Melo Neto consagrava a temática social com Morte e vidaSeverina . Era como se fosse uma retomada da efervescência política e cultural do início dos anos 60 ─ em condições históricas adversas. E esse ambiente preparava o movimento contestatório de 68.
A quantidade de vestibulandos excedentes em 1968 chega a 125 mil e isso repercute negativamente na classe média que, após ter apoiado o golpe de 1964, entra em rota de colisão com o regime militar.
Com a tendência a uma crescente monopolização da economia, a classe média vê estreitar-se o espaço para o empreendedorismo em pequenos negócios e no trabalho autônomo.  Resta a via do diploma universitário para alcançar cargos bem remunerados nos altos escalões do aparelho do Estado ou das corporações multinacionais que vão dominando o nosso mercado interno.  O sonho da ascensão social, tão caro à classe média, é obstaculizado, no entanto, pelo funil do vestibular.  Por isso, a crise dos excedentes preocupa o regime militar e funciona como uma pressão para a expansão das matrículas no ensino superior.
Quanto aos "jovens canalhas" de 68, vale lembrar que, entre eles, estava o seu filho Nelsinho.
O regime endurece diante da contestação estudantil, enquanto o Nelson cronista consolida o seu apoio aos militares.  Vivíamos, já então, sob a ação repressora do famigerado DOI-CODI: assassinatos e torturas. Os direitos humanos eram violados; e as garantias constitucionais, canceladas. Os cárceres estavam repletos de presos políticos. Escritores, artistas e jornalistas sofriam os rigores da censura. O próprio Chico Buarque de Holanda, então unanimidade nacional, amargou o exílio, como Caetano, Gil e tantos outros.  Em 1972, Nelsinho é preso e Nelson se vê defrontado com uma realidade por ele inúmeras vezes negada: a tortura no Brasil.
Podemos concretizar estas questões tendo em vista Nelson Rodrigues em pelo menos três situações: como indivíduo, que tem uma história pessoal; como teatrólogo, que tem uma obra; e como cronista, que se expõe nas batalhas ideológicas do cotidiano.  É no cotejo entre o cronista e o teatrólogo, tendo a sua história pessoal como pano de fundo, que queremos investigar a questão colocada por Magaldi: reacionário ou revolucionário?  É claro que cada época terá sua resposta a essa questão.  Em todo caso, não está em causa aqui a pessoa de Nelson Rodrigues, mas a sua personacomo cronista e teatrólogo.
Autor e autoria
Para Foucault, o autor como foco da coerência do discurso não voga nas conversas cotidianas (logo apagadas), nem nos decretos ou contratos (têm signatários, não autores), nem nas receitas domésticas ou técnicas (anônimas), etc.  Mas vige nos discursos de autoria: "literatura, filosofia, ciência". (FOUCAULT, 2004: 27)  Ele sublinha que, na Idade Média, a autoria era indispensável como indicador de verdade no discurso científico, enquanto as obras literárias podiam circular anonimamente.  Em contrapartida, desde o séc. XVII, a função do autor vem se enfraquecendo no discurso científico, ao passo que foi se tornando indispensável no literário: "o autor é aquele que dá à inquietante linguagem da ficção suas unidades, seus nós de coerência, sua inserção no real". (FOUCAULT, 2004: 28)
Esses valores de unidade, coerência, inserção no real, que a ficção ganha do autor, são operados através da mediação do leitor.  Bakhtin a exemplifica com Shakespeare: "nem o próprio Shakespeare nem os seus contemporâneos conheciam o grande Shakespeare que hoje conhecemos".  E isso porque:
Os fenômenos semânticos podem existir em forma latente, em forma potencial, e revelar-se apenas nos contextos dos sentidos culturais das épocas posteriores favoráveis a tais descobertas.  Os tesouros dos sentidos, introduzidos por Shakespeare em sua obra, foram criados e reunidos por séculos e até milênios: estavam escondidos na linguagem, e não só na literária como também em camadas da linguagem popular que antes de Shakespeare ainda não haviam penetrado na literatura, nos diversos gêneros de formas de comunicação verbalizada, nas formas da poderosa cultura popular (predominantemente nas formas carnavalescas) que se formaram ao longo de milênios, nos gêneros do espetáculo teatral (dos mistérios, farsas, etc.), nos enredos que remontam com suas raízes à Antigüidade pré-histórica e, por último, nas formas de pensamento. (BAKHTIN, 2003b: 363)
Vigotski adverte que, "uma vez criada, a obra de arte separa-se de seu criador; não existe sem o leitor; é apenas uma possibilidade que o leitor realiza" (VIGOTSKI, 1999a: XIX).  E o leitor a realiza na medida em que "a reproduz, recria e elucida" (VIGOTSKI, 1999a: XXI).   E é esse também o juízo emitido por Barthes ao dizer que "a escrita tem esse poder de operar um verdadeiro silêncio sobre a destinação".    Por isso, ele a nomeia de "contra-comunicação", "cacografia". (BARTHES, 1992: 172)   Mas, além disso, Barthes sublinha que, "no texto, fala apenas o leitor". (BARTHES, 1992: 173)
Não é outra a perspectiva de Derrida.  Ele ensina que "Sócrates compara a uma droga (phármakon) os textos escritos que Fedro trouxe consigo".  E reforça que "essephármakon, essa 'medicina', esse filtro, ao mesmo tempo remédio e veneno, já se introduz no corpo do discurso com toda a sua ambivalência". (DERRIDA, 2005: 14)  Como anota Evando Nascimento a esse respeito, "o texto escrito pode dizer aquilo que o pai-falante jamais diria, constituindo uma traição à origem do discurso e um parricídio em relação ao seu autor". (NASCIMENTO, 2004: 21)
Com efeito, nem sempre se pode distinguir com clareza a que um dito se refere, se aponta para um objeto preciso, se comporta uma ambigüidade ou se alude.a uma constelação de possibilidades. Além disso, quando falamos, dizemos algo a alguém; mas, no texto literário, para quem escrevemos? O falante escolhe o seu ouvinte, ao passo que o escritor não sabe para quem escreve[1], nem pode ter certeza de que realmente haja alguém para quem escreva, posto que é o leitor quem escolhe o texto.  Com isso, não se pretende negar que toda escritura é dialógica, vale dizer, tem em mira um leitor ideal, hipotético.  Mas se pretende realçar que, se escrever é despertar o discurso interior do leitor, a escrita sem leitura é como uma voz sem sonoridade.  Não uma voz interior, mas uma não-fala.  Sequer um silêncio significativo, mas uma ausência ignorada, já que a leitura (e cada releitura) é como o sopro inaugural que infunde o hálito da vida (ânimo, alma) à matéria inerte (modelada em significantes "com o pó apanhado do solo" - Gn 2,7).
Todavia, a obra clássica geralmente é como um planeta na galáxia do autor.  A sua leitura não se fará num gesto isolado, desvinculada da intertextualidade com o conjunto da obra do autor e da fortuna crítica que o consagrou.
Bakhtin apresenta as idéias de "horizonte próprio" e "excedente de conhecimento" para dar forma ao "campo de visão" do autor.
A verossimilhança da personagem é, para Dostoiévski, a verossimilhança do seu discurso interior sobre si mesma em toda a sua pureza, mas para ouvi-lo e mostrá-lo, para inseri-lo no campo de visão de outra criatura torna-se necessário violar as leis desse campo de visão, pois um campo normal de visão tem capacidade para absorver a imagem objetiva de outra criatura mas não outro campo de visão em seu todo.  Tem-se de procurar para o autor algum ponto fantástico situado fora do campo de visão. (BAKHTIN, 2005: 54)
Transgrediência[2] é um conceito que procura dar conta da relação "eu - tu", seja como "sujeito - objeto" (nas ciências humanas) ou como "autor - personagem" (na literatura).  Para conhecer-te, eu devo procurar experimentar a tua situação, assumir o teu "horizonte próprio" presumido.  O paradigma é o da compreensão do sofrimento alheio.  Eu preciso colocar-me no teu lugar para tentar sentir o que tu estás sentindo (empatia).  Só assim poderei avaliar o teu sofrimento.  A transgrediência consiste no "abrir-se para o outro", na transgressão das fronteiras do "eu - tu" em direção ao "nós"; ou, dito de outro modo, na superação dos particularismos rumo a uma visão mais universal.  Mas "aqui há um núcleo interior que não pode ser absorvido, consumido, em que sempre se conserva uma distância em relação à qual só é possível o puro desinteresse; ao abrir-se para o outro, o indivíduo sempre permanece também para si" (BAKHTIN, 2003b: 394).   Eu não posso nem devo fundir-me contigo, preciso guardar uma distância crítica que me deixe continuar sendo eu mesmo, pois é justamente o meu "excedente de conhecimento" que me permite enxergar-te por inteiro e completamente, alcançar uma visão de ti que eu não posso ter de mim mesmo.  Ninguém consegue enxergar-se por inteiro, a menos que tenha a sua imagem refletida por um outro (ou há o feitiço da imagem especular - processo narcísico).  E ninguém pode ver-se completamente, pois o seu vir-a-ser só se completa com a morte (mas o que já não é não pode auto-avaliar-se).  E é através da exotopia[3] que eu posso alcançar uma compreensão mais ampla do teu sofrimento do que a compreensão que tu mesmo podes ter dele.  Sem exotopia não há transgrediência, pois haveria no máximo a troca de um particularismo por outro.  É o que acontece com aquele que substitui o sistema de valores de sua cultura pelo de outra.  Um caso ilustrativo e incomum é o de Pierre Verger (1902 - 1996).  "Tornou-se babalaô em Kêto, por volta de 1950, e foi por essa época que recebeu de seu mestreOluwo o nome de Fatumbi: 'Aquele que nasceu de novo (pela graça de) Ifá'." (SOARES, 1997: 7)
Emprego livremente os conceitos bakhtinianos.  O latinismo transgrediência  é usado raríssimas vezes por Bakhtin e, geralmente, como sinônimo de exotopia.  Na leitura que faço, prefiro forçar uma especialização dos dois conceitos.  O processo descrito, no entanto, permanece fiel ao pensamento de Bakhtin.
Segundo Lev Semeniovich Vigotski (1896-1934), escrever é despertar o discurso interior do leitor.  Como o autor é o seu primeiro ledor, ele se torna também seu primeiro crítico.  Por esse viés, ganha relevância a distinção que Vigotski estabelece entre o crítico-criador e o crítico-leitor.   Enquanto o crítico-criador (ou crítico-artista) supera a angústia da palavra e da inefabilidade das emoções, o indizível e o inexprimível de seu discurso interior, "como o poeta no entusiasmo da criação", o crítico-leitor "fica sem palavras".  Mas, se escrever é despertar o discurso interior do leitor, para Vigotski, "esse 'discurso interior', o crítico-artista pode suscitá-lo diretamente com sua criação", ao passo que o crítico-leitor está limitado por um "discurso exterior que ele não domina".  Por isso, suas observações "não existem fora da leitura e sem ela". (VIGOTSKI, 1999a: XXII)
Operando como crítico-leitor, esboçamos estas notas de leitura de Nelson Rodrigues que têm como fio condutor a função do dinheiro e do sexo como gestores do "estrangeiro de si mesmo".  Essa operação se dá a partir do que possa ser reconhecido nos rastros do etos[4] do autor-narrador.  A referência ao etos merece uma explicação.  Etos está aqui como um operador textual indecidível[5].  Sua indecibilidade tem para nós a virtude de iluminar o cordão umbilical entre o pessoal e o social.  Como sinaliza Vigotski, "a arte é social em nós".  Ela é "uma técnica social do sentimento, um instrumento da sociedade através do qual incorpora ao ciclo da vida social os aspectos mais íntimos e pessoais do nosso ser". (VIGOTSK, 1999b: 315)[6]
Para abordarmos a subjetividade do autor-narrador, recorremos ao conceito de "campo", em Bourdieu.  O "campo" introduz uma mediação entre o individual e o social.  Bourdieu enfatiza que "o habitus mantém com o campo uma relação de solicitação mútua" e que "a illusio é determinada do interior com base nas pulsões que impelem ao investimento no objeto, mas também do exterior, com base em um universo particular de objetos socialmente oferecidos ao investimento". (BOURDIEU, 1997: 15-16)[7] Dito de outro modo, o estrangeiro de si mesmo somatiza seu estranhamento.  Resulta dessa somatização a febre do corpo, esse devir complexo no qual as pulsões estão enformadas pela sociabilidade (afinal, os hábitos alimentares e o comportamento sexual do homem são formas sociais e não naturais de satisfazer necessidades biológicas).  Sobre esse corpo ensandecido opera a coexistência, nem sempre harmoniosa, entre natureza, normas e tentações culturais subjacentes às interdições que açulam a ambição e a luxúria humanas.
Transitando por essas sendas, o autor-narrador faz do enunciado um phármakon, uma droga: remédio ou veneno, veneno e remédio.   Pois, como Derrida ensina, "operando por sedução, o phármakon faz sair dos rumos e das leis gerais, naturais ou habituais". (DERRIDA, 2005: 14)
Nelson na pós-modernidade
Como se sabe, a relação do presente com o passado é complexa.  Bakhtin sublinha que "o pensamento humano nunca reflete apenas o ser de um objeto que procura conhecer; com este, ele reflete também o ser do sujeito cognoscente, o seu ser social concreto". (BAKHTIN, 2004: 22)  Nesse sentido, há que se atentar para a curiosa circunstância da recepção de Nelson Rodrigues nos nossos dias: trata-se da releitura de um autor da modernidade pela pós-modernidade.
A modernidade está geralmente associada à Segunda Revolução Industrial; a pós-modernidade, à Terceira Revolução Industrial.[8] Aferido por outro diapasão, pós-moderno é o tempo que sucede ao período histórico que se abre com a primeira guerra  mundial (1914-1918) - com a vitória da revolução bolchevique de 1917 - e se encerra com a debacle do bloco soviético.  No Brasil, isso foi percebido como uma dupla queda: a da Ditadura Militar e a do Muro de Berlim.[9]
"Pós-modernidade" - ensina Terry Eagleton - "significa o fim da modernidade, no sentido daquelas grandes narrativas de razão, verdade, ciência, progresso e emancipação universal que, como se acredita, caracterizam o pensamento moderno a partir do Iluminismo." (EAGLETON, 2003: 316)  Na perspectiva pós-moderna, essas ilusões, "ao fazerem flutuar ideais impossíveis diante de nossos olhos, nos afastam de todas as mudanças políticas modestas, porém eficazes, que temos reais condições de criar" (EAGLETON, 2003: 316-317).  E mais: para o pós-moderno,
a verdade é o produto da interpretação, os fatos são construções do discurso, a objetividade é apenas aquilo que qualquer interpretação questionável das coisas tenha conseguido impor, e o sujeito humano é uma ficção, tanto quanto a realidade que contempla - uma entidade difusa e autodividida que carece de qualquer natureza ou essência fixa. (EAGLETON, 2003: 317-318).
O pós-modernismo é a cultura da era pós-moderna.  Eagleton caracteriza a obra de arte pós-moderna típica como "arbitrária, eclética, híbrida, descentralizada, fluida e descontínua"; diz que ela "lembra o pastiche"[10]. (EAGLETON, 2003: 318)  A arte pós-moderna rejeita a profundidade metafísica e envereda pela superficialidade, pela jocosidade e pela inafetividade.  Trata-se de "uma arte de prazeres, superfícies e intensidades fugazes". Desconfia das verdades e das certezas.  Sua forma é irônica; sua epistemologia, relativista e cética.  Rejeita basear-se em referentes a uma realidade externa a si mesma.  Por isso, só se reconhece no plano formal e da linguagem.  Proclama suas próprias ficções como sendo infundadas e gratuitas.  Com isso, postula "uma espécie de autenticidade negativa", alardeando "sua irônica consciência desse fato" e "pervertidamente chamando atenção para seu próprio statusde artifício construído".  Descrente das identidades singulares e das origens absolutas, "chama atenção para sua própria natureza 'intertextual', sua reciclagem paródica de outras obras que, por sua vez, nada mais são que o resultado de tal reciclagem". (EAGLETON, 2003, p. 318)  Todavia, o mais característico do pós-modernismo, para Terry Eagleton, é que, a cultura pós-moderna, avessa a limites e categorias fixos, desconstrói "a tradicional distinção entre 'grande arte' e 'arte popular'", ao construir "artefatos autoconscientemente populistas ou comuns, ou que se oferecem como mercadorias para o consumo enquanto fonte de prazer". (EAGLETON, 2003: 319)
Terry Eagleton coloca questões interessantes.  A pós-modernidade seria "a filosofia apropriada ao nosso tempo"?  Ou seria "a visão de mundo de um exausto grupo de ex-intelectuais ocidentais revolucionários que, com típica arrogância intelectual, projetaram-na sobre a história contemporânea como um todo?" (EAGLETON, 2003: 319-320)
Ou ainda, visto por outro ângulo, como acredita Frederic Jameson, estaríamos "diante da cultura do capital tardio - a penetração final do bem de consumo na cultura"?  Ou "será que se trata, como insistem seus expoentes mais radicais, de um golpe subversivo em todas as elites, hierarquias, grandes narrativas e verdades imutáveis". (EAGLETON, 2003, p. 320)
Uma literatura que semeia incertezas?  Qual a função das incertezas semeadas?  Desestabilizar o pensamento único ou diluir toda crítica?  Seja como for, embora denuncie "as ilusões do pós-modernismo" (EAGLETON, 1998), Terry Eagleton reconhece que "a discussão certamente terá continuidade, sobretudo porque o pós-modernismo é a mais vigorosa de todas as teorias, com raízes num conjunto concreto de práticas e instituições sociais". Com efeito, não se pode ignorar "o consumismo, os meios de comunicação de massa, a política estetizada, a diferença sexual". (EAGLETON, 2003: 320)
Haroldo de Campos propôs o conceito de pós-utópico (CAMPOS, 1997) para dar conta da suspensão (senão exclusão) do princípio-esperança (conceito de Ernst Bloch)[11], que sustentara o imaginário modernista e alimentara seu caráter eminentemente crítico.
A recepção pós-utópica de Nelson Rodrigues talvez tenda a um cronotopo[12]condescendente com o reacionarismo de suas crônicas ou, pelo menos, pouco crítico delas como acontecimento discursivo.  Mas também pode ser que a recepção pós-utópica tenha apenas reforçado o que Carlos Nelson Coutinho generaliza como uma decorrência da "via prussiana" na formação social brasileira: "a conciliação social e política encontra um reflexo ideológico na tendência do pensamento brasileiro ao ecletismo, ou seja, à conciliação igualmente no plano das idéias". (COUTINHO,  1980: 75)  A esse respeito, ensaio uma releitura da crônica de Nelson que dissidia desse consenso reinante.
O dissídio, todavia, não deve nos conduzir a uma posição reducionista, a uma operação de puro rechaço do outro.  Leandro Konder alerta que "a ideologia criticando a ideologia pode se tornar mais ideológica do que a ideologia criticada".  Isso cabe como uma luva para a crítica reacionária feita pela crônica de Nelson Rodrigues, mas também para a crítica de esquerda à sua crônica.  É preciso cautela, sobretudo porque "um intelectual de direita (...) pode construir um conhecimento mais aberto, mais flexível, do que um pensamento de esquerda aprisionado por fórmulas dogmáticas". (KONDER, 2008: 228)  Com essa preocupação, procuramos evitar tanto as fórmulas dogmáticas como a estreiteza sectária na crítica à crônica de Nelson Rodrigues.
Penso, no entanto, que "a história da moderna teoria literária é parte da história política e ideológica de nossa época" e que "a teoria literária está indissoluvelmente ligada às crenças políticas e aos valores ideológicos".  Nesse sentido, "as teorias literárias não devem ser censuradas por serem políticas, mas sim por serem, em seu conjunto, disfarçada ou inconscientemente políticas". (EAGLETON, 2003: 268)   Com certeza, a nossa é uma crítica assumidamente política.
Nelson e seus cronotopos
Bakhtin, influenciado pela teoria da percepção do fisiólogo russo A. A. Ukhtômski[13], cunhou o termo cronotopo para dar conta da questão espaciotemporal como uma unicidade indissociável que encapsula um centro irradiador de juízos de valor.  Pode-se pensar tempo como equivalente de histórico; e espaço, de social.  Nesse viés, tempo-espaço equivale a histórico-social.  Mas o espaciotemporal também pode ser pensado como uma refração do histórico-social internalizado, como um tempo-espaço interior, psicológico.  Ou, dito em outros termos, como o ponto de partida de um mimena[14].
O cronotopo determina a unidade artística de uma obra literária no que ela diz respeito à realidade efetiva.  Por isso, numa obra, o cronotopo sempre contém um elemento valioso que só pode ser isolado do conjunto do cronotopo literário apenas numa análise abstrata.  Em arte e literatura, todas as definições espaço-temporais são inseparáveis umas das outras e são sempre tingidas de um matiz emocional.  É evidente que uma reflexão abstrata pode interpretar o tempo e o espaço separadamente e afastar-se do seu momento de valor emocional.  Mas a contemplação artística viva (ela é, naturalmente, também interpretada por completo, mas não abstrata) não divide nada e não se afasta de nada.  Ela abarca o cronotopo em toda a sua integridade e plenitude.  A arte e a literatura estão impregnados por valores cronotópicos de diversos graus e dimensões.  Cada momento, cada elemento destacado de uma obra de arte são estes valores. (BAKHTIN, 2002: 349)
As diferentes perspectivas axiológicas dos cronotopos explicam porque, por exemplo, colares que são objetos sagrados para os crentes das religiões afro-brasileiras, não sejam mais do que adornos sem significação especial para outros brasileiros.
O cronotopo é um ponto de observação único, irrepetível no tempo, a partir do qual o sujeito observa o seu objeto.  São duas as conseqüências do cronotopo.  A primeira é que o "horizonte próprio" do "eu cognoscente" varia no tempo, implicando um conhecimento inacabado, uma consciência que é sempre um vir-a-ser.  A outra é que os cronotopos de dois sujeitos que observem o mesmo objeto não são intercambiáveis: eles nunca partilharão o mesmo horizonte.
Extrapolando para os grandes grupos humanos que constituem as classes das formações sociais historicamente determinadas, teremos que os pontos de vista de classe estarão sempre se constituindo, serão apenas parcialmente superpostos e nunca coincidirão (já que divergentes em suas perpectivas axiológicas).
Se tomarmos o conceito de ideologia[15] como uma visão de mundo que justifica e reforça as relações sociais do modo de produção, teremos que admitir com Barthes que "a ideologia só pode ser dominante"[16], é sempre a ideologia da classe dominante em uma formação social historicamente determinada.  Mas a maneira específica como cada classe introjeta a ideologia está modelada pelo cronotopo.  Esse elemento diversificador da formação ideológica introduz a autonomia relativa entre o núcleo ideológico da classe dominante, mais homogêneo, e a periferia, marcadamente heterogênea, composta pelas variantes ideológicas das classes subalternas, abrindo uma brecha para a instauração da crise ideológica, do mesmo modo que a autonomia relativa das esferas da circulação em relação à esfera da produção de mercadorias fornece a ocasião para que a crise econômica se instale.
Essas considerações querem iluminar a leitura do cronotopo literário de Nelson.
Nelson Rodrigues (1912-1980) estréia, em teatro, em 1942, com a peça mulher sempecado.  Mas é com Vestido de noiva, de 1943, que ele inaugura o modernismo no teatro brasileiro.  Desde esse marco até 1978, com serpente, ele imprimirá uma nova cara ao nosso palco.  Anti-Nelson Rodrigues, de 1973, é uma de suas últimas peças.   Cumpre situar a sua trajetória no período.
De 1943 a 1965, o período mais produtivo do Nelson teatrólogo, o Brasil passou por grandes mudanças.  Transformou-se de um país agrário-exportador, com uma economia dependente em larga escala da monocultura do café, para um país urbano-industrial.  No plano político, saiu, em 1945, da ditadura do Estado Novo, viveu 19 anos de democracia liberal e, com o golpe militar de 1964, ingressou numa ditadura militar.  Em 1954, ocorre o suicídio de Vargas.  Em 1958, a Copa do Mundo é nossa.  Em 1960, Juscelino inaugura Brasília e o Rio de Janeiro perde a condição de capital federal.
No plano internacional, os Aliados saíram vitoriosos da Segunda Guerra Mundial, em seguida começou a Guerra Fria, e os Estados Unidos fracassam na Guerra da Coréia e depois na do Vietnã.  Na Americana Latina, há duas revoluções populares: uma, em 1952, na Bolívia, foi malsucedida; a outra, em 1959, em Cuba, saiu vitoriosa.
Nesse processo, a sociedade vai perdendo a ingenuidade.  E mais do que as referências, na verdade, perde a compostura.  Essa é a denúncia que a obra de Nelson Rodrigues faz de um tempo no qual o empenho individual por posse e ascensão social passa por cima de tudo o mais: o tabu da virgindade, a interdição do adultério, a amizade, a lealdade...  Incremento da população urbana, expansão midiática, deslocamento do eixo da influência européia para a estadunidense, o conjunto das alterações nas condições de existência cria novos hábitos que mudam os costumes, subvertem os valores, gera incertezas, provoca um estado geral de precariedade, instaura a insegurança pessoal.  Nesse quadro, afloram as fraquezas humanas, as canalhices mais sórdidas e os comportamentos venais.  Tudo tem seu preço nessa época de transição que troca o Deus do céu pelos deuses do mercado.
De Nelson Rodrigues, aqui nos importa principalmente o escritor (diferente do indivíduo privado), sua persona literária. Uma persona complexa, que, em sua obra teatral, transita da clave vanguardista de suas peças psicológicas ─ mulher sem pecado(1941), Vestido de noiva (1943), Valsa no 6 (1951), Viúvaporém honesta (1957), Anti-Nelson Rodrigues (1973) ─ e míticas ─ Álbum de família (1945), Anjo negro (1946),Dorotéia (1949), Senhora dos afogados (1947) ─ até o realismo de suas tragédias cariocas ─ A falecida (1953), Toda nudez será castigada (1956), Perdoa-me por metraíres (1957), Os sete gatinhos (1958), Boca de ouro (1959), beijo no asfalto (1961),Otto Lara Resende ou Bonitinha, mas ordinária (1962), serpente (1978) ─; vale dizer, uma persona literária com idas e vindas da estética da indeterminação espaciotemporal de Vestido de noiva ao feixe axiológico do subúrbio carioca de A falecida.
Esse grande escritor, a par de sua obra teatral, destacou-se como um dos maiores cronistas do jornalismo brasileiro.  Em suas crônicas Nelson criou tipos caricatos inesquecíveis, como o "Palhares, o canalha", a "grã-fina de narinas de defunto", a "estagiária de calcanhar sujo", a "freira de minissaia", o "padre de passeata" e outros tantos de inclinação nitidamente satírica.  Esse traço satírico da crônica de Nelson Rodrigues nos evoca considerações formais e ideológicas.
Do ponto de vista formal, a sátira rodriguesiana remete suas raízes ao "campo do sério-cômico" da Antiguidade Clássica.  Como diria Bakhtin, "o gênero sempre conserva os elementos imorredouros da archaica", ou seja, "é uma archaica com capacidade de renovar-se". (BAKHTIN, 2005: 106)  Ele esclarece que,
Neste [o campo do sério-cômico], os antigos incluíam os mimos de Sófron, o 'diálogo de Sócrates' (como gênero específico), a vasta literatura dos simpósios (também gênero específico), a primeira Memorialística (Íon de Quio, Crítias), os panfletos, toda a poesia bucólica, a 'sátira menipéia' (como gênero específico), e alguns outros gêneros.  Dificilmente poderiamos situar os limites precisos e estáveis desse campo do sério-cômico.  Mas os antigos percebiam nitidamente a originalidade essencial desse campo e o colocavam em oposição aos gêneros sérios como a epopéia, a tragédia, a história, a retórica clássica, etc. (BAKHTIN, 2005: 106-107)
Nelson Rodrigues compartilha essa archaica com Sergio Porto, o insuperável Stanislaw Ponte Preta.  Como é bem sabido, além do seu fabuloso escrete das "certinhas do Lalau" e do FEBEAPÁ, o engraçadíssimo festival de besteiras que assolou o país pós-64, Stanislaw lapidou, assim como Nelson Rodrigues, tipos inesquecíveis, como, por exemplo, a impossível Tia Zulmira, que testemunhou os grandes acontecimentos históricos do século XX e, quando esteve em Moscou, logo em seguida à vitória da revolução bolchevique, conheceu Trosky e Stalin, profetizando que ambos eram tão calhordas que acabariam brigando.
Do ponto de vista ideológico, como se pode aferir, Sergio Porto exerceu o espírito crítico em relação à esquerda sem contudo dar trégua à ditadura.  A atitude de Nelson é toda outra: a crônica de Nelson satiriza a esquerda e os liberais que se opõem à ditadura.  Isso nos obriga a situar a função da imprensa brasileira no golpe de 1964.  Não se pode ocultar que a grande imprensa brasileira teve um papel de destaque na criação do clima de histeria golpista, na preparação da opinião pública para a quebra da legalidade democrática. Não vou me estender em citações. Para ilustrar o que digo, basta reproduzir os editoriais do JB e de O Globo, repercutindo o golpe militar. No caso, os textos falam pelo contexto.
O editorial do JB, que rigorosamente não diz nada além de baboseiras, deixa tudo bem claro:
Desde ontem se instalou no País a verdadeira legalidade ... Legalidade que o caudilho não quis preservar, violando-a no que de mais fundamental ela tem. (...) A legalidade está conosco e não com o caudilho aliado dos comunistas.(...)"Golpe? ─ crime só punível pela deposição pura e simples do Presidente. Atentar contra a Federação é crime de lesa-pátria. Aqui acusamos o Sr. João Goulart de crime de lesa-pátria. Jogou-nos na luta fratricida, desordem social e corrupção generalizada. [JB, 01/04/1964] (FUNDAÇÃO, 2008)
O editorial de O Globo não fica para trás em seu empenho na derrocada da ordem democrática:
Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unir-se todos os patriotas (...) para salvar o que é essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas (...) o Brasil livrou-se do Governo irresponsável, que insistia em arrastá-lo para rumos contrários à sua vocação e tradições. (...) Poderemos, desde hoje, encarar o futuro confiantemente (...) Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros devem agradecer aos bravos militares, que os protegeram de seus inimigos. (...) Aliaram-se os mais ilustres líderes políticos, os mais respeitados Governadores, com o mesmo intuito redentor que animou as Forças Armadas. Era a sorte da democracia no Brasil que estava em jogo.(...) A esses líderes civis devemos, igualmente, externar a gratidão de nosso povo.(...) Se os banidos, para intrigarem os brasileiros com seus líderes e com os chefes militares, afirmarem o contrário, estarão mentindo, estarão, como sempre, procurando engodar as massas trabalhadoras, que não lhes devem dar ouvidos (...). [O Globo, 02/04/1964]  (FUNDAÇÃO, 2008)
Textos golpistas, que proclamam em alto e bom som o compromisso antidemocrática da grande imprensa brasileira.  Corroboram a coerência da grande imprensa no espírito do golpismo que sempre foi a seiva da qual se nutriu o jornalismo empresarial neste país. Fica, no entanto, uma perplexidade: mas, então, não havia censura à imprensa durante a ditadura militar? Quem responde é o jornalista Mino Carta: "Em cima da destruição da memória, alguns jornais inventam que sofreram censura. O Jornal do Brasil nunca foi censurado. A Folha de São Paulo nunca foi censurada". E Mino Carta diz mais:
A Folha de São Paulo não só nunca foi censurada, como emprestava a sua C-14 [carro tipo perua, usado para transportar o jornal] para recolher torturados ou pessoas que iriam ser torturadas na Oban [Operação Bandeirante]. Isso está mais do que provado. É uma das obras-primas da Folha, porque o senhor Caldeira [Carlos Caldeira Filho], que era sócio do senhor Frias [Octavio Frias de Oliveira], tinha relações muito íntimas com os militares. E hoje você vê esses anúncios da Folha - o jornal desse menino idiota chamado Otavinho [Otavio Frias Filho] - esses anúncios contam de um jeito que parece que a Folha, nos anos de chumbo, sofreu muito, mas não sofreu nada. Quando houve uma mínima pressão, o sr. Frias afastou o Cláudio Abramo da direção do jornal. Digo que foi a "mínima pressão" porque o sr. Frias estava envolvido na pior das candidaturas possíveis, na sucessão do general Geisel. A Folha estava envolvida com o pior, apoiava o Frota [general Sílvio Frota, ministro do Exército no governo Geisel]. O Claudio Abramo foi afastado por isso . O jornal O Globo também não foi censurado. Isso é uma piada. [Entrevista com Mino Carta. por Adriana Souza Silva, da Redação AOL, abril de 2004]  (FUNDAÇÃO, 2008)
Nelson Rodrigues, com o imenso prestígio literário que já granjeara como autor teatral, avulta entre os cronistas de combate dessa imprensa, como um panfletário cujo discurso ecoa com grande eficiência, que faz a cabeça de muita gente após a implantação da ditadura militar.  E, desse ponto de vista, talvez estejamos nos defrontando com dois cronotopos: o de suas crônicas e o do seu teatro.  Na crônica sobreleva o jornalista, no teatro o artista, embora Nelson seja um autor bifronte, no qual o jornalista está influenciado pelo artista e vice-versa.
A esse respeito vale considerar o que Walter Benjamin identifica como uma nova forma de comunicação:
(...) com a consolidação da burguesia ─ da qual a imprensa, no alto capitalismo, é um dos instrumentos mais importantes ─ destacou-se uma forma de comunicação que, por mais antigas que fossem suas origens, nunca havia influenciado decisivamente a forma épica.  Agora ele exerce essa influência.  Ela é tão estranha à narrativa como o romance, mas é mais ameaçadora e, de resto, provoca uma crise no próprio romance.  Essa nova forma de comunicação é a informação. (BENJAMIN, 1994: 202)
Benjamin ilustra com um exemplo:
Villemessant, o fundador do Figaro, caracterizou a essência da informação com uma fórmula famosa.  'Para meus leitores', costumava dizer, 'o incêndio num sótão do Qartier Latin é mais importante que uma revolução em Madri.'  Essa fórmula lapidar mostra claramente que o saber que vem de longe encontra hoje menos ouvintes que a informação sobre acontecimentos próximos. (BENJAMIN, 1994: 202)
Benjamin sublinha que "a informação aspira a uma verificação imediata." (BENJAMIN, 1994: 203) e que ela "só tem valor no momento em que é nova" (BENJAMIN, 1994: 204)
Isso me parece particularmente válido para o cronotopo das crônicas políticas de Nelson Rodrigues, indicando não só o caráter contingente delas enquanto acontecimento discursivo, mas também a pressuposição de um leitor hipotético a ser convencido com vistas à luta política que está em curso.  Quando escreve peças teatrais, Nelson talvez não mire na platéia de teatro habitual, mas no público culto, na crítica, a que é capaz de lhe conferir legitimidade na esfera da arte.  Nesse público, não é desprezível a influência do pensamento de esquerda.  Nelson, quando escreve, levaria esse dado em conta.  Já na crônica política, ele buscaria realizar o discurso eficaz junto a um público menos informado, mais preconceituoso, mais influenciado pela doxa, de mentalidade de classe média, em grande parte suburbano, que olha com espanto e ressentimento para a Zona Sul dos grã-finos.  Em cada caso, conscientemente ou não, ele adequaria seu discurso ao público correspondente.
Recorte

Falta explicar o recorte que balizou a nossa crítica das crônicas de Nelson Rodriguies.  Os tópicos abordados foram "a morte", "o negro", "a mulher", "o anticomunismo" e "a estética".  Fica então a questão: porque esses e não "Nelson e os heróis da pátria" ou "Nelson e o homem do povo"?  Está aí uma boa pergunta para a qual eu não teria uma resposta pronta.  Creio que essas escolhas são em grande parte aleatórias, fortuitas.
Justificando porque escolhera o sertão mineiro para ambientar suas histórias, Guimarães Rosa deitou uma explicação que corrobora o que escrevi acima.:
(...) eu tinha de escolher o terreno onde localizar as minhas histórias. Podia ser Barbacena, Belo Horizonte, o Rio, a China, o arquipélago de Neo-Baratária, o espaço astral, ou, mesmo, o pedaço de Minas Gerais que era mais meu. E foi o que preferi. Porque tinha muitas saudades de lá. (ROSA, s/d, 8)
Não deixa de ser curiosa essa explicação de Guimarães Rosa.  Manifesta-se aí uma atitude que sem dúvida revela afinidades com a do artista pós-moderno, para quem a obra de arte é fortuita, esvaziada das implicações da história e para as quais as marcações subjetivas não são muito pertinentes.  Ocorre, no entanto, que à sombra do fortuito talvez vicejem determinações disfarçadas sob um emaranhado de mediações difíceis de vislumbrar.
Escolhi tópicos que remetem a questões universais.  Talvez não tenha sido proposital, mas é um critério.  Em todo caso, são tópicos relevantes para a crítica da ideologia das crônicas de Nelson Rodrigues. São tópicos em torno dos quais desenvolveram-se lutas e discussões no processo de modernização da sociedade brasileira (questões raciais, de gênero e do modelo político a ser adotado para conduzir esse processo).  Daí serem também estratégicos nas crônicas de Nelson, que tinham a pretensão de formar opinião e defender posições em diferentes campos.  Portanto, é provável que não se trate de uma escolha tão desinteressada ou gratuita como possa parecer à primeira vista.  Talvez ela se encaixe numa perspectiva de análise (ou seja, num horizonte próprio) que tece a sua necessidade no interesse pelas relações entre a produção cultural e as vicissitudes históricas da formação social.
Antes de concluir, talvez valha a pena ainda uma palavra sobre a formação ideológica em que se situa a crônica de Nelson Rodrigues.
A formação social-brasileira teve sua gênese histórico-social no período das grandes navegações, época do predomínio do capital mercantil, de criação de um mercado mundial.  O modo de produção que aqui se estabeleceu se fundava no trabalho escravo de mão-de-obra deslocada da África.  Nesse modo de produção, a extração de sobre-trabalho se baseava na coação extra-econômica, a começar pelo seqüestro da mão-de-obra em terras africanas.  Tratava-se, portanto, de um modo de produção não-capitalista, mas subsumido à lógica do capitalismo europeu[17].  Podemos ir além e dizer que se tratava de um modo de produção pré-capitalista, periférico, fadado em sua evolução histórica a ser modificado por força da atração exercida pelo centro do sistema.
Essa tendência globalizante do sistema capitalista, que a tudo transforma, foi apontada por Marx e Engels no Manifesto Comunista:
Em lugar das antigas necessidades satisfeitas pelos produtos nacionais, nascem novas necessidades, que reclamam para sua satisfação produtos de regiões mais longínquas e dos climas mais diversos.  Em lugar do antigo isolamento das nações que se bastavam a si próprias, desenvolve-se um tráfico universal, uma interdependência das nações.  O mesmo acontece com a produção intelectual.  A produção intelectual de uma nação torna-se propriedade comum de todas.  A estreiteza e o exclusivismo nacionais tornam-se cada dia mais impossíveis, e das numerosas literaturas nacionais e locais forma-se uma literatura universal. (MARX, 2001: 55)
Desse modo, a subsunção formal (restrita à esfera da circulação) do modo de produção periférico ao sistema capitalista europeu, tende à subsunção real.  Nesse sentido, Lênin, referindo-se ao sul dos Estados Unidos, observou que "as sobrevivências econômicas do escravismo não se distinguem absolutamente em nada das do feudalismo"[18] e que encontra-se aí "a passagem da estrutura escravista ─ ou feudal, o que dá no mesmo ─ da agricultura para a estrutura mercantil e capitalista"[19]Cabe sublinhar que a indiferenciação apontada se limita à transição da subsunção formal à real, mas não equipara escravismo a feudalismo como poderia sugerir uma leitura apressada.  A esse respeito, Perry Anderson, entre outros, registra o estímulo ao aumento da produtividade no feudalismo, em contraste com o bloqueio tecnológico do escravismo. ( Apud COUTINHO, 1980: 66)  E Carlos Nelson  Coutinho, por sua vez,  vai insistir na "marca escravista sobre a estrutura de classes", dizendo que
a degradação do trabalho manual, que é muito mais intensa no escravismo que no feudalismo, opera no sentido de criar faixas 'médias' marginalizadas pelo sistema (tanto nas cidades como no campo), que só podem se reproduzir através do 'favor' dos poderosos" (COUTINHO, 1980: 67)
A abordagem do modo de produção nos remete a uma questão de escala.  Qual seria a escala apropriada à análise?  A Comuna de Paris poderia sugerir uma escala municipal.  O Manifesto Comunista poderia estar sugerindo uma escala internacional.  Ao falarmos de subsunção formal e real, escolhemos o reconhecimento do terreno nacional como decisivo.
É nesse reconhecimento da escala nacional que ganha relevância a questão das idéias fora de lugar ou da ideologia de segundo grau.  Como se sabe, Roberto Schwarz apontou "as idéias fora de lugar" como uma característica da formação ideológica em nosso país.  Mostrou como o nosso liberalismo era uma ideologia de segundo grau, retórica, enquanto o mecanismo do favor operava as relações entre a classe dominante e a classe média na zona de hegemonia da formação social brasileira, ao passo que a dominação com base no assujeitamento pela força, típico da escravidão, prescindia da mediação ideológica nas relações de produção.
Essa questão da ideologia de segundo grau demanda uma explicação.   Como observa Carlos Nelson Coutinho, no Brasil, mesmo na época da subordinação formal, (quando o modo de produção interno ainda não era capitalista), as classes dominantes de nossa formação social encontravam suas expressões ideológicas e culturais na Europa burguesa. (COUTINHO, 1980: 67)  É nesse sentido que se pode dizer que as idéias estavam fora de lugar e constituíam uma ideologia de segundo grau.  É porque não encontravam correspondência nas relações de produção escravistas então dominantes na formação social brasileira.  Adverte-se aí uma incongruência constitutiva da formação ideológica.  Essa incongruência entre a base material (escravista) e a superestrutura (liberal) deixa suas marcas na formação ideológica mesmo depois de efetuada a transição da subsunção formal para a subsunção real do modo de produção interno. Essa incongruência pode favorecer uma espécie de hipocrisia ou até mesmo de cinismo.  Talvez fosse essa a razão pela qual a opinião de que não havia nada mais parecido com um conservador do que um liberal no governo se tornara corrente na apreciação sobre os gabinetes do Império.
Carlos Nelson Coutinho esclarece que
Com o início da industrialização, ou, mais precisamente, com a transição do modo de produção interno à fase propriamente capitalista (o que já se verifica também em certos setores da agricultura na época da abolição da escravatura, ainda que isso se dê de modo "prussiano", ou seja, com a conservação de traços pré-capitalistas), as idéias importadas vão cada vez mais "entrando em seu lugar", tornando-se mais aderentes às realidades  e aos interesses de classe que tentam expressar.  E isso porque a estrutura de classes da sociedade brasileira vai se tornando essencialmente análoga à estrutura de classes da sociedade capitalista em geral.  Com isso, as contradições ideológicas que marcam a vida cultural brasileira do século XX aproximam-se cada vez mais ─ ainda que sem jamais se igualarem inteiramente ─ das contradições ideológicas próprias da cultura universal do período. (COUTINHO, 1980: )
Nelson Rodrigues não padece de nenhuma ambigüidade ideológica.  Ele não disfarça o seu conservadorismo sob uma fachada liberal; ao contrário, é um conservador assumido.  Nesse sentido, ele vive os seus valores com autenticidade.  E, em sua arte, critica a incongruência ideológica, a hipocrisia e o cinismo próprios da mentalidade de classe média entre nós.
Carlos Nelson Coutinho observa que, no século XIX, por um lado, "o liberalismo dá expressão a interesses efetivos das camadas dominantes".  Ele enumera entre esses interesses: "livre-cambismo no comércio internacional, cálculo racional na comercialização dos produtos de exportação, garantia da igualdade jurídico-formal entre os membros da oligarquia rural e comercial, etc".  (COUTINHO, 1980: 69)  A ideologia liberal convinha também à camada intermediária dos homens livres mas não proprietários, pois estes tinham no liberalismo a proclamação de "seus direitos formais à igualdade com os senhores e sua diferença em face dos escravos".  O desajuste se apresenta "diante do fenômeno da escravidão, da desigualdade estabelecida como fato natural, do trabalho fundado sobre a coação extra-econômica".  Esse desajuste contamina também a relação entre os grandes proprietários e os homens livres sem propriedade:  "O 'favor', que marca tal relacionamento, consagra vínculos de dependência pessoal, de tipo pré-capitalista; é, por conseguinte, um modo de relacionamento autoritário (mesmo quando paternalista) e antiliberal".  (COUTINHO, 1980: 70).   E "o favor" constitui uma marca específica da mentalidade de classe média na formação social brasileira.
A idéia de classe média, em qualquer formação social, implica uma conceituação topológica: toda classe média situa-se entre "os de cima" e "os de baixo".  Como se sabe, a noção de classe média (middle class) vem da literatura política inglesa para designar uma classe que, numa estrutura social hierarquizada, ocupa uma posição intermediária entre a classe alta (hight class) e a classe trabalhadora (working class); vale dizer: a burguesia ascendente, que se situaria hierarquicamente entre a aristocracia e o proletariado, nos primórdios da revolução industrial inglesa.  Essa origem deixou o seu rastro na Inglaterra contemporânea e é particularmente visível em instituições como a Câmara dos Lordes e a Coroa.
A classe média brasileira tem outra gênese histórica: seus fundamentos remontam ao nosso passado colonial-escravista.
Esquematizando, pode-se dizer que a colonização produziu, com base no monopólio da terra, três classes de população: o latifundiário, o escravo e o 'homem livre', na verdade dependente.  [...]  Nem proprietários nem proletários, seu acesso à vida social e a seus bens depende materialmente do favor, indireto ou direto, de um grande.  [...] O favor é, portanto, o mecanismo através do qual se reproduz uma das grandes classes da sociedade, envolvendo também outra, a dos que têm.  Note-se ainda que entre estas duas classes é que irá acontecer a vida ideológica, regida, em conseqüência, por este mesmo mecanismo.  Assim, com mil formas e nomes, o favor atravessou e afetou no conjunto a existência nacional, ressalvada sempre a relação produtiva de base, esta assegurada pela força.  [...] favor é a nossa mediação quase universal - e sendo mais simpático do que o nexo escravista, a outra relação que a colônia nos legara, é compreensível que os escritores tenham baseado nele a sua interpretação do Brasil, involuntariamente disfarçando a violência, que sempre reinou na esfera da produção. (SCHWARZ, 1977, p. 16)
Dá para perceber a abissal distância que medeia entre a nossa classe média e amiddle class dos ingleses.  Sobre essa questão, vale sublinhar que a nossa classe média constitui um entre-lugar que se cristaliza; ao passo que a middle class deles, ao se constituir como classe dominante, supera o seu.    Mas, o mais decisivo, é notar que a mentalidade de classe média, burocrática, tributária do favor dos poderosos e vocacionada para o emprego público, tão importante na formação ideológica brasileira, nem de longe se assemelha à mentalidade burguesa, vale dizer, empreendedora, capitalista, voltada para a organização dos fatores de produção, da middle classinglesa.
Talvez seja conveniente esclarecer alguns pontos de modo a dissipar possíveis mal-entendidos.  Quando nos referimos à constituição de uma mentalidade de classe média que cimenta camadas intermediárias cuja gênese histórico-social está enraizada no escravismo, não estamos apontando para a formação da burguesia brasileira ou de uma pequena burguesia assentada na pequena produção mercantil, nem mesmo para um tipo de classe fundamental de qualquer modo de produção.  A nossa mentalidade de classe média que viceja nas camadas intermediárias forjadas na esfera do favor, é típica de um setor social que se constitui de frente para o consumo e de costas para a produção de bens materiais.
Nelson Rodrigues, como boa parte da intelectualidade brasileira que não dispunha de fonte de renda própria, é caudatário dessa mentalidade de classe média forjada na esfera do favor.  Vale sublinhar a propósito que só com a Constituição de 1988 se passou a exigir concurso público para ingressar no serviço público, que era o meio de sobrevivência de muitos intelectuais (o próprio Nelson Rodrigues, não conseguindo um emprego público para si, reprovado no exame de saúde, conseguiu-o para a sua primeira mulher).  Talvez, por isso, embora fascinado pela competência do burguês exitoso, ele refugue a moral burguesa quando "a engrenagem do dinheiro e do interesse 'racional' faz o seu trabalho, anônimo e determinante, e imprime o selo contemporâneo".  Insuportável, para Nelson, "são as conseqüências, na perspectiva do individualismo burguês, da generalizada precedência do valor-de-troca sobre o valor-de-uso ─ também chamada alienação ─ a qual se transforma em pedra de toque para a interpretação dos tempos". (SCHWARZ, 1977, p. 41)
Conclusão
O fato de Nelson situar-se desde um ponto de vista moralista, reativo a qualquer mudança, não desqualifica a sua obra nem tira dela o caráter crítico.  Autores conservadores, como Balzac, produziram uma crítica consistente da sociedade burguesa de sua época.  Nelson realiza uma crítica demolidora da mentalidade de classe média, dos comportamentos hipócritas, da ostentação de aparências enganosas, do moralismo de fachada, que encobre a permissividade por baixo do pano, do descompromisso com valores estáveis e do arrivismo, numa época de transformações aceleradas.  Mas isso não desconstrói suas crônicas políticas como acontecimentos discursivos manipuladores da mentalidade conservadora da classe média, com o fito de justificar e reforçar os padrões ideológicos que dão apoio à práxis da ditadura militar.  Nesse sentido, a crônica política de Nelson Rodrigues é uma operação de guerra psicológica adversa com o objetivo de minar a resistência democrática. Ela, no entanto, finalmente descola do regime militar. Isso se dá quando ele abraça a campanha pela Anistia, na qual está pessoalmente interessado pelo destino do seu filho encarcerado.
Com isso não se quer dizer que a crônica reacionária de Nelson Rodrigues não coloque questões interessantes.  Entre essas questões, eu destacaria a sua crítica romântica da modernidade, que está implícita em sua abordagem passadista da morte, e a sua critica estética ao teatro do CPC da UNE (no período que antecede ao golpe militar), na qual ele adverte, com alguma razão, que a dimensão artística do teatro que se quer nacional-popular está ali amesquinhada pelo utilitarismo político, característico da obra panfletária.  Essa pecha não caberia ao teatro de Nelson Rodrigues, que, pelo menos no que diz respeito às suas tragédias cariocas, realiza com maestria, como já sinalizamos, o conceito do nacional-popular em literatura.  Ao que parece, ele soube distinguir (e separar) muito bem o momento da arte (no seu teatro, que, como observou Vianninha, não faz concessões à doxa) e o momento do combate político-ideológico (nas suas crônicas políticas, que explora habilmente os preconceitos dessa mesma doxa).  Mas se essa observação geral dá conta da tendência principal de sua crônica, é indiscutível que há nelas momentos em que Nelson supera o seu reacionarismo, afronta a opinião consensual e lança luz sobre zonas sombrias.  O ponto alto desses momentos situa-se na sua abordagem da questão racial, na qual ele desmascara a "democracia racial" brasileira como um racismo à brasileira, sublinhando a alienação do próprio negro.   Outro momento que merece destaque por ser extremamente significativo em sua crônica é quando ele expõe sentimentos inconfessáveis e incontroláveis como a inveja.  Nesse particular, vale destacar as crônicas nas quais, por ocasião da morte de Guimarães Rosa, ele envereda por um tom confessional para desvelar o sentimento de inferioridade que o confronto com o sucesso alheio muitas vezes não cessa de provocar em nosso íntimo.
Há, finalmente, um traço afetivo que não condiz com a carranca reacionária de Nelson Rodrigues: ele deu inúmeras mostras de solidariedade com o dissidente.  A prova disso é que cultivou a amizade de comunistas, esquerdistas e psicanalistas, mesmo durante os "anos de chumbo".   E isto a sua crônica registra.
Notas:
[1] Isso não é válido para as mercadorias da indústria cultural.  Essas são postas em circulação em um mercado administrado, através de técnicas de marketing, que engendram o consumo.: "O termo [indústria cultural] foi empregado pela primeira vez em 1947, quando da publicação da Dialética do Iluminismo, de Horkheimer e Adorno." (ARANTES, 2005: 7)
[2] Transgrediente é um "termo derivado do transgredior latino, que significa, entre ouras coisas, ir além, atravessar, exceder, ultrapassar, transgredir".   [BAKHTIN, 2003c: 7]
[3] Exotopia quer dizer "estar situado do lado de fora dos limites de". Ver nota 41 In (TEZZA, 2003: 294-295).
[4] Emprego o termo em seu duplo sentido de éthos e êthos: como conjunto dos costumes e hábitos fundamentais, no âmbito do comportamento (instituições, afazeres etc.) e da cultura (valores, idéias ou crenças), característicos de uma determinada coletividade, época ou região; mas também como padrão relativamente constante de disposições morais, afetivas, comportamentais e intelectivas de um indivíduo,.  Éthos: do grego éthos,ous  'hábito, costume'.  Êthos: do grego êthos,ous 'morada, covil habitual (falando-se de animais); maneira de ser habitualmente, caráter'.  Segundo Chantraine, desde o grego antigo, êthos não se confunde de modo algum com éthos. (HOUAISS)
[5] "Lembremos de passagem que o termo 'indecidível' vem de Kurt Gödel, um dos maiores matemáticos do século XX, que em 1931 enunciou seu famoso teorema, segundo o qual existem proposições aritméticas tais que nem elas nem sua negação são demonstráveis na aritmética adotada." (NASCIMENTO, 2004: 29)
[6] "A arte é social em nós, e, se o seu efeito se processa em um indivíduo isolado, isto não significa, de maneira nenhuma, que suas raízes e essência sejam individuais.  É muito ingênuo interpretar o social apenas como coletivo, como existência de uma multiplicidade de pessoas.  O social existe até onde há apenas um homem e as suas emoções pessoais.  Por isto, quando a arte realiza a catarse e arrasta para esse fogo purificador as comoções mais íntimas e mais vitalmente importantes de uma alma individual, o seu efeito é um efeito social.  A questão não se dá da maneira como representa a teoria do contágio, segundo a qual o sentimento que nasce em um indivíduo contagia a todos, torna-se social; ocorre exatamente o contrário.  A refundição das emoções fora de nós realiza-se por força de um sentimento social que foi objetivado, levado para fora de nós, materializado e fixado nos objetos externos da arte, que se tornaram instrumentos da sociedade.  A peculiaridade especialíssima do homem, diferentemente do animal, consiste em que ele introduz e separa do seu corpo tanto o dispositivo da técnica quanto o dispositivo do conhecimento científico, que se tornam instrumentos da sociedade.  De igual maneira, a arte é uma técnica social do sentimento, um instrumento da sociedade através do qual incorpora ao ciclo da vida social os aspectos mais íntimos e pessoais do nosso ser.  Seria mais correto dizer que o sentimento não se torna social mas, ao contrário, torna-se pessoal, quando cada um de nós vivencia uma obra de arte, converte-se em pessoal sem com isto deixar de continuar social." (VIGOTSK, 1999b: 315)
[7] "É evidente que as estruturas mentais não são o simples reflexo das estruturas sociais.  O habitus mantém com o campo uma relação de solicitação mútua, e a illusioé determinada do interior com base nas pulsões que impelem ao investimento no objeto, mas também do exterior, com base em um universo particular de objetos socialmente oferecidos ao investimento.  O espaço dos possíveis característicos de cada campo, religioso, político ou científico etc., funciona, em virtude do princípio de divisão (nomos) específico que o caracteriza, como um conjunto estruturado de licitações e de solicitações e também de interditos; ele atua como língua, como sistema de possibilidades e de impossibilidades de expressão que proíbe ou encoraja processos psíquicos diferentes entre si e inteiramente diferentes do mundo cotidiano; por meio do sistema de satisfações reguladas que ele propõe, impõe um regime particular ao desejo, convertido desse modo em illusio específica." (BOURDIEU, 1997: 15-16)
[8] A Primeira Revolução Industrial, como se sabe, foi o conjunto das transformações socioeconômicas iniciadas por volta de 1760, na Inglaterra (e mais tarde nos outros países), e caracterizadas especialmente pela substituição da mão-de-obra manual pela tecnologia (tear mecânico e máquina a vapor, a princípio), seguida da formação de grandes conglomerados industriais. A Segunda Revolução Industrial foi o conjunto das transformações socioeconômicas iniciadas por volta de 1870 com a industrialização de França, Alemanha, Itália, EUA e Japão, caracterizadas especialmente pelo desenvolvimento de novas fontes de energia (eletricidade e petróleo), pela substituição do ferro pelo aço e pelo surgimento de novas máquinas, ferramentas e produtos químicos (como o plástico). Entre 1909 ─ quando Henry Ford criou a linha de montagem e inaugurou a produção em série ─ e o final do século XX, quase todas as indústrias se mecanizaram e a automação se estendeu a todos os setores fabris.  A Terceira Revolução Industrial é o conjunto das transformações socioeconômicas desencadeadas a partir da segunda metade do século XX, com o surgimento de complexos industriais e empresas multinacionais, o desenvolvimento das indústrias química e eletrônica, os avanços da automação, da informática e da engenharia genética, e respectiva incorporação ao processo produtivo, que passou a depender cada vez mais de alta tecnologia e de mão-de-obra especializada.
[9] Num comentário de orelha de livro, Moacyr Scliar aponta "o curioso e desconcertante clima que se apossou do país, após a dupla queda, a do comunismo e a da ditadura militar". (BRAGA, 1996)
[10] O mesmo que pasticho: imitação servil de obra literária ou artística.  Do francês.pastiche (1719) 'reprodução de um quadro'; (1787) por extensão, 'obra em que o autor imita o estilo de outrem (na área literária)'; (1935) 'ópera em que o compositor reuniu trechos de música de diferentes obras, trabalhando-as e ajustando-as a um novo esquema'.  Empréstimo ao italiano pasticcio (séc. XVII) 'rascunho'; (1835) 'obra teatral ou peça instrumental escrita com a colaboração de diversos compositores'; e este do latim vulgar *pastícium. (HOUAISS)
[11] "A este sonhar-para-a-frente acrescente-se assim mais um sinal.  O presente livro não trata de outra coisa que não o esperar para além do dia que aí está.  O tema das cinco partes desta obra (escrita entre 1938 e 1947, revisada em 1953 e 1959) são os sonhos de uma vida melhor." (BLOCH, 2005, p. 21)
[12] Cronotopo é um termo formado pela justaposição do antepositivo crono- com o pospositivo -topocrono- vem do grego khrónos,ou 'tempo', ocorre em compostos da nomenclatura científica do século XIX em diante. -topo vem do grego tópos,ou 'lugar', em uns poucos vocábulos da terminologia científica do século XX. [Houaiss]
[13] Ver CLARK, 1998:  98, 125, 199, 297
[14] Para uma discussão sobre os conceitos de mimese e mimena, ver: LIMA, 2003 e 2000.
[15] O filósofo francês Destutt de Tracy (1754 - 1836) propôs o termo ideologia para designar a disciplina científica que, nos marcos do materialismo iluminista, investiga a origem das idéias humanas como percepções sensoriais do mundo externo. Nomarxismo, ideologia, em sentido restrito, é o conjunto de idéias presentes nos âmbitos téorico, cultural e institucional das sociedades que se caracteriza por ignorar a sua origem material nas necessidades e interesses inerentes às relações econômicas de produção, e, portanto, termina por beneficiar as classes sociais dominantes; em sentido amplo, é a totalidade das formas de consciência social, o que abrange o sistema de idéias que legitima o poder econômico da classe dominante (ideologia burguesa) e o conjunto de idéias que expressa os interesses revolucionários da classe dominada (ideologia proletária ou socialista). Ver CHAUÍ, 1983.  Ver também  MARX, 2005.  Para um discussão interessante sobre o conceito de ideologia, ver EAGLETON, 1997.
[16] "Diz-se correntemente: 'ideologia dominante'.  Essa expressão é incongruente.  Pois a ideologia é o quê?  É precisamente a idéia enquanto ela domina [...]."  (BARTHES, 2002: 41)  Ver também CHARAUDEAU, 2004: 267-269.
[17] "Um escravismo certamente peculiar, já que articulado no nível internacional com o capitalismo, com suas exigências mercantis e, portanto, capaz de 'importar' um certo tipo de cultura (e de instituições) próprias do capitalismo liberal (...)" (COUTINHO, 2005: 22)
[18] "(...) les survivances économiques de l'esclavagisme ne se distinguent absolument en rien de celles du féodalisme (...)" (LENIN, 1960: 21)
[19] "Nous y trouvons, d'une part, le passage de la structure esclavagiste ─ ou féodale, ce qui revient au même en l'occurrence ─ de l'agriculture à la structure marchande et capitaliste (...)" (LÊNIN, 1960:106)
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