sábado, 16 de novembro de 2013

A tragédia do menino de Ribeirão


Assassinato de garoto de 3 anos, encontrado em um rio no interior de São Paulo, descortina a história conturbada de sua mãe, uma psicóloga, e de seu padrasto, que é viciado em drogas

Camila Brandalise, de Ribeirão Preto
 

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“Dona Augusta?” “Me desculpe, mas não posso falar com ninguém”, responde, retraída, a senhora escondida atrás do muro da casa de classe média, na cidade de Ribeirão Preto, interior de São Paulo. Até pouco tempo atrás, Augusta Aparecida Raymo Longo, mãe de Guilherme Raymo Longo, 28 anos, padrasto e principal suspeito da morte do menino Joaquim Ponte Marques, 3 anos, desaparecido na terça-feira 5 e encontrado morto no rio Pardo, no domingo 10, era facilmente encontrada conversando com algum conhecido da vizinhança no portão de sua residência. Agora, é mais cautelosa e não responde tão rapidamente quando ouve o seu nome ser chamado. Só fala depois de muita insistência e para defender o filho, em prisão temporária desde o domingo 10. Além de ter de lidar com a perda de Joaquim, que diz ter sempre tratado como um neto, precisa suportar o envolvimento do nome da família em um dos casos de maior comoção nacional dos últimos tempos. A morte da criança, uma tragédia por si só, causou também o desmoronamento não só de uma, mas de várias famílias: a de Guilherme Longo e Natália Mingoni Ponte, 28 anos, mãe da vítima e mulher dele, e a dos parentes dos dois lados. O casal está preso temporariamente e o sigilo telefônico de ambos e de parentes foi quebrado para obter informações que podem ajudar nas investigações, que começaram colocando o padrasto como possível responsável pela morte. A polícia acredita que Joaquim teria sido jogado no córrego Tanquinho, próximo à casa em que vivia com a mãe e o padrasto. Já se sabe que não houve afogamento e, portanto, o garoto morreu antes – seu corpo foi encontrado na região de Barretos, a 130 quilômetros de Ribeirão Preto.

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COMOÇÃO
A casa de Guilherme Longo (acima) e Natália Ponte, padrasto e mãe de Joaquim (abaixo),
está inundada de cartazes acusatórios contra o casal e de mensagens
para a criança de 3 anos assassinada

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Longo foi ouvido pela polícia na quarta-feira 13. Ele afirma ser inocente e não saber o que aconteceu com o enteado. Também disse ter autoinjetado 30 doses de insulina – antes, havia falado em duas doses. Há suspeitas de que a criança, diabética, tenha morrido com uma superdosagem do medicamento. De acordo com o delegado responsável pelo caso, Paulo Henrique Martins de Castro, serão ouvidos familiares e testemunhas, mas a maior expectativa é pelo resultado do laudo que apontará se há alguma substância no corpo do menino (apesar de especialistas dizerem ser muito difícil encontrar insulina a essa altura, pois o organismo a metaboliza rápido). O documento está previsto para sair em 20 dias. “Precisamos saber o que motivou a morte e qual é o envolvimento exato da mãe e do padrasto em tudo isso”, diz Castro. Chama a atenção na investigação, segundo o delegado, a mudança de postura de Natália do primeiro para o segundo depoimento. “Antes, ela não falava sobre problemas na relação. Depois, admitiu que o companheiro era agressivo e lhe fazia ameaças.” A mãe de Longo, que é filho adotivo, rebate as acusações, apesar de o próprio ter reconhecido, durante testemunho na delegacia, ter sido agressivo com a esposa em algumas ocasiões. “Guilherme era muito amoroso com o enteado e com a mulher”, afirma Augusta. “Ele não seria capaz de fazer mal a ela nem ao menino, pois o tratava como um filho”, diz ela, que tem outros dois filhos adotivos. O pai, Dimas Raymo Longo, está ainda mais recluso do que a mulher. Câmeras flagraram o momento que ele saiu, na madrugada da terça-feira 5, durante quatro minutos de sua residência. Ele mesmo reconheceu que foi até a casa do filho, que mora distante uma quadra, de onde havia saído às 22h, pois estava preocupado. No domingo 3, Guilherme teria tentado se matar ao tomar uma dose muito alta de medicamentos, se internado e saído do hospital na segunda-feira 4. Seu pai estaria por perto para acompanhar a recuperação – várias pessoas ouvidas por ISTOÉ confirmaram que o casal Longo é superprotetor.
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O pai de Natália, Vicente Ponte, morador e dono de uma autoelétrica em São Joaquim da Barra, cidade distante 75 quilômetros de Ribeirão Preto, afirma nunca ter notado problemas na relação do casal. Ponte fica com os olhos marejados e engole seco ao falar sobre o assunto. “Estamos tentando seguir em frente, mas é tudo muito difícil”, diz. Sua esposa, Maria Cristina Mingoni Ponte, está à base de calmantes. “É um momento de desespero”, afirma o irmão de Natália, o arquiteto  Alessandro Mingoni Ponte. “Além da tristeza de perder o Joaquim, não conseguimos nos desligar pensando nela presa. Acreditamos cegamente que ela não tem envolvimento com a morte dele.”
 Natália conheceu Longo na comunidade terapêutica Santa Rita de Cássia 2, em Ipuã, a cerca de 105 quilômetros de Ribeirão Preto. Ela era psicóloga e ele fazia tratamento para se livrar do vício em drogas. “Natália trabalhava na autoelétrica de manhã com o pai e, à tarde, ia para a clínica, diz Carla Lopes, amiga da família. Pedro Souza, um dos atuais coordenadores da Santa Rita, que também fez tratamento na comunidade, diz ter entrado lá na mesma época em que o padrasto de Joaquim: novembro de 2011. “Conversávamos muito e ficamos amigos”, afirma. “Ele nunca causou nenhum problema.” Segundo Souza, foi em meados de 2012, já ao final do tratamento de Longo, que o rapaz e Natália começaram a se envolver. “Os dois foram fazer um curso de cinco dias em outra cidade. Ele ia ser monitor da clínica. Depois da capacitação, entraria em fase de estágio. Foi nessa viagem que eles se aproximaram.” O ex-interno ficou mais três meses como estagiário e decidiu sair para procurar um emprego na área de informática. Já Natália saiu de lá entre abril e maio deste ano, de acordo com o coordenador. “Ela estava grávida e ele a convidou para morarem juntos em Ribeirão Preto. Ela aceitou.” O filho do casal, Victor Hugo, tem hoje quatro meses e está com os avós maternos. Na mudança, Natália levou para viver na mesma casa com Guilherme o filho Joaquim, de outra união. Segundo o delegado que cuida do caso, a psicóloga ainda estava com o pai do menino, Artur Paes, quando se envolveu com Longo. Devastado com a perda trágica do filho, Paes, que acompanhou as buscas e foi ao enterro, está em sua casa, em São Paulo, à base de medicamentos.

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LUTO
Na escola Lacordaire, que Joaquim frequentava, a diretora Christinne
Magalhães (acima) pediu ajuda de psicólogos para trabalhar a morte
do menino. Abaixo, a avó materna Maria Cristina: desespero no velório

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A psicóloga e Longo começaram a morar juntos há cerca de seis meses. Mas, após a união, Natália decidiu ficar um tempo longe do companheiro e passou alguns dias na casa dos pais, em São Joaquim da Barra. “Ela não comentou com ninguém o que estava acontecendo, mas notamos que havia algum  problema”, diz o irmão dela, Alessandro. O delegado Castro confirma. “Natália pensou em se separar porque soube que ele estava usando drogas novamente. Por pressão da família, e de Longo, acabou voltando para Ribeirão com ele.” A relação não parecia ser tranquila, diz o delegado. No segundo depoimento da psicóloga, ela disse que ele a ameaçava constantemente e que tinha ciúme de Joaquim, por ser filho de outro homem. Teria agredido a companheira grávida e dito que iria atrás dela “até no inferno”, caso o deixasse. Chegou a ser agressivo mesmo durante a gravidez. O advogado de Longo, Antônio Carlos Oliveira, nega as acusações. “Ele não tinha ciúme de Artur. Somente uma vez, em que achou que o ex tratava Natália de maneira desrespeitosa, eles sentaram para conversar e resolveram a situação”, diz Oliveira, sem dar maiores detalhes.

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DOR
Natália se envolveu com Guilherme quando ainda era casada com Artur Paes (acima),
o pai de Joaquim, que saiu da capital paulista, onde mora, para acompanhar
as buscas do filho e agora vive à base de calmantes

No dia do desaparecimento de Joaquim, Natália disse à polícia que dormiu durante toda a noite e só se deu conta de que o filho havia sumido às 7h da terça-feira 5, quando foi aplicar insulina no garoto. O mesmo disse o padrasto, que naquela madrugada admitiu ter saído à procura de cocaína, mas voltou para casa após não encontrar a droga para comprar. Na escola Lacordaire, em que o menino estudava, os alunos começaram a fazer várias perguntas aos professores para tentar entender o que havia acontecido com o amigo. “Com auxílio de dois psicólogos, elaboramos algumas orientações e as enviamos aos pais para que eles também soubessem responder às perguntas sem assustar os filhos”, diz a diretora-geral, Christinne Magalhães. Um dos pontos do comunicado diz o seguinte: “Precisamos minimizar o impacto dessa tragédia em cada lar, não aumentando e remexendo a história.” No lar já devastado onde vivia Joaquim, não será possível seguir essa orientação.

Fotos: Kelsen Fernandes/Ag. Istoé; Sérgio Masson/Estadão Conteúdo; Firmino Luciano Piton; Piton/Futura Press; Weber Sian/A Cidade

http://www.istoe.com.br/reportagens/334871_A+TRAGEDIA+DO+MENINO+DE+RIBEIRAO

É pior do que parece


Infraestrutura sucateada das escolas brasileiras compromete mais a qualidade do ensino do que indicava o censo oficial

Fabíola Perez


No último mês, o estudante Kaíque Vargas Brito, 10 anos, não conseguiu assistir às aulas regularmente nem jogar futebol nas quadras de sua escola. Ele faz parte de um grupo de 600 alunos que teve de ser transferido para o Centro Educacional Unificado no bairro de Perus, em São Paulo, enquanto a Escola Municipal de Ensino Fundamental Badra passa por uma reforma. Em outubro, a instituição foi interditada após denúncias de que o prédio oferecia riscos à integridade das crianças. Funcionários e familiares contam que a construção foi erguida sobre um aterro sanitário e as obras do Rodoanel Mário Covas ao redor do terreno teriam aumentado a fragilidade do edifício. Inaugurado há apenas quatro anos, o prédio possui paredes com infiltrações e ambientes em mau estado de conservação.

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SEM MANUTENÇÃO
Escola Badra, na periferia de São Paulo, foi interditada e 600 alunos
tiveram de ser transferidos para outro estabelecimento

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Os problemas que atingem o colégio de Perus são os mesmos enfrentados pela ampla maioria dos estudantes de todo o País. Um estudo realizado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e pela Universidade de Brasília (UnB) criou uma escala para medir a qualidade da infraestrutura nas escolas públicas e privadas brasileiras. O levantamento dimensionou o estado crítico da maioria dos estabelecimentos de ensino. Quase metade das instituições tem apenas o mínimo para estar em operação – água, banheiro, energia, esgoto, cozinha. Na outra ponta, somente 0,6% delas dispõe de infraestrutura considerada avançada, com salas de professores, laboratórios de ciência e informática, parques infantis e acessibilidade. “A escala ajuda a quantificar quanto deverá ser investido em políticas públicas educacionais daqui para a frente”, afirma Joaquim José Soares Neto, professor da UnB e um dos coordenadores da pesquisa. A situação é mais grave nos estabelecimentos municipais e isso prejudica a qualidade do ensino. “O professor que deseja trabalhar algumas habilidades específicas não consegue por causa de limitações de infraestrutura”, diz ele. Segundo Neto, em países avançados, o espaço físico é mais padronizado. No Brasil, a escala reproduz as diferenças sociais geográficas dentro do ambiente escolar.

Os pais dos alunos da escola Badra não estão satisfeitos com a improvisação adotada em Perus. “Eles não estão tendo aula, são apenas atividades de lazer”, conta Joana Vargas Brito, mãe de Kaíque. Hoje, o colégio passa por duas reformas e a expectativa da prefeitura é de que as aulas voltem ao normal ainda este mês. O mau estado de conservação dos prédios é de fato perigoso para a comunidade escolar. Em 23 de outubro, a luminária e parte do forro da sala de aula da Escola Municipal Lavínia Figueiredo Arnoni, em Ribeirão Pires (SP), caíram, ferindo seis crianças. A defesa civil interditou o prédio e os 360 alunos estão assistindo às aulas em uma escola estadual no centro da cidade.

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EXCEÇÃO
A escola municipal Rogê Ferreira tem infraestrutura avançada

O Censo Escolar do Ministério da Educação, realizado com a colaboração das administrações estaduais e municipais, é a principal ferramenta para obter um panorama nacional da educação e para a formulação de políticas públicas, mas ele não capta a falta de equipamentos e o péssimo estado dos edifícios. Segundo o levantamento de 2012, 40% das escolas públicas de ensino fundamental possuem biblioteca e 42%, laboratórios de informática. A socióloga e diretora da ONG Aprendiz, Helena Singer, afirma, porém, que o cenário é bem diferente. “Os dados não registram que, muitas vezes, apenas a secretaria da escola tem computadores”, alerta. “Existe uma diferença brutal entre as informações do censo e a realidade.” Outro entrave à qualidade do ensino relacionado à infraestrutura é a rotatividade de profissionais. “Escolas municipais com estruturas precárias não conseguem manter o quadro de funcionários e, com isso, não desenvolvem um projeto nem uma identidade”, ressalta Helena.

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Mas há exceções. Desde 2006, o prédio da Escola Municipal Deputado Rogê Ferreira está inserido no Parque Pinheirinho D’Água, em São Paulo. “Passamos por uma reforma em 2011 para qualificar o espaço”, explica Fernando José Mendonça de Araújo, diretor da instituição. A medida trouxe bons resultados para o ensino. “Graças ao ambiente bem conservado, os professores não têm vontade de sair”, diz ele. “As escolas que quiserem seguir o mesmo caminho precisam investir em infraestrutura e promover encontros entre o conselho diretor, pais, alunos e a comunidade.”

http://www.istoe.com.br/reportagens/334851_E+PIOR+DO+QUE+PARECE

Roupa à prova de bala


Empresários e executivos aderem a jaquetas, ternos e casacos que resistem a tiros de pistolas. Calças e capacetes blindados em breve chegarão ao mercado

Michel Alecrim


Em várias partes do mundo, empresários e executivos já andam com roupas à prova de balas, sem que ninguém perceba. Podem ser ternos alinhados, jaquetas esportivas e coloridas, casacos, tudo com idêntica proteção balística de um colete blindado, desses usados por policiais. O ator Steven Seagal usa, o presidente americano, Barack Obama, também, e pessoas comuns, inclusive no Brasil, vêm aderindo à moda. Uma das peças mais comuns é a jaqueta que impede a perfuração de pistolas de 9 milímetros ou de calibre 40, que, no Brasil, são fabricadas pela Tamtex, em Mauá, na Grande São Paulo. O gerente de marketing Felipe Silvério conta que o aumento de procura, especialmente por motociclistas, levou a empresa a desenvolver blindagem também para calças e capacetes, ainda não comercializados. Por fora, a roupa é feita de couro ou tecido sintético, como cordura, em cores variadas. Os preços variam entre R$ 1.820 e R$ 2.425.

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PROTEÇÃO
O empresário Luís Fernando Oliveira de Moura comprou a jaqueta blindada:
"Já fui assaltado duas vezes e fiquei traumatizado", diz ele

Em países vizinhos, vestir um terno à prova de balas do estilista colombiano Miguel Caballero não é raridade. O presidente Obama teria usado um paletó feito por ele no dia da posse do primeiro mandato, em 2009, informação nunca confirmada ou desmentida pela Casa Branca. Também a alfaiataria Garrison Bespoke, de Toronto, no Canadá, oferece ternos resistentes à bala para executivos. Embora a roupa seja discreta, aumenta em dois quilos o peso. Importante: é preciso licença da Polícia Civil, intransferível, para ter essas roupas. O diretor da Associação Brasileira dos Profissionais de Segurança, Vinícius Cavalcante, aconselha, também, que os interessados façam um curso de defesa pessoal antes, e alerta para o fato de as vestimentas não protegerem contra tiro de fuzil – como já acontece com coletes à prova de balas usados por quem não é policial.

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“O mais importante é a pessoa aprimorar sua percepção, saber dos riscos ao seu redor e como se portar”, aconselha o especialista. O empresário paulista Luís Fernando Oliveira de Moura, 37 anos, foi um dos que adquiriram a jaqueta. “Tenho que me deslocar por longas distâncias para trabalhar. Já fui assaltado duas vezes e fiquei meio traumatizado. Tenho um filho de 14 anos e preciso me proteger até por ele”, explica o empresário. Nesta sociedade violenta, blindar-se virou tendência.

http://www.istoe.com.br/reportagens/334849_ROUPA+A+PROVA+DE+BALA

Octógono é lugar para crianças?


De olho no mercado milionário do MMA, americanos colocam filhos para participar de competições nos EUA. Especialistas alertam para os prejuízos físicos e emocionais da luta

Wilson Aquino


Confira cenas de meninos de 7 anos lutando como adultos:

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A partir dos cinco anos, crianças americanas têm sido levadas por seus pais para participar de torneios infantis de MMA – ou melhor, Pankration, técnica grega semelhante, mas na qual são proibidas joelhadas e cotoveladas. Estima-se que cerca de três milhões de meninos e meninas pratiquem o esporte nos Estados Unidos. No Brasil, começam a despontar academias de artes marciais mistas (ou MMA) para os pequenos, porém sem combates oficiais. Mas, com a popularização dos marmanjos fortões do Ultimate Fighting Championship (UFC), que enriquecem em shows de brutalidades, não será surpresa o surgimento de torneios infantis aqui, até porque não há legislação que proíba. Nos EUA, os eventos para crianças não envolvem dinheiro, mas os minúsculos gladiadores são condecorados com medalhas e troféus, além do aplauso dos pais, que sonham com os bilhões de dólares que a indústria pode oferecer aos pimpolhos no futuro. Entretanto, apesar de serem fortes e disputarem ferozmente com os adversários no octógono, eles não deixam de ser crianças e, não raro, saem de cena chorando. Alguns fazem pirraça e se negam a cumprimentar o rival, como é obrigatório.

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MINIGLADIADORES
Torneio infantil nos EUA: os campeões têm apelidos como "A Besta"

A questão chamou a atenção recentemente, depois que o fotógrafo peruano radicado em Nova York Sebastian Montalvo, 24 anos, viajou por vários Estados americanos registrando as lutas entre crianças. O conjunto das fotos é um impressionante documento sobre roubo de infância até para feras do octógono, como o ex-lutador de MMA Royler Gracie, 48 anos, que mora e tem academia nos Estados Unidos desde 2008. “Sou totalmente contra esse tipo de competições para crianças porque elas não têm maturidade para isso”, afirma. Montalvo resume o que viu: “Como é um dos esportes que mais crescem no mundo, uma nova geração tem feito de tudo para participar dos eventos da Liga Americana de Luta.”

Um dos campeões de MMA infantil tem 7 anos, nasceu no Arizona, e atende pelo apelido de “The Arm Collector” (O colecionador de braços), por causa de sua habilidade de vencer pela imobilização dos membros superiores dos adversários. Outro, da Califórnia, da mesma idade, é conhecido como “The Beast” (A Besta). Como será o crescimento de uma criança que se acostumou a ser chamada por esses apelidos e elogiada pela brutalidade? “Quem passa a infância e a adolescência batendo nos coleguinhas vai se transformar em um adulto que não consegue negociar, não tem empatia nem pena do outro”, alerta a psicanalista Ana Maria Iencarelli, que há 40 anos trabalha com crianças e adolescentes. “Qual é a filosofia desse esporte?”, pergunta ela, para responder em seguida: “Acabar com o outro.” Ou seja, o ensinamento básico não pode proporcionar um crescimento saudável.

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CONTROLE
Academia em Brasília: crianças aprendem técnicas de MMA, mas só lutam jiu-jítsu

“É um esporte muito contundente. Uma criança não está preparada em nenhum aspecto para suportar esse tipo de competição”, adverte o professor paulista Danilo Dourado, que treinou campeões do UFC, como Maurício Milani Rua, o Maurício Shogun, e ensina MMA para crianças, mas não admite luta entre elas. É seguido, no raciocínio, pelo diretor e médico da Confederação Atlética Brasileira de MMA, Márcio Tannure: “Sou a favor de a criança treinar MMA porque, além de ser saudável para o corpo, a filosofia milenar das artes marciais educa a mente. Mas sou contra colocar para lutar.” Ortopedistas alertam para os riscos de lesões que podem ocorrer na placa de crescimento (leia quadro).

O ex-lutador Pedro Galiza, que ensina o esporte para crianças, em Brasília, não incentiva a competição e opta pelo treino de jiu-jítsu, que é arte marcial e prioriza a imobilização. “Chute e soco somente na manopla (almofada)”, explica. Uma de suas alunas, Isadora, 9 anos, pediu aos pais para trocar o balé pelas aulas de MMA. O pai, o advogado brasiliense Mário Thiago Padilha, 31 anos, praticante de muay thai (boxe tailandês), diz que é uma atividade física saudável. “Disciplina e prega o respeito aos colegas. Em ambiente controlado de academia, com professor observando, os riscos de lesão são praticamente nulos”, defende.

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Fotos: Sebastian Montalvo/Polaris; Adriano Machado 

http://www.istoe.com.br/reportagens/334825_OCTOGONO+E+LUGAR+PARA+CRIANCAS+

Os filhos cangurus


Nos últimos dez anos, a média de idade para os filhos saírem da casa dos pais subiu de 25 para 35 anos. O que leva esses adultos a adiarem cada vez mais essa despedida?

Natália Mestre


No orçamento da corretora de imóveis Luciana Esnarriaga, 36 anos, não estão previstos gastos com a casa, como contas de luz e água, compra de supermercado ou tevê a cabo. Tudo que ela ganha é gasto com suas despesas pessoais, como celular e carro, além da diversão, que inclui as baladas nos fins de semana e as viagens, sua grande paixão. O sustento da moradia é bancado pelos pais, que proporcionam à moça, além do aconchego familiar, comida e roupa lavada. “Moro com os meus pais porque a gente se dá muito bem, é muito tranquilo e gostoso estar com eles”, diz Luciana. “Tenho a minha liberdade para trazer quem eu quiser em casa, como amigos e namorado. Não vejo sentido em morar sozinha no momento.” A corretora de imóveis que se formou em direito, mas resolveu trabalhar na imobiliária da família com a mãe, Angelita Esnarriaga, 64 anos, está longe de ser uma exceção entre a turma de mais de 30 que ainda não deixou o ninho. Pelo contrário, esse grupo, chamado pelos estudiosos do tema de “geração canguru”, só vem aumentando. Nos últimos dez anos, o número de adultos entre 25 e 30 anos morando com os pais cresceu mais de 40%, enquanto a idade média de os filhos saírem de casa passou dos 25 para os 35 anos.

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ECONOMIA
O corretor de imóveis Adriano Beccari, 36 anos, só estudou nos
EUA porque conseguiu juntar uma boa quantia vivendo com os pais

A constatação faz parte do trabalho de pesquisa da psicóloga Mariana Figueiredo, que deu origem ao livro “Geração Canguru Ninho Cheio – Filhos Adultos Morando na Casa dos Pais” (editora Versos, 192 págs.). Assim como a corretora Luciana, um time cada vez maior de trintões, até quarentões, já formados e inseridos no mercado de trabalho, prefere continuar sob a asa paterna a sair de casa e começar uma vida do zero, com muitos desafios e sem privilégios. “É um reflexo do novo modelo de sociedade, em que homens e mulheres passaram a priorizar as suas profissões, fazendo com que o casamento e a formação de família sejam cada vez mais tardios, somado a um contexto de grande liberdade sexual”, afirma Mariana, baseada em sua vasta experiência como terapeuta familiar no consultório, onde entrevistou dezenas de “famílias cangurus”, junto com anos de pesquisas sobre o tema na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Um dos pontos positivos dessa história é observar como as relações ganharam em qualidade nos últimos anos, passando a ser mais igualitárias. “Os pais estão dando maior liberdade aos filhos e isso permite estender suas estadias por mais tempo.”

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DO MEU JEITO
Daniel Dezontini, 37: ele arriscou abrir um negócio
próprio porque tinha respaldo financeiro dos pais

A construção de carreiras de sucesso é um outro aspecto positivo desses adultos que adiam a saída de casa. A segurança proporcionada pelos pais permite um investimento maior na carreira. É possível garantir um bom curso de línguas, uma pós-graduação ou MBA e cumprir as exigências do mercado. “Eu fiz pós-graduação em ortopedia, curso de pilates e outros investimentos fundamentais na minha área, que certamente não conseguiria se estivesse morando sozinha”, diz a fisioterapeuta Elaine César de Matos, 34 anos, que vive com a mãe em São Paulo. Já o corretor de imóveis Adriano Beccari, 36 anos, conta que só realizou o sonho de morar durante quatro meses nos Estados Unidos e aperfeiçoar o inglês porque conseguiu juntar uma boa quantia vivendo com os pais.

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PARCERIA
Luciana e Angelita Esnarriaga: aos 36 anos, a advogada
e corretora de imóveis trabalha e mora com a mãe

Os filhos cangurus encontram, ainda, o apoio de uma corrente de psicólogos britânicos que discutem a necessidade de estender a adolescência até os 25 anos, e não mais até os 18. Segundo eles, essa medida evitaria que os jovens se sentissem pressionados a atingir marcos importantes, como a entrada na faculdade, por exemplo, o que pode levar a um complexo de inferioridade caso não os alcancem. Mas nem todos os especialistas concordam com essa tese. “Os pais estão retardando o crescimento dos filhos e a entrada deles na vida adulta”, diz o terapeuta familiar Moises Groisman. “Isso é totalmente negativo.” Unido a ele, está um time que defende que o amadurecimento tardio traz impactos negativos a esses jovens que cresceram cercados de cuidados excessivos. “São pessoas que não toleram nenhuma frustração”, afirma a psicóloga Lídia Aratangy. O advogado Daniel Dezontini, 37, que mora com os pais em São Paulo, confessa que montou o próprio escritório aos 30 porque não conseguia se adaptar a nenhum emprego. “Ter o respaldo dos meus pais me deixou mais corajoso para arriscar e engolir menos sapo.”

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Mas uma coisa é certa: por trás de todo filho canguru, existe um pai canguru. Em suas pesquisas, Mariana percebeu que muitos possuíam um comportamento ambíguo, ora estimulando as crias a serem independentes, ora recuando e se tornando possessivos. “Existe também um medo grande dos pais de encararem a realidade do envelhecimento, da renovação do casamento, de uma relação que precisa ser reconstruída”, afirma Groisman. O discurso de dona Angelita, mãe da corretora Luciana, confirma a tese: “Eu até acho que a Luciana pode se acostumar mal, porque tem muita mordomia, mas, se um dia ela for embora, eu vou sentir demais a falta dela”, confessa.

Fotos: Rafael Hupsel, Pedro Dias – Ag. Istoé

http://www.istoe.com.br/reportagens/334805_OS+FILHOS+CANGURUS

Como Joaquim venceu


O presidente do STF transformou o julgamento do mensalão numa cruzada e triunfou no seu esforço de evitar a impunidade

Izabelle Torres


A decisão de colocar imediatamente na cadeia 15 dos condenados no processo do mensalão devolveu o protagonismo do maior julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) ao seu relator, Joaquim Barbosa. Há dois meses, ele foi surpreendido pela disposição dos colegas de aceitar os recursos apresentados pelos réus e, desde então, articulava uma estratégia para evitar que sua cruzada em defesa das condenações não fosse em vão. Agora, o presidente do STF conseguiu reverter o jogo e impôs novamente o seu estilo ao julgamento. Em uma votação marcada por decisões inéditas, ele convenceu os ministros a votar o pedido de prisão imediata dos mensaleiros e evitou que os advogados ganhassem mais tempo para se manifestar sobre as ordens de prisão. Para isso, precisou driblar procedimentos formais que vinham sendo utilizados por décadas pela Suprema Corte e adotar nova interpretação para o processo de execução das penas impostas pelo STF. Barbosa defendeu com veemência, por exemplo, a possibilidade de fatiar a sentença em capítulos, o que permitiu a chegada de condenados à prisão antes mesmo do julgamento de todos os recursos. A prática não é novidade em tribunais de primeira instância, mas é inédita no Supremo. Para o presidente, era a única forma de garantir o cumprimento das penas, demonstrar repúdio a recursos protelatórios e levar mensaleiros, inclusive do núcleo político, para a cadeia. Se medidas como essa se tornarem rotineiras, o STF efetivamente dará mostras de que está em sintonia com as manifestações populares.

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SINTONIA COM AS RUAS
Na quarta-feira 13, a atuação do presidente do STF, Joaquim Barbosa,
foi fundamental para levar os mensaleiros para a cadeia

O mensalão se tornou uma questão pessoal para Barbosa. Graças às suas posições sintonizadas com o clamor das ruas, o caso o colocou em evidência, tornando-o um símbolo de combate à corrupção, com direito à popularidade em alta e especulações sobre suas intenções políticas. Seu grande mérito foi empreender todos os esforços para evitar a impunidade, que ameaçou dar o ar de sua graça quando a Corte votou pela admissibilidade dos embargos infringentes. Na semana que antecedeu o julgamento, o presidente da Corte manteve conversas com outros ministros. Em todas, falou que a conclusão do processo era uma questão institucional e ressaltou a importância de concluir o caso ainda neste ano. “Quando as instituições se degradam, o País se degrada”, pregou. Mas não foi o coleguismo dos ministros e a preocupação com a imagem do Supremo que ajudou o presidente a cumprir seus planos na condução da ação penal mais famosa da história do País. Barbosa contou também com as incertezas nas teses defendidas por ministros historicamente contrários a ele. Diante da discussão sobre prender até mesmo quem ainda tinha recursos a serem julgados, alguns ministros perderam-se nos próprios entendimentos e a sensação de quem acompanhava as discussões era de que nem eles sabiam ao certo o que estava em jogo. Diante das dúvidas, o presidente quase conseguiu emplacar a tese de que poderia ser preso até mesmo quem tivesse recursos pendentes de análise. Coube a Teori Zavaski propor a execução apenas das penas irreversíveis.

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Há mais de 40 dias, Barbosa já havia decidido que, na quarta-feira 13, pediria a prisão imediata dos mensaleiros. Um dos poucos conhecedores dessa intenção era o novo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Há dez dias, Barbosa disse a ele que faria o pedido de cumprimento das condenações, dando a entender que o Ministério Público Federal não precisaria se manifestar formalmente sobre o assunto. Janot ouviu, mas surpreendeu ao fazer o pedido na véspera do julgamento dos embargos apresentados pelos réus. Há quem entenda que, essa manifestação do MP, mesmo que tardia, deveria obrigar a Corte a também ouvir a defesa dos acusados. Novamente Barbosa interferiu. Alegou que Janot teve tempo suficiente para agir, mas decidiu fazê-lo apenas na véspera da sessão. Para ele, era uma tentativa de protelar o desfecho do caso. “Desse jeito, o julgamento não terá fim. Marquei a sessão com 15 dias de antecedência e ele decidiu apresentar parecer na véspera”, reclamou. Ao fim, Joaquim triunfou.

Foto: Alan Marques/Folhapress/PODER

http://www.istoe.com.br/reportagens/334915_COMO+JOAQUIM+VENCEU

Propina respinga na eleição


Investigação sobre máfia dos fiscais em São Paulo tumultua a relação entre o PT de Fernando Haddad e o PSD de Gilberto Kassab e ameaça acordo para a reeleição de Dilma. Lula é chamado para pôr fim à crise

Alan Rodrigues
 

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BOMBEIRO
O ex-presidente Lula agiu, na última semana, para apaziguar os ânimos entre PT e PSD

Na quarta-feira 20, a presidenta da República, Dilma Rousseff, e o ex-prefeito de São Paulo Giberto Kassab se encontrarão no Palácio do Planalto. Presidente nacional do PSD, Kassab desembarca em Brasília em meio a uma crise política envolvendo o seu partido e o PT. O estopim foram as desavenças públicas com o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), por causa das investigações da máfia da propina na prefeitura paulistana. Na última semana, depois de Haddad afirmar, em entrevista, que herdou uma prefeitura degradada, em “situação de descalabro” e com “nichos” de corrupção “instalados e empoderados”, Kassab respondeu no mesmo tom, dizendo que “um descalabro” seria o primeiro ano de gestão do petista à frente da capital paulista. Kassab ainda acusou o petista de usar politicamente a investigação para desgastá-lo. O temor de Dilma é que a contenda política regional inviabilize a almejada aliança com o PSD de Kassab nas eleições presidenciais do próximo ano. Por isso, na conversa com o ex-prefeito de São Paulo, Dilma tentará jogar água na fervura da crise paulistana.

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Não deverá, porém, ser uma conversa simples. A crise não se restringe às trocas de farpas públicas. Vereadores do PSD alegam ter sofrido represálias e perdido cargos em subprefeituras por terem votado contra o aumento do IPTU, proposto por Haddad. “Vamos querer os cargos de volta ou uma compensação”, declarou um parlamentar do PSD. Ciente de sua relevância no xadrez político, Kassab também cobrará que Haddad cesse os ataques contra ele. “O que causou indignação foram afirmações e ilações de que a corrupção não foi combatida em nossa gestão – embora sejam públicos os inúmeros casos em que agimos com resultados extremamente positivos. A investigação, como requer toda e qualquer denúncia anônima, foi iniciada pela Corregedoria-Geral do Município em setembro do ano passado”, disse Kassab em entrevista à ISTOÉ. “Aqueles que porventura se sintam acusados por não proteger o Estado no passado – seja pelo arquivamento de denúncias, seja pela não condução de um processo formal e consequente investigação – têm todo o direito de tentar se explicar”, devolveu Haddad, demonstrando que a negociação de um cessar-fogo entre os dois será mais complicada do que parece. Ocorre que os articuladores políticos do governo federal estão convencidos da importância da aliança de Dilma com o partido comandado por Kassab. O PSD possui 46 deputados federais e três minutos de tempo no horário eleitoral gratuito, fundamentais tanto para a reeleição de Dilma como para eventual apoio à candidatura do ministro da Saúde, Alexandre Padilha, ao governo de São Paulo, no primeiro ou no segundo turno, caso Kassab seja candidato. Aliás, o PT conta com a candidatura de Kassab ao Palácio dos Bandeirantes, para facilitar a realização de um segundo turno. O principal objetivo do PT em 2014, além de reeleger a presidenta Dilma, é quebrar a hegemonia tucana no Estado.

A parceria com Kassab é considerada tão estratégica pelo Palácio do Planalto que até o ex-presidente Lula entrou em campo, na última semana, para serenar os ânimos políticos do PSD e evitar que a troca de chumbo respingasse em Dilma. Foi Lula quem articulou, em conversa com Kassab, uma indicação formal de aliança desde já. A pedido de Lula, o presidente nacional do PT, Rui Falcão, também conversou com o ex-prefeito nos últimos dias. Embora não tenha havido qualquer promessa de que as investigações sobre a máfia dos fiscais pouparão Kassab, existe uma ala, mais próxima a Lula, que acredita que o partido, para consolidar a aliança com o PSD, deve abrandar as denúncias de corrupção que envolvam aliados do ex-prefeito. “Haddad tem que fazer seu papel de prefeito, de investigar, mas é preciso preservar as relações”, entende o deputado Vicente Cândido.

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Na última semana, porém, as apurações se voltaram contra a própria gestão de Haddad. Na terça-feira 12, o principal dirigente petista com cargo na prefeitura, Antônio Donato, entregou o cargo de secretário de Governo, suspeito de envolvimento com a máfia dos fiscais da prefeitura. Donato é acusado de ter recebido, de dezembro de 2011 a setembro de 2012, uma mesada de R$ 20 mil de Eduardo Hole Barcelos, um dos fiscais presos no esquema milionário de fraude no ISS. O fiscal disse aos promotores que era “investimento futuro” para manutenção de cargos, se o PT vencesse as eleições. Donato negou. O problema maior, no entanto, foi que ele, a exemplo de Haddad, resolveu atirar no antecessor do prefeito. “Essa é uma crise do governo passado, que precisa explicar como um esquema desses ficou oito anos aqui dentro”, disse Donato. Como se percebe, mesmo com a intervenção de Lula e o interesse de Dilma em colocar panos quentes na crise, os ânimos estão acirrados.

Historicamente, os atritos não são uma novidade. A relação entre o PT e o ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab nunca foi tranquila. Pelo contrário. Em 2012, apesar do esforço do Planalto e da cúpula petista por uma aliança nas eleições municipais, Kassab foi muito vaiado durante cerimônia de comemoração dos 32 anos do PT. Ao fim e ao cabo, o tucano José Serra decidiu concorrer à prefeitura e Kassab apoiou o PSDB. É tudo o que o Planalto não quer em 2014.

http://www.istoe.com.br/reportagens/334913_PROPINA+RESPINGA+NA+ELEICAO

Procurador muy amigo


Rodrigo De Grandis deixou de investigar quatro autoridades que comandaram o setor de energia durante governos tucanos em São Paulo

Claudio Dantas Sequeira


Agaveta do procurador Rodrigo De Grandis é mais profunda do que se imaginava. Além dos ofícios do Ministério da Justiça com pedidos da Suíça para a apuração de contratos suspeitos envolvendo a multinacional Alstom, ele engavetou uma lista secreta com nomes de autoridades públicas, lobistas e empresários que deveriam ter sido investigados desde 2010. O que mais chama a atenção na lista suíça, a qual ISTOÉ obteve com exclusividade, é a presença de quatro ex-executivos da Companhia Energética de São Paulo (Cesp), que, até agora, não haviam aparecido no enredo do escândalo do Metrô e do propinoduto tucano em São Paulo. Poupados por De Grandis, esses personagens comandaram o setor de energia durante seguidos governos tucanos e, hoje, ganham a vida em consultorias privadas, algumas com estreito vínculo com a cúpula do PSDB paulista. São eles: Julio Cesar Lamounier Lapa, Guilherme Augusto Cirne de Toledo, Silvio Roberto Areco Gomes e Iramir Barba Pacheco. Os quatro foram nomeados por Covas. Mas, enquanto Lapa deixou o governo tucano ainda em 2001, os outros três permaneceram intocáveis na cúpula da Cesp por mais de uma década.
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ENGAVETOU DE NOVO
Rodrigo De Grandis já tinha mandado para o arquivo oito
ofícios que pediam apuração do escândalo do Metrô

Lapa, que foi presidente da Comgás na gestão Mario Covas e diretor financeiro e de relações com investidores da Cesp, é sócio de Bolívar Lamounier na Augurium Análise Consultoria e Empreendimentos Ltda. Bolívar, velho amigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, com quem até escreveu um livro em parceria, é considerado um dos principais intelectuais tucanos. Outro integrante da lista dos poupados por De Grandis, Toledo foi o que permaneceu na Companhia Energética de São Paulo por mais tempo – 12 anos no total. Ele assumiu a presidência da Cesp em 1998 no lugar de Andrea Matarazzo, quando este virou secretário de Energia. Como já se sabe, Matarazzo responde a inquérito por suspeita de receber propina do grupo Alstom em contratos superfaturados. Além da Cesp, Toledo acumulou a presidência da Emae (Empresa Metropolitana de Águas e Energia), que também assinou contratos milionários com a Alstom. Ele deixou o governo apenas em janeiro de 2010, sob ataque de sindicatos do setor contra o plano de privatização da companhia. Em novembro daquele ano, o MP suíço pediu que Toledo fosse ouvido dentro do processo EAI 07.0053-LENLEN. Além da oitiva, os promotores pediram medidas de busca e apreensão, além de quebra de sigilo bancário. Os dados seriam fundamentais para a instrução de mais seis processos em curso naquele país. Assim como Lapa, Toledo hoje vive de consultorias no setor.

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A estatal também abrigou, de Covas a José Serra, o engenheiro Silvio Areco Gomes, outro protegido por De Grandis. Ele só deixou a direção de geração da Cesp em 2008, ano em que eclodiram as primeiras denúncias do esquema de propinas da Alstom. Assim como Toledo, Gomes virou consultor. Abriu a Consili Consultoria e Participações. Pacheco é o quarto na lista engavetada pelo procurador De Grandis. Ele foi nomeado em 1999 como diretor de planejamento, engenharia e construção da Cesp e lá ficou até o início do segundo governo de Geraldo Alckmin. Foi substituído no cargo por Mauro Arce, que acumulou a função com a de presidente da estatal. Pacheco responde no Tribunal de Contas do Estado, junto com Toledo, por contrato suspeito com a empresa Consbem Construções, responsável pela reforma dos edifícios-sede I e II da Cesp. A 2ª Câmara do TCE considerou irregulares o contato de R$ 37 milhões e seus cinco aditivos. Os réus recorreram da decisão no ano passado e o caso foi parar justamente nas mãos do conselheiro Robson Marinho, já denunciado por receber propina da Alstom.

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Sem avançar nas investigações, o MP suíço ainda não aprofundou o envolvimento dos quatro executivos da Cesp no esquema de propinas tucano. Serão necessários um pente-fino nos atos administrativos e uma devassa nas contas das consultorias identificadas. No mesmo processo suíço que arrola os protegidos do procurador, também estão citados outros 11 nomes. No Brasil, apenas cinco deles foram incluídos no inquérito que a Polícia Federal concluiu em 2012 e que levou ao pedido de quebra de sigilo bancário solicitado por De Grandis em setembro. Entre eles, os tucanos José Geraldo Villas Boas e José Fagali Neto.

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Apuração de irregularidades no setor de energia foi parar nas mãos do
conselheiro Robson Marinho, denunciado por receber propina da Alstom

Fotos: ROBSON FERNANDJES, CLAYTON DE SOUZA-AE; PAULO GIANDALIA/VALOR/FOLHAPRESS

A escolinha da professora Dilma


Presidenta escala ministros para ensinar prefeitos e governadores a desatar os nós burocráticos que impedem a liberação de recursos federais

Izabelle Torres


A dificuldade para dar andamento a programas e convênios de Estados e municípios com o governo federal pode ter efeitos diretos nas metas pretendidas pela presidenta Dilma Rousseff. Ciente desse impacto, ela escalou ministros e funcionários graduados da Caixa Econômica Federal para ensinar governadores e prefeitos a elaborar projetos e cumprir as exigências dos programas federais. A ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, ficou responsável por organizar verdadeiras aulas nos Estados. Desde maio, ela se desloca acompanhada de técnicos de diferentes ministérios, que montam tendas para ministrar aulas aos gestores. Ideli dá palestras acompanhada pelo ministro das Cidades, Agnaldo Ribeiro, que tem nas mãos a responsabilidade pelas obras de mobilidade urbana, orçadas em R$ 50 bilhões. Apesar do dinheiro farto, as obras emperraram por dificuldades de implementação.

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Dilma quer tirar do papel promessas de campanha e algumas feitas durante as manifestações populares de junho, como a construção de creches, a realização de obras de mobilidade e a implementação de programas de melhoria da segurança pública. Para isso, precisa que prefeitos e governadores cumpram os convênios e executem os contratos. Como a principal alegação dos municípios que esperam pelo dinheiro quase sempre diz respeito ao desconhecimento dos trâmites oficiais, Dilma deu duas ordens: reduzir as exigências que autorizam entes federados a receber recursos e abrir um canal de diálogo capaz de esclarecer dúvidas e ensinar gestores sobre a burocracia federal. Desde então, a equipe de ministros e técnicos visitou 24 dos 27 Estados. Técnicos da Caixa Econômica Federal já foram escalados para ensinar como os recursos são liberados e como é possível deixar a inadimplência que emperra novos repasses.

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PROFESSORA
A ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, que deu aulas
em diversos Estados: ela quer facilitar a liberação do dinheiro

Na semana passada, a Caixa decidiu listar alguns dos municípios mais problemáticos, para enviar engenheiros, arquitetos e analistas financeiros com a missão de auxiliar os gestores. Correndo contra o tempo, os ministros tentam dar respostas. No Ministério da Justiça, governadores interessados em construir presídios contam com um projeto pronto elaborado pelos técnicos da pasta, restando aos Estados apenas a responsabilidade de realizar a licitação. O mesmo aconteceu no Ministério da Saúde, onde um projeto de padronização de unidades básicas pode ser baixado em formato PDF. Enquanto isso, a comitiva em forma de escola segue realizando os treinamentos. Pelo menos até que as metas dos programas federais se aproximem das promessas da presidenta.
Fotos: Pedro Ladeira/Frame; Monique Renne/CB/D.A Press 

http://www.istoe.com.br/reportagens/334865_A+ESCOLINHA+DA+PROFESSORA+DILMA

E Zé Dirceu mudou o Brasil


O ex-guerrilheiro que enfrentou a ditadura militar e ajudou a colocar um operário no poder vai para a prisão por corrupção e se transforma no símbolo nacional contra a impunidade

Josie Jeronimo

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OS ÚLTIMOS MOMENTOS DE LIBERDADE
José Dirceu deixa o mar na praia de Itacaré (Bahia), na
quarta-feira 13, enquanto sua prisão era definida em Brasília

José Dirceu de Oliveira usava boné preto e calção branco nas areias do paraíso baiano de Itacaré, na quarta-feira 13, quando mais uma vez foi surpreendido pela história. Dessa vez, a surpresa não foi protagonizada por homens fardados a serviço de um regime de exceção, contra o qual o ex-todo-poderoso ministro empenhou boa parte de seus 67 anos. Na quarta-feira, no final de uma das mais longas deliberações do Supremo Tribunal Federal, os 11 ministros praticamente encerraram o chamado julgamento do mensalão e 13 dos 25 réus já condenados tiveram suas prisões decretadas. Entre eles há empresários, uma banqueira e diversos líderes políticos (leia quadro acima), mas Dirceu, sem dúvida, é o principal personagem de uma história cujo desfecho pode representar significativa mudança para o Brasil.

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Em cinco décadas, José Dirceu viveu momentos difíceis e também gloriosos da política brasileira. Liderou os protestos estudantis de 1968, exilou-se em Cuba e retornou ao Brasil como guerrilheiro disposto a pôr fim à ditadura militar. Experimentou a clandestinidade, ajudou a organizar a campanha das diretas-já, foi um dos arquitetos do PT e um dos principais responsáveis pela chegada do partido ao poder. Tinha o projeto e estava se preparando para ser o sucessor de Lula quando acabou abatido no escândalo do mensalão, acusado de ser o “chefe de uma quadrilha” que desviava dinheiro público para a compra de apoio parlamentar. Na semana passada, enquanto na Bahia o ex-ministro descansava na praia, em Brasília sua prisão era decidida não por razões políticas ou ideológicas, mas por corrupção e formação de quadrilha. No papel de réu, José Dirceu, por mais irônico que pareça, contribui mais uma vez para revolucionar o País. A decisão do STF vira uma página de nossa história. A ideia de que do lado de baixo do Equador os casos de corrupção terminam em pizza e de que os poderosos não são punidos como os simples mortais pode estar com os dias contados. Para isso, basta que em suas futuras decisões os membros da mais alta corte de nossa Justiça ajam com o mesmo rigor com que julgaram o mensalão.

Alertado por seus advogados, pouco depois de Joaquim Barbosa anunciar a decisão do STF em Brasília, José Dirceu já havia abandonado o traje de banho e tomava o caminho de São Paulo. Era tarde da noite quando desembarcou em Jundiaí, a caminho de sua casa em Vinhedo, onde pretendia assistir à reabertura do julgamento, na quinta-feira 14. Mais tarde, foi até seu apartamento, no Ibirapuera, em São Paulo. Fiel a uma postura de lutar por seus direitos e defender a própria inocência sem tomar nenhuma atitude que possa ser vista como desafio à lei, seria conveniente a José Dirceu encontrar-se em seu endereço residencial quando uma equipe da Polícia Federal tocasse a campainha, o que se imaginava que poderia acontecer mesmo nos dias seguintes. Na tarde da quinta-feira 14, o único pedido de José Dirceu aos advogados era o de que fosse poupado de cenas constrangedoras, como o uso de algemas e a condução em viaturas policiais.

Oito anos se passaram desde que o mensalão foi denunciado pelo então deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), também com a prisão decretada pelo STF. E, apesar da experiente bancada de defensores, todos os réus foram colhidos de surpresa na semana passada. A bons observadores, não foi difícil constatar que a medida foi aprovada às vésperas de 15 de novembro, aniversário da República, aquela que tantos julgam ameaçada e outros supõem distraída. Antes da quarta-feira 13, mesmo os tarimbados profissionais de direito não faziam ideia da importância especial da sessão marcada para aquele dia. A maioria das cadeiras reservadas a advogados, no plenário do STF, estava vazia. Idem para as mesas e os computadores destinados aos jornalistas e também para poltronas que acomodam estudantes que costumam ser anunciados pelo ministro Joaquim Barbosa antes do início dos trabalhos. Depois que a defesa conseguiu, há dois meses, a aprovação dos embargos infringentes, naquela que foi a primeira derrota aberta de Joaquim Barbosa no julgamento, a impressão geral era de que a Ação Penal 470 entraria em novo curso, favorável aos acusados. Em função da natureza específica dos crimes de que são acusados, boa parte dos condenados do núcleo político, com José Dirceu à frente, parecia ter ótimas chances de escapar do regime fechado.

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EXECUÇÃO IMEDIATA
Em sua estreia no mensalão, o procurador da República
também pediu a prisão imediata dos mensaleiros
A decisão da última semana não muda essa percepção, mas aos brasileiros permite a avaliação de que a impunidade não venceu. E, sob o ponto de vista jurídico, pode encerrar a fase de boas notícias para os réus. Depois que o STF aprovou a execução das penas por 11 a 0, a estratégia de procurar retardar as decisões fica absolutamente comprometida. Agora, entendem juristas ouvidos por ISTOÉ, as chances de os réus saírem vitoriosos em seus pedidos de revisão parecem menores. A votação da quarta-feira 13 mostrou que ministros até então considerados votos fiéis aos acusados podem perfeitamente se alinhar ao relator do processo, ministro Joaquim Barbosa.

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Os primeiros sinais de que os dias de José Dirceu em Itacaré estavam para terminar surgiram na noite da terça feira 12, quando o novo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, divulgou um parecer sobre o julgamento. Janot assumiu o posto em setembro, recebendo elogios até da banda jurídica do governo Dilma Rousseff, convencida de que os tempos excessivamente politizados de Roberto Gurgel e Antônio Carlos Fernando haviam terminado. Divulgado depois que Janot teve um encontro reservado com Joaquim Barbosa, antes do julgamento, o parecer desmentia essa visão e antecipava a proposta que o presidente do STF iria apresentar de viva voz, no dia seguinte, durante a sessão. Janot trazia, no parecer, a ideia de pedir a prisão de todos os réus com condenações definitivas – ressalvando, apenas, os crimes em que ainda se aguardasse recurso.

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RUMO À CADEIA
Em sua casa no interior do Rio, na quinta-feira 14, o ex-deputado
Roberto Jefferson aguardava a confirmação do cumprimento imediato de sua pena

Surpresos com o posicionamento do procurador-geral, os advogados esperavam que Janot usasse a tribuna para sustentar sua tese. Isso lhes facultaria o uso da palavra e qualquer decisão levaria ao menos cinco ou seis sessões para ser tomada. Na prática, imaginavam levar a discussão apenas para depois do recesso do fim de ano. O que eles não esperavam é que o procurador permanecesse em absoluto silêncio. Diante dos protestos dos advogados da defesa, queixando-se de que não era correto serem recebidos com uma medida de surpresa, à ultima hora, o ministro Ricardo Lewandowski solicitou que fosse dado o prazo de cinco dias para que todos debatessem a questão. “A surpresa num processo jurídico não é compatível com o ordenamento legal de um regime democrático,” disse o ministro, mais tarde, falando à ISTOÉ. Lewandowski acabou derrotado por 9 a 2.

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Da mesma forma que o Supremo ainda elaborava, na semana passada, os últimos cálculos sobre as penas de cada condenado, estavam em curso os preparativos para recebê-los. Numa primeira fase, o plano é reunir todos eles numa ala especial no presídio da Papuda, em Brasília, que costuma receber políticos que cumprem penas provisórias em casos de corrupção apurados em sucessivas operações da Polícia Federal. Nos últimos anos, 150 agentes penitenciários foram treinados e integram um grupo que deverá cuidar dos condenados da Ação Penal 470 assim que as guias de prisão começarem a ser cumpridas. Geralmente, os pedidos de prisão são direcionados aos órgãos estaduais de execução. Como o Supremo é uma corte nacional, Joaquim Barbosa optou por centralizar no Distrito Federal a primeira fase de apresentação dos réus.

Os condenados devem chegar a Brasília de avião e ser entregues às autoridades penitenciárias do Distrito Federal. Seu destino é uma ala composta por dois blocos independentes, com sete celas cada uma. Os condenados terão escolta, por serem considerados presos “com visibilidade”, o que implica não apenas a curiosidade maior dos meios de comunicação, mas também eventuais problemas de segurança. A rotina de cada preso na Papuda dependerá, inicialmente, dos despachos do juiz Ademar Silva de Vasconcelos. Cabe a ele decidir se o preso pode ou não ter televisão, cela individual, receber alimentação especial e esquema especial de visitas. De forma discreta, o juiz tem sido assediado por advogados procurando assegurar o melhor conforto aos condenados.

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A passagem por Brasília pode ser definitiva ou provisória. Dependerá, na verdade, da disposição de cada preso. Aqueles que solicitarem permanecer na capital federal terão direito a fazê-lo. Mas a legislação reserva às pessoas privadas de liberdade o direito de solicitar transferência para uma área próxima de seu domicílio. A palavra final é sempre do juiz encarregado da execução penal, mas essas solicitações costumam ser atendidas.

Na agenda do Supremo estão vários casos de corrupção envolvendo figuras importantes da República. Entre eles há o mensalão tucano e o mensalão do DEM, por exemplo. Daqui para a frente, portanto, os ministros do STF terão oportunidade de provar ao País que a intolerância com os desvios de conduta dos poderosos e o ataque aos cofres públicos seguirão merecendo rigor idêntico ao da AP 470.  
Foto: Pedro Ladeira/Folhapress
foto: Estadão conteúdo
Foto: Pablo Jacob/Agência O Globo

Sobre a prisão dos "mensaleiros"



Se Lula não tivesse sido eleito presidente do Brasil, Joaquim Barbosa jamais chegaria a ser ministro do STF. No entanto Joaquim Barbosa perpetrou a maior fraude jurídica de que se tem notícia nesse país, ao expedir os mandatos de prisão contra os réus da ação penal 470, condenados contra as provas dos autos, sem direito ao duplo grau de jurisdição, com o fatiamento da denúncia, o que permitiu a construção de uma narrativa mentirosa segundo a qual o PT teria comprado apoio político de certos congressistas, inclusive de seus próprios deputados, um contrassenso imenso, a julgar pela validade desse argumento que não se sustenta pela força dos fatos.

O erro de Lula foi ter agido republicanamente na escolha dos indicados ao STF, abrindo mão de colocar na Suprema Corte pessoas de sua confiança pessoal, ligadas ao espectro ideológico do qual faz parte, como sói acontecer no mundo inteiro, inclusive nos E.U.A modelo para tudo, menos para essa questão da indicação de pessoas ao cargo de ministros do STF, por razões óbvias.

A mídia e seus algozes tiveram uma vitória de pirro. A prisão dos "mensaleiros" exporá a chaga aberta que é a justiça desse país. Sua hipocrisia descarada, seletiva, capaz de deixar um Paulo Maluf livre das algemas e colocar um homem probo, sério e honrado atrás das grades, como Genoíno, e avançar com ódio figadal sobre José Dirceu e levá-lo a humilhação e desonra públicas para satisfação dos instintos bestiais de uma elite perversa, falso moralista, sonegadora de impostos e que fala sobre ética da boca pra fora, haja vista praticar em maior ou menor escala os mesmos crimes pelos quais os "mensaleiros" foram condenados, sem base nas provas dos autos.

O papel de Joaquim Barbosa no julgamento da ação penal 470 é um episódio à parte que entra nos anais da história como uma página negra, um cadáver insepulto que fica na sala a lembrar aos que permanecem os erros cometidos e cuja reparação mesmo que tardia jamais será suficiente diante de uma campanha midiática de assassinato de reputação, ao longo de vários anos, resultando na sentença anunciada e previamente já conhecida em nome da tese fajuta de que os condenados são pessoas poderosas e milionárias, algo totalmente divorciado da realidade.

José Genoino em mais de 30 anos de vida pública, mora no mesmo local e não tem patrimônio sequer para pagar a multa de quase 1 milhão de reais imposta pelos ministros do STF, não obstante esse discurso repetitivo que engana os incautos que o apapagaia, uma reprodução que falsifica a verdade.

Muito bem fez Pizzolato ao fugir do país e apelar para um novo julgamento em solo italiano onde num ambiente de serenidade, juízes imparciais poderão examinar as provas dos autos ricas em sua contundência, ao demonstrarem que não há dinheiro público nesse famigerado esquema, como bem sabe Joaquim Barbosa, conhecedor do inquérito sigiloso que correu paralelamente a ação 470, tantas vezes ignorado e não trazido ao conhecimento público com o mesmo estardalhaço da ação penal que resultou na condenação e prisão dos "mensaleiros".

O jogo ainda não acabou e haverá outros desdobramentos desse julgamento que será objeto de questionamentos nas cortes internacionais de justiça para que o erro histórico que se cometeu contra o PT seja revisto, sob pena de ficar escancarado o partidarismo do STF que agiu como braço da verdadeira oposição no Brasil, a imprensa, golpista, sem votos e falsa moralista que só se move para exigir investigação e punição nos escândalos de corrupção que porventura tenham algum petista envolvido e se não tiver, manda-se que um bandido qualquer cite um petista para melar as investigações e impedir que os culpados sejam punidos, tal como acontece agora em São Paulo no caso do metrô e na máfia dos fiscais desmantelada pela gestão do prefeito Haddad e que essa mesma imprensa bandida quer jogar no colo do PT, um esquema que é da gestão Serra/Kassab.

Mas isso está chegando a um melancólico fim. Quanto mais age politicamente, qual partido de oposição, mais sua credibilidade fica esgarçada, em frangalhos e a imprensa perde leitores e influência na formação da opinião nacional, restringido-se apenas a um público deformado, doente na mente, vil em suas ações e omissões, subproduto de um jornalismo de esgoto que perdeu qualquer escrúpulo e se alimenta de sua própria vilaneza.