sábado, 14 de setembro de 2013

O caso de Joaquim Barbosa




Derrotado, Barbosa poderá ficar só. A mídia costuma descartar os que não são mais úteis para os seus propósitos
Joaquim Barbosa jogou o jogo que a mídia julgou mais conveniente. Virou heroi.

Fotógrafos andavam em seu encalço, como o fazem com celeridades e subcelebridades. O homem ganhou visibilidade e, com ela, ganhou musculatura e, com ela, arreganhou os dentes.

Vociferou, esbravejou, fez caras e bocas e, inúmeras vezes, deixou-se fotografar de pé, imperial, diante de autoridades sentadas, olhando-o de baixo pra cima.

Foi um bom ator.

Os empresários da comunicação, os chamados barões da mídia, deram cada vez mais corda para o juiz implacável. Como fazem os traficantes para viciar jovens vulneráveis, a cada dia Barbosa ganhava um mimo de um articulista.

Até que foi brindado com uma capa da revista veja e com um título que o heroificava. O gesto grandiloquente buscava apoio da sociedade, adesão. Criaram uma peça de ficção e construíam para ela um enredo factível, criavam em torno dessa personagem uma realidade paralela.

Baudrillard chamava isso de simulacro.

Depois, testando hipóteses como diria Ali Kamel, alardearam que a máscara de Barbosa seria a mais vendida durante os festejos de carnaval. As máscaras encalharam. Deram com os burros n'água.

A mídia corporativa se especializou em promover "assassinatos de reputação", usando um termo feliz cunhado pelo jornalista Luiz Nassiff em sua análise sobre o anti jornalismo praticado pela revistaveja.

Mas nunca foi feliz em tentar forjar vestais. O caso Demóstenes Torres demonstra isso muito claramente. Com Barbosa não seria diferente.

Não foi sem entusiasmo que Barbosa entrou no jogo. O julgamento da AP 470 ganhou ares midiáticos. Com a orquestração de setores da mídia, tentaram contaminar os dois turnos das eleições municipais do ano passado.

Deram com os burros n'água.

Após as manifestações de junho, anunciaram, em mais um teste de hipóteses, que Barbosa seria um forte candidato a derrotar Dilma Rousseff.

Deram com os burros n'água. Não há uma única pesquisa eleitoral que seja animadora para o nosso neófito herói artificial.

Agora, no último 7 de setembro, a mídia convocou o povo às ruas e, na CBN, jornalistas apostaram garrafas de vinhos na certeza de que antes da Dilma subir no Rolls Royce para a parada militar as coisas sairiam como eles haviam planejado.

Deram com os burros n'água.

Se for confirmado, na semana que vem, o voto do decano Celso de Mello pela aceitação dos embargos infringentes, Barbosa e a mídia corporativa sofrerão mais uma derrota e o julgamento só será concluído no próximo ano. E aí a vaca poderá ir para o brejo.

Em 2014 teremos uma copa do mundo, com estádios testados e aprovados pelos torcedores, e o Brasil tem um ótimo time que poderá ser campeão.

Dilma continua subindo nas pesquisas e nesse ritmo, com um povo feliz com a taça na mão, emprego bombando, médicos mitigando o sofrimento dos miseráveis e inflação controlada, poderá vencer as eleições.

E os réus do PT poderão ter as penas reduzidas.

Se não renunciar à toga, como sugere um jornalista, é certo que Joaquim Barbosa perderá a relatoria da AP 470 e no final do próximo ano deixará a presidência do STF.

Ele já perdeu o respeito de seus pares, muitas foram as manifestações de repúdio ao seu comportamento oriundas de diversos setores da jurisprudência.

E Barbosa, derrotado, poderá ficar só. A mídia costuma descartar os que não são mais úteis para os seus propósitos.

Só restará a Barbosa refugiar-se em seu apartamento sem vista para o mar em Miami.

Com dores nas costas, ficará de pé em sua sala, olhando para o quadro na parede com a foto dele ainda menino, com aspecto sério e um pomposo título o encimando, em letras garrafais, O MENINO POBRE QUE MUDOU O BRASIL.


Coloca mais duas pedrinhas de gelo no copo com scotch e fica girando-as com o indicador. O telefone não toca.


ELÊ TELES

PAULO BERNARDO E O LOBBY DA TV A CABO

Por Mauro Santayana

(JB) - Não satisfeito em tolerar, placidamente, que o Brasil conviva com uma situação na qual os serviços de telecomunicações são campeões de reclamações e ostentem, ao mesmo tempo, as mais altas tarifas do mundo para países do porte do nosso, o governo federal, por meio do ministro Paulo Bernardo, prepara-se agora para tirar as castanhas do fogo para empresas estrangeiras também na televisão a cabo.

A pedido do setor, o governo pretende, em nome da “isonomia”, passar a taxar empresas que distribuem filmes pela internet (o que configura um tipo de serviço totalmente diferente), aumentando o preço para o consumidor, ou inviabilizando seu acesso a sites que lhe permitem pagar uma pequena taxa mensal e escolher quando e que filme, programa, ou documentário ver, em nosso idioma.

Quer dizer que — em uma espécie de censura econômica — o mesmo governo que não teve peito para investigar o esquartejamento da Telebrás e a desnacionalização das telecomunicações (que expôs o país à espionagem de empresas estrangeiras), responsável pela sangria de bilhões de reais, todos os anos, em remessa de lucros para o exterior, vira bicho na hora de defender os interesses de multinacionais em detrimento do cidadão brasileiro, apesar de já ter derramado, durante anos, bilhões de dólares em empréstimos a custo subsidiado do BNDES, e outros bilhões de dólares em isenção de impostos para multinacionais estrangeiras que operam nessa área no Brasil.

Ora, quem não tem competência não se estabelece. Qualquer uma das empresas que operam com TV a cabo no Brasil pode distribuir filmes e vídeos pela internet a qualquer momento, já que dispõe de tecnologia e capital para isso, operando de terceiros países, sem pagar, como fazem outras empresas, impostos no Brasil.  

O problema não é oferecer o mesmo serviço — mais barato e melhor estruturado — para o consumidor brasileiro mas, sim, manter a autêntica reserva de mercado em que se configurou o mercado nacional de TV a cabo, com a mesma programação e os mesmos repetitivos pacotes, oferecidos por todas as operadoras, a um preço muitíssimo superior ao que pagam usuários de outros países.


No lugar de estar preocupado com a situação das empresas de TV a cabo no Brasil, altamente lucrativas, o governo federal e o ministro Paulo Bernardo deveriam (o que inclui o governo Lula) estar trabalhando há anos para rever a criminosa Lei Geral de Telecomunicações (alguém sabia que hoje nem todo orelhão precisa completar ligações interurbanas, e que não existe prazo mínimo definido para o corte de serviço de internet em caso de atraso de pagamento da conta?); para exigir das empresas que cumpram seus compromissos quanto à qualidade e universalização; para verificar a situação dos Sistemas 3G e 4G no país, que estão uma vergonha, e quanto à TV a cabo, assegurar que o conteúdo “nacional” previsto seja mesmo nacional, do ponto de vista cultural, e não apenas uma mera reprodução, feita aqui dentro de programas e conceitos estabelecidos lá fora; incentivar a criação de novos canais brasileiros voltados para a valorização do país, como nas áreas de defesa, tecnologia e história, por exemplo; e monitorar o farto material que, sob o disfarce de documentários, tem sido exibido por canais norte-americanos, fazendo proselitismo e defesa da doutrina externa e de segurança dos EUA, principalmente quanto a temas como o 11 de Setembro, o "combate ao terrorismo” ou o envolvimento daquele país no Iraque e no Afeganistão, por exemplo. É preciso dar um tempo nessa desabalada defesa de interesses privados e multinacionais, e pensar um pouco em nosso próprio país e no consumidor brasileiro. 


Carta Maior: Joaquim Barbosa dá voz ao 12º ministro, a mídia





Charge de Vitor Teixeira, Pressão por carniça

de Carta Maior

Quando o 5º voto contra, declarado pelo ministro Marco Aurélio, empatou o jogo na apreciação dos embargos infringentes da AP 470, Joaquim Barbosa preferiu não arriscar.

Excepcionalmente frio e discreto, soprou o apito final da sessão e adiou o desfecho para a próxima semana, concedendo assim tempo e voz  ao 12º ministro para agir: a mídia conservadora.

Caberá a ela sacudir o cansaço da classe média com o assunto e mobilizar ’o clamor da sociedade’ para emparedar o decisivo voto de desempate, que coube ao ministro Celso de Mello.

Em tese, não seria preciso o ardil. O decano do STF  formou com Barbosa e Gilmar o trio de detratores da política em geral e do PT, em particular, nesse desfrutável processo através do qual o conservadorismo pretendeu realizar a sua capacitação ao poder, depois de seguidamente reprovado nas urnas.

Há um constrangimento, porém, que explica a cautela do presidente do STF e magnetiza as atenções de todo o mundo do Direito. Para  que jogue a pá de cal contra os réus, Celso terá que renegar  a própria biografia jurídica, pautada pelo reconhecimento da pertinência dos embargos.

Se o fizer, despindo-se da toga para subir ao palanque –do que tentará convence-lo a mídia isenta– consumará a natureza política de um julgamento polêmico, todo ele cercado de excepcionalidades.

Rasgará não apenas a sua reputação, mas a do próprio STF, abrindo uma trinca dificilmente cicatrizável no já fragilizado abrigo da  equidistância do Direito no país. A ver.

http://www.viomundo.com.br/politica/carta-maior-barbosa-da-voz-ao-12o-ministro-a-midia.html

Vagner Freitas: Gushiken enfrentou desonestidade do procurador-geral





O ex-procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, denunciou Gushiken ao STF no inquérito que deu origem à Ação Penal 470

Morreu Gushiken, um líder nacional

Como poucos, ele tinha a coragem de ser, de dizer e de fazer.

Ser militante sindical numa família japonesa não era fácil, Gushiken teve a coragem de ser.
Ser de esquerda na época da ditadura militar não era fácil, Gushiken teve a coragem de ser.
Enfrentar uma demissão no Banespa por causa da militância política.
Enfrentar um câncer que lhe atrapalharia a vida.

Liderar a maior greve dos bancários que o Brasil já teve e depois organizar o Partido dos Trabalhadores, ajudar na fundação da CUT, liderar o PT e ir para o governo do presidente Lula para ajudar a mudar o Brasil e ainda conseguir tempo para cuidar dos filhos, tudo isto Gushiken enfrentava e fazia ao mesmo tempo.

Dedicar a vida ao mandato parlamentar, combinar as campanhas para deputado com as campanhas para prefeitos, governadores e presidentes, principalmente ajudando Lula.

Já bem doente e com Lula presidente, Gushiken também teve que enfrentar a desonestidade do Procurador-Geral da República e a má-fé da imprensa no famigerado processo da Ação Penal 470, que a mídia apelidou de mensalão, quando todos sabiam que Gushiken era inocente, como foi comprovado pelo Supremo Tribunal Federal anos depois. Gushiken resistiu com dignidade.

Gushiken morre no dia 13. Data simbólica que lembra o partido que ele ajudou a criar e a tornar o maior partido de massa que o Brasil já teve.

Neste sábado, dia 14, os militantes e amigos de todo o Brasil e do mundo, estarão prestando suas homenagens a Gushiken.

O Partido dos Trabalhadores (PT), a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Confederação Nacional dos Bancários (Contrad-CUT), o Sindicato dos Bancários de São Paulo e todos os militantes sindicais e partidários estamos de luto.

Nossas condolências e solidariedade a toda Família de Gushiken. Sua esposa Bete, que também militou nos bancários, seus filhos que conviveram com o Sindicato e com tantas reuniões, e seus irmãos e demais familiares. Nós nos sentimos como parte desta enorme família.

Sabemos que todos têm orgulho do exemplo de vida que Gushiken representa. Tantos os familiares, a colônia japonesa, como os colegas do Banespa, os bancários de todo o Brasil, os militantes da CUT e do PT.
Somos todos Gushiken!

Vagner Freitas

Presidente Nacional da CUT 

http://www.viomundo.com.br/politica/vagner-freitas-gushiken-teve-que-enfrentar-a-desonestidade-do-procurador-geral-da-republica-e-a-ma-fe-da-imprensa.html

Depressão e dívidas


Réu em pelo menos sete processos, Champignon estava atolado em dívidas e abatido pelas críticas dos fãs que o acusavam de ser traidor por assumir o lugar de chorão na banda. Ele não aguentou tanta pressão e se matou

Natália Mestre
Champignon bateu um papo com a nossa reportagem em 2011. Relembre em vídeo os melhores momentos:
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Por volta das 14h do domingo 8, uma montagem exibida no Facebook fez chorar o baixista Luiz Carlos Leão Duarte Junior, o Champignon, ex-integrante das bandas Charlie Brown Jr., Nove Mil Anjos e A Banca – grupo com os integrantes remanescentes do Charlie Brown Jr., criado menos de um mês após a morte do vocalista Chorão. A foto trazia o nome Os Mercenários no lugar de A Banca e a frase “Eu sou Judas” sobre o peito de Champignon. “Assim que vi, entrei em contato com ele. Eu o conhecia muito bem, sabia que estaria abalado”, conta o cantor Perí Carpigiani, ex-companheiro dele na Nove Mil Anjos. Foi uma conversa rápida, mas Champignon mostrou-se abatido. “Ele me disse que as pessoas não faziam ideia da dor dele naquele momento”, conta Perí. À noite, o baixista foi jantar no restaurante japonês Sushi da Villa com a atual mulher, Cláudia Bossle Campos, grávida de cinco meses, e um casal de amigos. Champignon exagerava nas doses de saquê, o que motivou uma discussão com a esposa. Pouco depois da meia-noite chegaram em casa e entraram no elevador sem se falar. O baixista fez um gesto de degola em direção às câmeras de segurança. Ao entrarem no apartamento, Champignon se trancou no quarto onde guardava instrumentos, pegou a pistola 380 e deu dois tiros: o primeiro no chão, como um teste, e o segundo na cabeça. Morreu na hora, aos 35 anos.
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Foi um desfecho trágico de uma história de altos e baixos. Ele vinha tentando se reconstruir após a perda de dois grandes amigos e companheiros de banda: Chorão, do Charlie Brown Jr., que morreu de overdose em março, e Peu Sousa, da Nove Mil Anjos, que se enforcou em maio. “Meu irmão estava deprimido, triste. Ele se sentia só e sem amigos”, afirma a irmã Elaine Duarte. Champignon também estava atolado em dívidas. Nos últimos anos, chegou a fazer pelo menos duas declarações de pobreza à Justiça requisitando defensores públicos para representá-lo na Justiça – ele era réu em sete processos nas cidades de Santos, São Vicente e São Paulo. O Banco Matone cobrava a devolução de um imóvel em São Paulo onde moravam sua ex-mulher e sua filha Luiza, de 7 anos. Em 2001, o Banco Continental pediu a devolução de um veículo financiado e não quitado. Em 2009, a Justiça o condenou a pagar R$ 96 mil para a Engeterpa Construções e Participações. No ano passado, o músico deixou de pagar o IPVA de seu carro, um Gol 2007. Além disso, correm duas ações judiciais por não pagamento de pensão alimentícia.
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GRUPO
À dir., a banda Charlie Brown Jr.: Chorão (no centro) morreu de overdose
há seis meses e Champignon (segundo à esq.) se suicidou
 
Ainda assim, havia perspectiva de melhoras. Em dez dias, A Banca daria início à gravação do clipe da música “Novo Passo”, que fala justamente sobre a coragem de recomeçar. “Ele era o mais empolgado da turma, sempre cheio de ideias para o clipe”, disse o diretor Rodrigo Bernardo. O grupo também estava prestes a sair em turnê do novo disco, recém-lançado. “Nos vimos um dia antes de ele morrer. Ele estava muito animado com os próximos shows”, conta o baterista Bruno Graveto. Grávida de uma menina, a viúva deixou uma mensagem no Facebook na quarta-feira 11, agradecendo o apoio dos fãs e amigos. “Ainda não sei como vou suportar. Vivi o amor mais sublime e raro. Ele era a pessoa mais encantadora e maravilhosa do mundo!!! Sorte de quem pôde conhecê-lo.”
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DOR
A viúva, Cláudia Bossle Campos (no centro),
no enterro, com o chapéu de Champignon  

Filiações furadas


Por que Marina Silva não consegue transformar seus 20 milhões de votos em 500 mil assinaturas para fundar seu partido

Josie Jeronimo
Nos últimos sete meses, a ex-senadora Marina Silva e seus aliados não conseguiram transformar o capital eleitoral de 20 milhões de votos, obtidos nas eleições de 2010, em 500 mil assinaturas válidas para registrar seu partido, a Rede, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A imagem de política não tradicional que a ex-seringueira construiu perante o eleitorado até ajudou os chamados “mobilizadores” a convencer simpatizantes da Rede a assinar formulários em favor da criação da nova legenda. Feiras de produtos orgânicos e igrejas evangélicas, onde se encontra o público-alvo de Marina, foram os locais escolhidos para recolhimento de assinaturas. Mas o esforço não foi suficiente para que as adesões passassem no teste da burocracia. Na verdade, sobrou jeitinho e empenho, mas faltou formalidade. Segundo os cartórios responsáveis por analisar as fichas de filiação fornecidas pela Rede, foram apresentadas assinaturas suspeitas, signatários com ausência de dados eleitorais e até vistos de pessoas que não votam há anos e nem sequer possuem título de eleitor ou estão com o documento suspenso. No afã de alcançar as 500 mil assinaturas necessárias ao registro do partido, a Rede aceitou fichas até de quem preencheu apenas o nome da mãe e a data de nascimento. Assim, dos 640 mil formulários, 336 mil foram rejeitados pelo TSE. Para o partido ser oficialmente criado ainda faltam 100 mil assinaturas válidas. “A coleta foi feita nas ruas. Às vezes a pessoa assina mais para se livrar da gente”, reconheceu o deputado Domingos Dutra (MA), que trocou o PT pela Rede.
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Nos últimos dias, apoiadores de Marina desenvolveram um programa capaz de cruzar os nomes das pessoas favoráveis à criação do partido com o banco de dados eleitorais. Dessa forma, imaginavam completar as informações que faltavam em muitos dos formulários. Mas o acesso à íntegra das informações cadastrais dos 141 milhões de eleitores solicitado pela Rede foi negado. O partido de Marina não conseguiu contornar as dificuldades como fizeram recentemente outras agremiações, como o PSD, por exemplo. Em seu processo de criação, que não ultrapassou sete meses –, também enfrentou problemas para certificar as assinaturas, mas anteviu o impasse e coletou três vezes mais vistos do que o exigido pela lei. Do 1,2 milhão de assinaturas, os idealizadores do PSD validaram pouco mais de 500 mil exigidas pelo TSE. Já o Solidariedade, partido fundado pelo deputado Paulo Pereira da Silva (SP), egresso do PDT, contou com o poder de mobilização das entidades trabalhistas da Força Sindical. Em dez meses, não conseguiu um milhão de assinaturas, como o fundador do PSD, Gilberto Kassab, mas a maioria dos 600 mil formulários que enviou à Justiça Eleitoral foi preenchida com dados consistentes. Donos de uma estrutura bem menor e sem contar com puxadores de assinaturas de renome, o nanico PEN e o Partido Republicano da Ordem Social (PROS) estão prestes a serem formalizados. Demoraram, no entanto, quatro anos para recolher as assinaturas necessárias para dar entrada ao pedido de registro na Justiça Eleitoral.
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Segundo integrantes da Rede, a falta de um perfil definido que caracterize a nova legenda também tem dificultado na hora de colher as assinaturas de apoio à sua criação. “Por enquanto, o partido de Marina comporta muitos rótulos. Verde, evangélico, alternativo e conservador. Essa diversidade muitas vezes atrapalha”, afirmou um apoiador da ex-senadora. Uma saída foi recorrer a legendas consideradas aliadas em alguns Estados. No Acre, Marina pediu ajuda a diretórios municipais do PT para coletar vistos. Em Minas Gerais, foram os diretórios do PSDB no interior do Estado que fizeram as vezes de cabos eleitorais para Marina. No Maranhão, coube a setores do PDT a fornecer apoio. Porém, de acordo com pessoas envolvidas na coleta de assinaturas da Rede, como faltou uma padronização no trabalho, relatórios desconexos acabaram sendo produzidos. Para piorar, apoiadores da Rede ainda tiveram que amargar um prejuízo de R$ 800 mil para a montagem de um partido que nem sabem ainda ao certo se de fato irá sair do papel. Para amealhar o dinheiro, contaram com a ajuda de doadores, mas a futura legenda ainda não prestou contas aos seus futuros filiados.
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FORÇA REDOBRADA
Para conseguir fundar o Solidariedade, o deputado Paulinho
contou com o apoio dos sindicatos que controla
Feirão partidário – Perto do fim do prazo de filiação para quem pretende disputar a eleição de 2014, os partidos têm promovido um verdadeiro feirão com ofertas que vão da distribuição de poder dentro da futura sigla a liberações de recursos do Fundo Partidário para serem utilizados nos Estados. O Solidariedade, além de contar com a ajuda de sindicatos controlados por Paulinho da Força, para aumentar seus quadros oferece a presidência do partido no Estado ao filiado com mandato. Paulinho também se transformou num mercador do tempo de tevê. Na negociação, garante os cerca de dois minutos de propaganda que a nova legenda terá direito para os governadores que conseguirem filiar ao partido o maior número de deputados federais. Paulinho já fez esse acordo com os governadores Marconi Perillo (PSDB-GO), Beto Richa (PSDB-PR), André Puccinelli (PMDB-MS), Cid Gomes (PSB-CE) e Eduardo Campos (PSB-PE).
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COM QUE ROUPA EU VOU? 
Após desistir da filiação ao PP, o deputado Carlos Mannato (ES) assinou a
ficha do Solidariedade e correu para mudar as cores do comitê eleitoral 

A máquina de maracutaias do Sr. Vidal


Quem é, como operava e de onde vinha o apoio para Deivson Vidal, um jovem de 32 anos acusado de chefiar uma máfia que pode ter desviado mais de R$ 400 milhões de cinco ministérios

Izabelle Torres
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IMPÉRIO
Nos últimos seis anos, Deivson Vidal acumulou um patrimônio avaliado em 
R$ 20 milhões. Na operação Esopo, a PF apreendeu, em sua mansão localizada no 
condomínio mais valorizado da região metropolitana de Belo Horizonte, um helicóptero, 
grandes somas de dinheiro e carros de luxo
Deivson Oliveira Vidal é um jovem de 32 anos que se tornou uma força emergente da sociedade mineira acumulando, nos últimos seis anos, um império estimado em R$ 20 milhões. Sua ascensão, porém, foi tão meteórica quanto criminosa. A agilidade de Vidal nas relações interpessoais e sua disposição em fazer fortuna rapidamente o levaram a frequentar os círculos políticos de Minas Gerais e a transformar seu Instituto Mundial de Desenvolvimento e Cidadania (IMDC), uma organização da sociedade civil de interesse público (Oscip), numa fábrica de desvios de recursos e corrupção. À frente da instituição, ele fechou 17 convênios com cinco ministérios, sobretudo o do Trabalho, que somavam mais de R$ 640 milhões. Nesse mesmo período, esse prodígio do “desenvolvimento da cidadania” adquiriu helicóptero, carros de luxo, joias e uma mansão construída em dois terrenos no condomínio mais valorizado da região metropolitana de Belo Horizonte, onde dava festas badaladas com ostentações que incluíam até banhos de champanhe Laurent-Perrier nos convidados. A vida milionária que vinha desfrutando pode ter acabado na semana passada, quando Vidal foi preso pela Polícia Federal com outras 25 pessoas na operação Esopo. Ele foi acusado de chefiar uma máfia que pode ter desviado mais de R$ 400 milhões dos cofres públicos federais, estaduais e municipais de 11 Estados e do Distrito Federal, por meio de fraudes em obras, organizações de eventos, treinamento de jovens e contratos terceirizados. Sob ele pesam as acusações de peculato, corrupção ativa, falsidade ideológica, sonegação fiscal, lavagem ou ocultação de bens e formação de quadrilha.
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FIM DE FESTA 
Na última semana, Deivson Vidal foi preso, juntamente com 
outras 25 pessoas, na operação Esopo da Polícia Federal
 
 O poder e o prestígio desfrutados por Deivson Vidal chamaram a atenção da polícia durante as investigações. “A sensação de impunidade não dava limites aos desvios”, ressalta o delegado Marcelo Freitas. O mistério de como um jovem de classe média sem influência familiar conseguia circular com tamanha desenvoltura nos gabinetes dos ministérios e dos governos estaduais pode começar a ser esclarecido na próxima semana, quando terá início a segunda fase das investigações. Com base em depoimentos das testemunhas e dos presos durante a operação, a polícia vai apurar quem está por trás do jovem empresário. Já se sabe que pelo menos três deputados federais intermediaram os contratos do IMDC com seus Estados, quase tudo feito sem licitação. Os nomes dos parlamentares são citados em escutas telefônicas pelo próprio diretor do instituto. O que não se sabe ainda é até que ponto esses políticos se beneficiaram dos desvios capitaneados por Vidal.

A relação mais antiga do presidente do IMDC, segundo as investigações, é com o deputado federal Miguel Corrêa (PT-MG). O petista não tem atuação de destaque no Congresso, mas seu poder em Minas Gerais é considerável. Atual vice-presidente do PT estadual, Corrêa era, até a semana passada, considerado candidato eleito para o comando do diretório de Belo Horizonte. Essa influência de Miguel Corrêa abriu portas para contratos milionários – todos questionados por órgãos de controle – do IMDC. Em 2007, o deputado destinou R$ 300 mil de suas emendas para o projeto Pop Rock Brasil, organizado pelo instituto. No ano seguinte, foram outros R$ 400 mil para uma festa de axé. A relação entre os dois foi denunciada por ISTOÉ em 2009 e a Controladoria-Geral da União (CGU) apurou os convênios durante a auditoria de nove contratos entre o Ministério do Turismo e o instituto de Deivson. Os dois convênios que tinham Miguel Corrêa como intermediário apontaram irregularidades cometidas pelo próprio deputado. “A assinatura de cinco ajustes, todos decorrentes de emenda de um mesmo parlamentar e em período de uma semana para a execução de um mesmo evento, reflete intenção de descaracterizar a inobservância da lei”, diz o relatório.
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A QUEDA 
Escândalo das fraudes nos convênios derrubou o 
número 2 do Ministério do Trabalho, Paulo Pinto
Mesmo diante das conclusões da CGU, Miguel Corrêa afirma que não conhece Deivson e que financiou os eventos porque tinha relações com a Prefeitura e com a empresa DM Eventos, que era a responsável pela organização da festa. O problema do petista e o que o traz para o epicentro das investigações são documentos que constam no inquérito da Polícia Federal com informações sobre um assalto na sede do instituto em 2010. Na época, assaltantes levaram R$ 820 mil em espécie da sede do IMDC e dois funcionários ouvidos pela polícia afirmaram que o dinheiro iria para campanhas eleitorais daquele ano, especialmente de Miguel Corrêa, que concorria à Câmara dos Deputados. Segundo o Ministério Público, o dinheiro tinha origem não comprovada e poderia servir para abastecer o caixa-dois de campanhas eleitorais. 

O deputado Miguel Corrêa não é o único parlamentar que manteria estreita relação com Vidal. Na semana passada, prefeitos e ex-prefeitos que prestaram depoimentos sobre as irregularidades na execução do programa Projovem em seus municípios afirmaram que a indicação do IMDC foi feita pelo deputado federal Ademir Camilo (PSD-MG). Antes, o parlamentar era filiado ao PDT e tinha relação próxima com o ex-ministro do Trabalho Carlos Lupi. Camilo foi o responsável pela implantação do programa em diferentes cidades mineiras e, segundo apura a Polícia Federal, oferecia os convênios já direcionados para o instituto de Deivson. O parlamentar aparece em pelo menos três gravações da PF tratando sobre o Projovem com o presidente do instituto. “Devo ter ido com ele umas duas ou três vezes ao ministério. Mas não mantenho relações próximas”, diz Camilo.
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No Ceará, a atuação de Vidal é atribuí­da ao líder do PDT na Câmara, André Figueiredo. Ele teria sido o responsável pela escolha do IMDC para o convênio de R$ 7,6 milhões entre a secretaria do Trabalho do Ceará e o instituto. 

A desenvoltura com que Deivson transitou por anos nos ministérios é decorrente de uma séria de fatores que retratam bem as falhas na fiscalização do dinheiro público. Além da corrupção de funcionários – a operação Esopo derrubou Paulo Roberto Pinto, o número 2 do Ministério do Trabalho –, há uma sequência de omissões e descaso com os relatórios dos órgãos de fiscalização que identificam irregularidades nos convênios do instituto comandado por Vidal desde 2009. Um sinal de que a impunidade ou a demora em se fazer justiça está relacionada com os padrinhos que se conquista.  

De que lado ficará Celso de Mello?



Mais do que decidir uma tese sobre os embargos infringentes, o ministro tem a responsabilidade de dar um basta a uma divisão que pode se aprofundar no STF entre os que argumentam e os que esbravejam, com a jugular saltada; entre os que defendem ou rejeitam teses e os que atacam pessoas (inclusive seus próprios pares); entre os que julgam réus e os que castigam inimigos. Seu voto dirá se ele está entre aqueles preocupados com a correção dos julgamentos ou entre os que jogam “às favas todos os escrúpulos de consciência". Por Antonio Lassance

Na sessão sobre os embargos infringentes (12/9), o ministro Gilmar Mendes lembrou o caso Donadon. Fez muito bem. Poderia ter ido além e lembrado o embate travado entre probidade e segurança jurídica, em torno da discussão sobre a aplicação imediata ou não da Lei da Ficha Limpa em 2010. O contraste entre ambos os casos demonstra que probidade e segurança jurídica são dois fundamentos nem sempre tratados coerentemente no Supremo.

Em 2010, metade dos integrantes do STF defendeu o direito de os fichas sujas disputarem as eleições, de serem eleitos, de serem diplomados e de serem empossados. Tudo em nome da segurança jurídica e da sagrada lei segundo a qual não se pode mudar a regra com o jogo em andamento.

Gilmar Mendes foi não apenas um dos que perfilharam esse entendimento como foi, sem dúvida, o mais enfático. Acompanharam-no Marco Aurélio Mello, Celso de Mello, Cezar Peluso e Dias Toffoli. Em favor da aplicação imediata da Ficha Limpa estiveram Ricardo Lewandowski, Carmen Lúcia, Joaquim Barbosa, Ellen Gracie e Ayres Britto.

Só se pode entender o caso Donadon no contexto da derrota sofrida pela Lei da Ficha Limpa nas eleições de 2010. Não fosse a garantia dada pelo Supremo, Donadon não teria sido diplomado pelo TSE e nem empossado na Câmara dos Deputados.

Em 2010, a Lei da Ficha Limpa tinha acabado de sair do forno. Uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) firmava o entendimento de que, mesmo aprovada e sancionada naquele ano, ela deveria valer imediatamente. À época, o presidente do TSE era o ministro Ricardo Lewandowski. Atualmente acusado de tentar aliviar a situação de réus da AP 470, Lewandowski liderou o entendimento de que os critérios da nova lei deveriam ser instantaneamente aplicados ao registro de candidaturas. Esses critérios detalhavam o mandamento constitucional da probidade administrativa e da moralidade para o exercício de cargos públicos, que deveriam considerar a vida pregressa do candidato. Se considerava que a inelegibilidade não se baseva na ideia de culpa, mas de proteção.

Chancelado pela decisão do TSE, Lewandowski travou uma verdadeira cruzada para limpar as listas de candidatos daqueles que estivessem condenados por atos de corrupção, mesmo que ainda sem conclusão final (o chamado trânsito em julgado). O então presidente do TSE percorreu o país e orientou diretamente os tribunais regionais a negarem candidatura aos fichas sujas.

A reação à atuação de Lewandowski em favor da ficha limpa foi duríssima. Veio dos diretamente afetados pela nova regra, como Joaquim Roriz, Jader Barbalho e uma centena de outros candidatos já com alguma condenação em órgãos judiciários de segunda instância, como um tal Natan Donadon.

É importante cada cidadão relembrar como agiram os ministros do Supremo diante do julgamento que teve, como um de seus subprodutos, levar Donadon ao Congresso.

O argumento principal entre todos os que sepultaram a Ficha Limpa em 2010 era o da segurança jurídica. Não se pode mudar a regra do jogo no meio do jogo, certo? Depende. Do quê? Depende de a quem o resultado beneficia. Depende de quem são os acusados.

Façamos o exercício de relembrarmos algumas “teses” e frases lapidares . Imaginem se, ao invés de 2010, elas tivessem sido proferidas em 12 de setembro de 2013. Frases do tipo:

"Muitas vezes tem que se contrariar aquilo que a opinião pública entende como a salvação, muitas vezes para salvar a própria opinião pública".

Assim disse o ministro Gilmar Mendes em favor do Recurso Extraordinário de de Joaquim Roriz, RE 630147, de 23/9/2010, disponível para todos verem e ouvirem em http://goo.gl/8VqjAE (aos 3min e 55segundos).

O Mendes pré-mensalão dizia, na sequência, sobre mudar as regras do jogo com o jogo em andamento:

"Este tipo de violência muitas vezes começa com nosso próprio vizinho, e depois chega a nós". (No mesmo vídeo: http://goo.gl/8VqjAE aos 4 minutos e 6 segundos).

A pá de cal contra a aplicação imediata da Lei da Ficha Limpa foi dada em março de 2011 por outro paladino da condenação dos mensaleiros, o ministro Luiz Fux, à época, recém empossado. Seu voto sobre o tema desempatou a decisão do STF, enterrou o entendimento do TSE e impôs a maior de todas as derrotas sofridas pela Lei da Ficha Limpa. O resultado sacramentaria de vez a volta de políticos como Jader Barbalho e tantos outros que já tinham condenação em órgão judiciário de segunda instância, mas que mantiveram-se intactos em seus mandatos. Entre eles, mais uma vez, um tal Natan Donadon.

Em 2010, os processos dos crimes cometidos por Donadon já se arrastavam há mais de 15 anos. Onde estava a pressa? Sumiu. Ninguém sabe, ninguém viu. A parte do STF que reclama que o atual julgamento de embargos infringentes pode durar até seis meses ou mais demorou dois anos para julgar os embargos de Donadon e chegar à conclusão de que eles eram meramente protelatórios.

A depender do que dirá Celso de Mello sobre os embargos infringentes, seu voto de desempate pode esclarecer e iluminar o tema do equilíbrio a ser dado entre os princípios da probidade, de um lado, e o da segurança jurídica, de outro.

O ministro, que já deu sua opinião, de forma clara e cristalina sobre a admissão desse tipo de embargo (http://goo.gl/x635Hq), tem em suas mãos uma tarefa muito mais importante e duradoura do que uma decisão sobre a AP 470.

O ministro tem a responsabilidade de dar um basta a uma divisão que pode se aprofundar no STF entre os que argumentam serenamente e os que esbravejam, com a jugular saltada; entre os que defendem ou rejeitam teses e os que atacam pessoas (inclusive seus próprios pares); entre os que julgam réus e os que castigam inimigos. Seu voto dirá se ele está entre aqueles preocupados com a correção dos julgamentos ou entre os que jogam às favas, como diria Jarbas Passarinho, “todos os escrúpulos de consciência".

De que lado ficará Celso de Mello?


*Antonio Lassance é doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília. 

A disputa pelo voto de Celso de Mello




Em coletiva à imprensa, o ministro Celso de Mello indicou que aceitará os embargos infringentes, recurso que já defendia como direito inequívoco dos réus desde o primeiro dia do julgamento do mensalão. Só que da sessão de ontem até a apresentação do seu voto, na próxima quarta (18), muitas manchetes irão rolar. Sucumbirá ele à pressão? Confira com que argumentos cada lado disputa seu voto e quais os cenários possíveis após sua decisão. Por Najla Passos, de Brasília

Brasília - Só o tempo dirá se o ministro Celso de Mello sucumbirá à intensa pressão midiática que recai sobre ele desde o final da sessão desta quinta (12), quando a votação pela admissibilidade ou não dos embargos infringentes na ação penal 470 fechou o placar em 5X5 e o presidente da corte, Joaquim Barbosa, encerrou a sessão. Em coletiva à imprensa, indicou que irá manter a posição expressa no primeiro dia de julgamento, pela validade do recurso. Será?

Normalmente discreto, Celso de Mello fez questão de conceder coletiva à imprensa. Difícil saber se foi uma fala espontânea ou um recado às redações do país. Mas o fato é que ele deixou claro que não se curvará às pressões da mídia, muitas vezes travestidas de sentimento geral da população. “É preciso decidir, e é preciso decidir com independência do que pensa a opinião pública”, disparou. O ministro não adiantou o teor do voto que, segundo ele, já está pronto. Mas falou em coerência e lembrou aos jornalistas que já se manifestou duas vezes sobre os embargos infringentes, uma delas na própria ação penal do mensalão. 

Foi no dia 2 de agosto de 2012, no primeiro dia do julgamento (ver vídeo), quando rebateu o argumento dos advogados de que os réus sem direito a foro privilegiado deveriam ser julgados nas instâncias inferiores para terem direito ao duplo grau de jurisdição, como prevê o Pacto de São José da Costa Rica, convenção internacional ratificada pelo Brasil. 

“O Supremo Tribunal Federal, em normas que não foram revogadas e ainda vigem, reconhece a impugnação de decisões emanadas do plenário desta corte em sede penal, não apenas em embargos de declaração como aqui se falou, mas também em embargos infringentes do julgado, que se qualificam como um recurso ordinário dentro do STF, na medida em que permitem a rediscussão de matéria de fato e a reavaliação da própria prova penal”, afirmou na ocasião.

Na ocasião, nenhum dos ministros, nem mesmo o relator da ação, Joaquim Barbosa, contestou a posição de Mello sobre a pertinência dos infringentes. Os advogados dos réus deixaram o tribunal convictos de que teriam, pelo menos, direito de recorrer à própria corte das decisões mais polêmicas, que obtivessem pelo menos quatro votos contrários, como prevê o artigo 333 do Regimento da Corte. Para os advogados, tudo indicava que a regra fora acertada no início do jogo. E combinado não sai caro.

As ‘deslealdades’ do processo
Foi também nesta mesma sessão que Barbosa e o ministro revisor, Ricardo Lewandowski, protagonizaram sua primeira discussão acalorado. Ao votar favorável ao desmembramento do processo, o revisor foi acusado pelo relator de “deslealdade” por não ter apresentado sua posição anteriormente. “Dialogamos nesses últimos 2,5 anos em que Vossa Excelência é revisor. Me causa espécie que vossa excelência não tenha se manifestado sobre isso há 6, 8 meses, antes que preparássemos toda essa... É deslealdade, ora”. 

Lewandowski reivindicou seu direito à posicionamento contrário. “Eu, como revisor, ao longo deste julgamento, farei valer o meu direito de manifestar-me sempre que entender que isso seja necessário. Eu acho que é um termo muito forte o que Vossa Excelência está usando, e que já está prenunciando que este julgamento será muito tumultuado”, profetizou.

Só em maio deste ano, já como presidente da corte, Barbosa revelou sua inenção de suprimir a possibilidade do recurso, ao negar, em decisão individual, os embargos infringentes requeridos precipitadamente pela defesa do ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares. Teria cometido a sua “deslealdade”, já que jamais falara antecipadamente sobre o assunto?

Para o criminalista Marcelo Leonardo, que representa o publicitário Marcos Valério, se a defesa de Delúbio não tivesse violado o devido processo legal e entrado prematuramente com os infringentes, essa discussão sequer ocorreria. “Antes de maio, nenhum dos advogados seria capaz de supor essa polêmica”, afirmou. Alçado ao posto de vilão da advocacia, o advogado que represente Delubio, Antônio Malheiros, tem se mantido longe do plenário do STF.

O segundo precedente de Mello
Na coletiva de ontem, Celso de Mello disse que a segunda vez que se manifestou sobre os infringentes foi em dezembro do ano passado, quando foi designado relator de embargos de declaração da ação penal 409, como já havia lembrado Lewandowski em seu voto. Mello não acolheu o recurso, mas porque os votos divergentes não somavam o mínimo de quatro, e não porque o considerasse inadmissível. Ele não aventou a hipótese dos infringentes terem sido revogados pela Lei 8038/90, como agora alegam os contrários ao recurso.

Na coletiva, Celso de Mello não comentou as possíveis pressões que estaria sofrendo em função da responsabilidade de dar o voto de minerva. “Essa responsabilidade é inerente ao desempenho no caso e à função”, se limitou a dizer, acrescentando que empates acontecem muitas vezes, independentemente da natureza da matéria. “As decisões que emanam do Supremo não são individuais, mas revertidas de coletividade”, acrescentou.

O decano, entretanto, será submetido a uma semana de manchetes incisivas sobre seu papel neste imbróglio. E sua história, inclusive no curso da própria ação penal do mensalão, demonstra que ele não é dos mais afeitos a desagradar às forças conservadoras. No curso do julgamento do mensalão foi um dos que condenaram com mãos mais pesadas, como fez questão de recordar o ministro Gilmar Mendes, também durante o seu voto.

O juiz que largou o apito
Se o julgamento do mensalão fosse um jogo de futebol, seria impossível não observar que o ministro Gilmar Mendes abandou de vez o apito e decidiu cavar o gol junto ao time que ele representa. Deixou de ser ministro para se travestir de Ministério Público. Atacou os réus com fúria descomunal. Alterou a voz, fez discurso político. Tal como Barbosa, começou criticando a duração do julgamento, que já consumiu mais de 50ª sessões e, de tão longo, assistiu à aposentadoria de dois ministros. “Talvez não estejamos mais aqui quando os embargos vierem a ser julgados”, apelou.

Mendes fez questão de recordar o que Celso de Mello falou no seu voto sobre o crime de quadrilha, que ajudou a dar maioria para a decisão mais polêmica do caso e, por isso, a mais suscetível aos embargos infringentes. “Este processo revela um dos episódios mais vergonhosos da história política de nosso país, pois os elementos probatórios que foram produzidos pelo Ministério Público expõem aos olhos de uma nação estarrecida, perplexa e envergonhada, um grupo de delinquentes que degradou a atividade política, transformando-a em plataforma de ação criminosa”, afirmou, citando as palavras do ministro que, estrategicamente, será o responsável pelo desempate. 

Fez jus à fama de “o mais aliado com a direita dentre os 11 homens da corte”, ao dar voz ao fantasma do medo do comunismo e atacar ferozmente o que definiu como “o pensamento de que o partido é o Estado”. Ele lembrou que o mensalão, pelo que se apurou até o momento, desviou R$ 170 milhões dos cofres públicos. “Perto disso, o crime de Donadon, que envolve fraude de R$ 8 milhões, deveria ser tratado em juizado de pequenas causas”, atacou. 

O ministro discordou do argumento apresentado pelos favoráveis aos infringentes de que a Lei 8038 não revogou o revogou o Regimento Interno do STF, que prevê o recurso. Citou artigo da ex-ministra Ellen Gracie, em que ela afirma o contrário. Jogou por terra seus pareceres anteriores que destacavam que a legislação internacional se sobrepor a nacional, ao desconsiderar o direito ao duplo grau de jurisdição previsto no Pacto de São José da Costa rica, convenção da qual o Brasil é signatário.

Ao final do voto, jornalistas que assistiam à sessão na sala contígua ao plenário aplaudiram e deram vivas. Estava garantida sua prevalência no noticiário de ontem, de hoje e dos próximos dias.

Com direito a puxão de orelha
Sem ter preparado um voto por escrito, o ministro Marco Aurélio, que empatou o placar em 5X5 fechando a sessão, também insistiu na tecla da celeridade, lembrando que mais de 400 ações penais aguardam julgamento na corte. “Eu mesmo tenho processo – e isso é uma frustração para o julgador – que liberei há 10 anos para julgamento”, argumentou. Não respondeu à provocação de Lewandowski, que sugeriu o aumento do número das sessões. 

Ele também lembrou que “a sociedade pede o fim do processo do mensalão”. Acabou interrompido pelo ministro Luiz Roberto Barroso: “Eu sou um juiz constitucional. Não estou pleiteando ser manchete favorável no dia seguinte”. Barroso também recordou que o papel do juiz é servir à Constituição. "A opinião pública é muito importante em uma democracia e fico muito feliz quando coincide com a decisão do tribunal constitucional. Agora, se o que considero certo não bate com a opinião pública, eu cumpro meu papel. A multidão quer o fim desse julgamento, e eu também. Mas nós não julgamos para a multidão, nós julgamos pessoas”.

O ministro acrescentou que uma pessoa que tivesse um pai, filho ou irmão na reta final de um julgamento em que as regras fossem mudadas no último minuto, jamais concordaria com isso. “Não estou aqui subordinado à multidão. Não tenho o monopólio da certeza, mas tenho o monopólio íntimo de fazer o que acho certo. O que sair no jornal do dia seguinte não faz diferença pra mim se não for o certo", disse Barroso. 

Irritado, Marco Aurélio insistiu que dá, sim, importância ao noticiário, “porque é servidor público e, por isso, deve prestar contas à sociedade”. E desqualificou o colega que,desde que entrou no julgamento, no último mês, vem desabonando as decisões tomadas pela maioria do STF: “Vejam que o ‘novato’ parte para a critica ao próprio colegiado, como partiu em votos anteriores. No que chegou a apontar que não decidiria da forma na qual nós decidimos. Não respondi à critica, não foi uma crítica velada, foi uma crítica direta, porque não achei que era bom para o tribunal a autofagia". 

Carmem Lúcia na defensiva
Primeira a votar na sessão desta quinta, quando o placar ainda estava em 4X2 em favor dos réus, Carmem Lúcia decepcionou pelos argumentos tacanhos. Já começou na defensiva, esclarecendo que, nas oportunidades anteriores em que se pronunciou sobre embargos infringentes, foi para dizer que eles não eram cabíveis em habeas corpos e, portanto, não fizera análise da sua admissibilidade. “Digo isso para não ficar a impressão de que houve mudança de tendência ou um comportamento inovador”, justificou. 

Segundo a ministra, cabe ao Congresso legislar sobre as leis nacionais, como é o caso da legislação penal - e não há lei de autoria do Congresso que preveja os embargos. Ela desconsiderou que, por decisão do próprio poder constituinte, o Regimento Interno do STF foi acolhido com força de lei pela Constituição de 1988. E revelou que decidiu pela inadmissibilidade dos infringentes ao observar que esses recursos não são cabíveis no Superior Tribunal de Justiça (STJ). 

Para ela, dois réus hipoteticamente acusados pelo mesmo crime que, por questões de prerrogativas de foro, fossem ser julgados no STF e STJ, teriam tratamento diferenciado, o que fere o princípio da isonomia. “Não posso tratar desigualmente os desiguais neste caso, porque aqui são iguais”, observou. A ministra também não considerou que o réu condenado originariamente pelo STJ, colegiado de 2ª instância, tem como recorrer ao STF, enquanto o condenado pelo STF, não. 

Além disso, preferiu esquecer que, na própria ação do mensalão, esse princípio já foi ferido, tendo em vista que réus sem direito a foro privilegiado foram condenados no STF, enquanto outros ainda estão sendo julgados nas instâncias inferiores. Caso, por exemplo, de quatro executivos do Banco do Brasil que, junto com Henrique Pizzolatto, assinaram a autorização de repasse dos recursos do Visanet para a agência de publicidade de Marcos Valério. Apenas Pizzolatto foi julgado – e condenado - pela corte máxima.

Ele respondeu ao questionamento de que os embargos infringentes seriam uma forma de garantir o duplo grau de jurisdição, alegando que este direito tem seus limites dentro do sistema jurídico brasileiro. Arrepio geral na ala do plenário destinada ao assento dos advogados. 

Princípio da vedação do retrocesso
O ministro Ricardo Lewandowsk, como esperado, votou a favor dos infringentes. Para ele, a aceitação do recurso “permite a derradeira oportunidade de corrigir erros de fato e de direito, sobretudo porque encontra-se em jogo o bem mais precioso da pessoa depois da vida, que é seu status libertatis”. Ao fazer um histórico sobre a legislação que rege a corte, ele disse que todos os regimentos anteriores da casa previam alguma forma de embargabilidade das decisões, sobretudo se em única instância. “Portanto, essa possibilidade de embargar decisões não unânimes é da história do STF”, defendeu. 

Em resposta ao argumento central da ministra Carmem Lúcia, Lewandowski lembrou que o Superior Tribunal de Justiça foi criado pós Constituição de 1988. Portanto, não tinha norma anterior recepcionada como lei, como é o caso do STF, prevendo embargos infringentes. E criticou a postura dos colegas que rejeitam o recurso, para ele, de forma casuística. “Embora a Lei 8038 tenha criado os embargos de divergência, o recurso em habeas corpus e o recurso em mandato de segurança apenas no âmbito do STJ, nunca se cogitou a não interposição desses recursos no âmbito dessa corte. Igualmente, a intervenção federal (...) só foi prevista na lei em relação ao STJ. Não obstante, ninguém jamais competência do STF para decretá-la”. 

O ministro também ressaltou que, nas inúmeras vezes que o STF os embargos infringentes, nunca observou que estivessem revogados. E defendeu o princípio jurídico da vedação do retrocesso, segundo qual nem o administrador, nem o legislador e nem o julgador podem atuar para restringir os direitos que a constituição assegura. “Não se pode retirar casuisticamente nesse julgamento um recurso com o qual os réus contavam e com relação ao qual não havia qualquer contestação nesta Corte".

Cenários possíveis
Com os votos na mesa, a corte ficou dividida do seguinte modo: Barbosa, Luiz Fux, Carmem Lúcia, Gilmar Mendes e Marco Aurélio contra o recurso, e Barroso, Teori Zavascki, Rosa Weber, Dias Toffoli e Lewandowski a favor. A sessão será retomada na próxima quarta (18), quando Celso de Mello proferirá o seu. 

Se os embargos infringentes forem acolhidos, após a publicação do acórdão final, as defesas dos réus terá prazo de 10 dias para apresentar recursos. Um único e novo relator será designado para o caso. “Para a defesa, isso é positivo porque significa que não será mais o Joaquim Barbosa, que já deixou suas posições muito claras no processo, e que são amplamente desfavoráveis aos réus”, explica Marcelo Leonardo.

Não haverá um novo e longo julgamento, como vem sendo repetido como mantra pela imprensa. O próprio ministro Marco Aurélio, desfavorável aos infringentes, disse que serão julgadas apenas questões muito específicas de réus específicos: os oito condenados por formação de quadrilha, outros três por lavagem de dinheiro e um por evasão de divisas. Ele também rebateu a “ameaça” de Gilmar Mendes de que o julgamento se perca indefinidamente em uma sucessão de recursos. “Isso não é possível. O processo é dinâmico, não pode retornar”, retrucou. 

O ministro garantiu aos jornalistas - ávidos pela informação - que não haverá prescrição de penas. “Com os embargos infringentes, suspende-se a contagem. Não há este perigo”, rebateu. Marco Aurélio lembrou ainda que, mesmo com o recurso, o resultado final pode nem sofrer alterações. Uma possibilidade concreta seria Celso de Mello votar pelo recurso, para manter sua coerência, e depois voltar a pesar a mão na reavaliação. Se os dois novos ministros seguirem a tendência mais favorável aos réus, o fiel da balança deverá ser o ministro Marco Aurélio, que ora acompanha um grupo e ora outro. 

Caso os infringentes sejam indeferidos, a procuradora-geral da República em exercício, Helenita Acioli, já pedirá, na mesma sessão, a prisão dos condenados. E o presidente da corte, Joaquim Barbosa, decidirá se elas serão feitas imediatamente ou só após a publicação dos embargos. A mídia, de qualquer forma, estará mais perto de obter as tão esperadas imagens com que tentará pautar as eleições de 2014: as das prisões dos “mensaleiros”, especialmente do ex-ministro José Dirceu e do deputado José Genoino (PT-SP).