terça-feira, 12 de agosto de 2014

ALTERAÇÃO DE PERFIL: LULA, DILMA, PETROBRÁS





Vamos falar de bullying ideológico? Não faltam clássicos do jornalismo meliante a incriminar Lula, sangrar o PT, indispor Dilma e a falir a Petrobrás.



Alteração de perfil: Picasso, Lula, Dilma e Petrobrás

Não se sabe ainda se foi um surto de megalomania ou de desespero.

Quem sabe as duas coisas juntas.

O  fato é que jornalistas do maior oligopólio de comunicação do país, cujos perfis foram  alterados na Wikipédia com uso do sinal de Wi-Fi do Planalto, declararam-se vítimas de uma política oficial de bullying  ideológico.

Promovida pelo ‘governo do PT’.

Claro.

Não importa que a trama careça de lógica. Manchetes faiscantes selaram o enredo.

É preciso paciência. Vamos lá.

Personagens autoexplicativos, que vivem de reafirmar o que são, cujas assinaturas se confundem com um timbre do que representam, demandariam alguma conceituação adicional? 

E do governo? 

De um governo que investe a maior verba publicitária destinada à tevê justamente no grupo ao qual  os dois ofendidos pertencem?

E o faz a contrapelo de uma audiência crepuscular  dos beneficiados –atacaria assim?

Pela…  Wikipédia?

De dentro do Planalto?

Carta Maior  nasceu e se propõe a ser um espaço de reflexão da esquerda que não renuncia à interdependência entre socialismo e democracia.

Sua isenção consiste em produzir  jornalismo –com modestíssimos recursos–   a partir desse mirante histórico.

A opção não dispensa, ao contrário, pressupõe   um ambiente de pluralidade informativa para afrontar o denso nevoeiro da crise civilizatória do nosso tempo, da qual o vale tudo do capitalismo é uma síntese robusta.

Os dias que correm demonstram: isso não é retórica.

Os referidos donos dos ‘perfis alterados’, no entanto,  habitam um universo de comunicação   isento de dúvidas. E avesso ao contraditório.

Desse minarete blindado sentenciam projetos, programas, lideranças, movimentos, governos e reputações  à fogueira purgativa de um capitalismo entregue à sua própria  lógica.

Ai dos que teimam.

Um metalúrgico teimou e chegou onde não devia, em 2003, enfiando-se  em uma faixa presidencial .

Sujeito sem termo, de jejuna experiência administrativa, o monoglota pouco afeito aos bons modos, veio cercado de gente da mesma cepa e ungido por malta de instintos equivalentes  aos seus.

A elite e o dinheiro reagiram e reagem inconformados. 

Vamos falar de bullying ideológico? De sistemática falsificação no perfil? De onipresente e martelante adulteração de imagem?

Por exemplo.

Na edição da Folha de São Paulo  –um braço dessa engrenagem–  desta 2ª feira (11/08), pequena nota  corrige erro aparentemente  desprovido  de maiores consequências, cometido no alvorecer do ciclo de governos petistas.

Só aparentemente.

Na edição dominical de 07 de março de 2004, o jornal alimentara o sentimento de menosprezo dos seus leitores pela coisa pública, oferecendo-lhes um contundente exemplo da incompetência estatal, ademais do despreparo do novo governo, para lidar com o próprio patrimônio.

Sob o título “Decoração burocrata –Desenho do pintor espanhol, que divide moldura com restos de insetos, foi descoberto por historiador”, uma foto gigantesca na 1ª página da Folha mostrava o que seria um autentico Picasso (1881-1973), pendurado em uma das salas da direção do INSS, em Brasília.

“Uma mulher desenhada por Pablo Picasso”, dizia o texto, “passa os dias debaixo de luzes fluorescentes e em meio à papelada de uma repartição (…)  Pendurada desde o final do ano passado numa das salas da diretoria do instituto próxima de uma fotografia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a mulher de Picasso ainda aguarda um destino melhor… ” (Marta Salomon; Folha de SP (07/03/2004)

Como então, uma gente que não consegue dar destino melhor a um tesouro artístico do que ombreá-lo a um pôster de Lula, pode se propor a comandar o país?

Era a mensagem.

A intenção verdadeira.

Tão falsa quanto a originalidade  da obra.

O tesouro, agora se admite, era apenas uma reprodução de desenho do pintor de Guernica.

A confissão do bullying  veio nesta 2ª feira.

Com uma década de atraso.

Ainda assim porque a barriga foi resgatada pelo cineasta Jorge Furtado, que argui o padrão  Frias de qualidade em seu recém lançado filme,  ‘Mercado de Notícias’
A real dimensão do que estava em jogo  remete a um processo bem mais amplo de ‘alteração de perfil’  que ainda não terminou.

Empossado há um ano e três meses, o então Presidente Luís Inácio Lula da Silva era alvo de um agressivo  terceiro turno por parte de um dispositivo midiático disposto a vingar a derrota do seu eterno delfim, o tucano José Serra.

O ataque era humilhante  e implacável. Não raro grosseiro.

Três meses depois  do Picasso, a mesma Folha e de novo na edição nobre dominical ( 13/06/2004), estampava nova foto sugestiva na primeira página.

Maior que a anterior, vinha encimada de manchete capciosa  e deselegante. A composição cuidava de cevar o ódio da classe média, fidelizando-a no menosprezo e na desqualificação  ao novo governo e ao seu principal expoente.

Uma ração matinal para as famílias se enojarem da política e dos políticos  –sobretudo os do PT.

Na imagem, Lula toca um berrante numa angulação que dá sentido dúbio ao seu gesto. A intenção  ostensivamente  buscada se explicita na manchete garrafal a emoldurar o conjunto:

‘25% dos filhos da elite bebem demais’(http://acervo.folha.com.br/fsp/2004/06/13/2/)

O texto reitera a visada:  “ (…) à noite, houve uma festa junina para marcar os 30 anos de casamento do presidente (…) O carro de boi estava carregado de comidas típicas, como carne seca, paçoca e biscoito de polvilho, além de três litros de cachaça…”(Folha de S Paulo; 13/06/2004)

Isso é alteração de perfil ou  jornalismo isento?

É coincidência ou ‘alguém deu ordem para isso’ –como  afirmou um dos personagens do ‘escândalo da wikipédia’?
Em dúvida, convém reler o texto da então colunista do jornal , Danuza Leão, publicado dois dias depois do arraial na Granja do Torto, na terça-feira,15/06/2004.

Com o título descolado, ‘Fala sério, Lula!’, a  socialite completa o serviço iniciado no domingo.

Estamos falando de uma  virtuose na arte de adicionar preconceito de classe ao antipetismo. Quem não se lembra do seu libelo contra os porteiros da era Lula, que agora também andam de avião? (http://www.cartamaior.com.br/?/Editorial/Daslu-Danuza-e-Da-o-fora-/30012).

Em 2004, ela já era boa nisso.

Trechos: ‘‘O Brasil tem tantos regionalismos bacanas (…) e o presidente e dona Marisa Letícia vão escolher logo uma caipirada dessas? Foi um desastre desde o começo: o tema da festa, o carro de boi chegando cheio de paçoca e cachaça (…)  Sempre se soube que a saudade de Fernando Henrique e dona Ruth Cardoso ia ser grande, mas não dava para imaginar que fosse ser tão grande. O arraiá foi de uma breguice  difícil de ser superada, mas não vamos perder as esperanças: até o fim do mandato eles talvez consigam” (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1506200413.htm)

Não seria o auge.

Eles se superam. 

Um clássico do gênero coube à edição da mesma Folha de S. Paulo,  de 30 de setembro de 2006, véspera do 1º turno da eleição presidencial daquele ano.

Um jato da Gol havia se chocado no ar com outro avião. Morreriam 155 pessoas.

A tragédia, de longe, era o destaque do dia. Mas a Folha, a mesma que agora se retrata com uma década de atraso  em relação ao falso Picasso, descolaria outra  obra de arte no gênero ‘falsificação de perfil’.

Virou um ‘case’ do jornalismo meliante.

A manchete em seis colunas (‘Fotos mostram dinheiro do dossiê’) faiscava sobre a imagem de uma montanha de notas, supostamente para a compra de um dossiê contra Serra  –que havia abandonado a prefeitura para disputar o governo do Estado.

Logo abaixo da pilha de dinheiro, a imagem de Lula, encapuzado com um impermeável de chuva que cobria o seu rosto.

Dois homens ladeavam o presidente e candidato à reeleição contra o tucano Geraldo Alckmin.

Seguravam o seu ombro. http://acervo.folha.com.br/fsp/2006/09/30/2/

Coisa de profissional.

O conjunto compunha a cena típica do bandido capturado por policiais: Lula reduzido à imagem de um marginal, emoldurado por dinheiro suspeito e manchetes criminalizando o PT.

A caminho da urna. Ou do xadrez?

Foi assim a marretada no seu perfil público naquele sábado, véspera da votação do 1º turno das eleições presidenciais de 2006.

Hors  concours?

Nunca se sabe.

Como esquecer a peça de 17 de dezembro de 1989?

Sequestrado por ex-militantes políticos chilenos, o empresário Abílio Diniz  seria libertado do cativeiro naquele dia.

Presos, os sequestradores seriam fotografados e filmados pela Globo & Cia usando camisetas do PT.

Isso aconteceu exatamente no dia da votação do segundo turno da disputa presidencial, vencida por Collor.

Acabou?

Em 2010 teve a ficha da Dilma.

Em 2012, a decisão do relator Joaquim Barbosa de calibrar o julgamento do chamado mensalão, de modo a sentenciar o ex-ministro José Dirceu à boca da urna das eleições municipais…

Assim por diante.

Como será a primeira página da Folha e assemelhados no dia 4 de setembro, véspera do 1º turno das eleições presidenciais deste ano?

Não se pode  alimentar ilusões.

Tome-se a fuzilaria contra a Petrobrás nos dias que correm.

O alvo é duplo: derrubar a estatal no colo da candidatura Dilma.

A empresa criada por Getúlio em 1953,  fechou 2013 como a petroleira que mais investe no mundo: mais de US$ 40 bilhões/ano; o dobro da média mundial.
Ademais,  é a campeã mundial no decisivo quesito de  prospecção de novas reservas.

Este ano, 36 novos poços já entraram em operação.

O pré-sal já produz  480  mil barris/dia.

Em quatro anos, a Petrobras estará extraindo 1 milhão de barris/dia da Bacia de Campos.

Até 2017,  investirá US$ 237 bilhões; 62% em exploração e produção.

Em 2020, só o pré-sal adicionará 2,1 milhões de barris/dia à oferta brasileira.

Praticamente dobrando  para 4 milhões de barris/dia a produção nacional.

O bullying contra a empresa  mal disfarça seus  propósitos.

Seu empenho, neste momento, é sequestrar a Petrobras para o palanque da campanha sombria: o ‘Brasil que não deu certo’.

Os números retrucam. O pré-sal mudou o tamanho geopolítico da nossa economia.

O mais difícil foi feito.

O novo marco regulador transfere à Petrobras a responsabilidade soberana de harmonizar duas variáveis básicas: o ritmo da extração e o do refino.

Ambos associados à capacidade brasileira de atender à demanda por plataformas, máquinas, barcos, sondas etc.

Se a exploração corresse livre,  todo o efeito multiplicador do pré-sal vazaria em importações e geração de empregos lá fora.

Para internalizar as rendas do refino, cinco plantas estão sendo construídas, simultaneamente.

A Abreu de Lima, a maior de todas, entra em operação em novembro.

O conjunto causa  erupções cutâneas na pátria dos dividendos, que prefere embolsar lucros rápidos, com o embarque predatório de óleo bruto.

Causa arrepios no conservadorismo igualmente: o êxito do pré-sal  é a derrota da agenda privatista.

O parque tecnológico de ponta que está nascendo na Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro, com laboratórios de todo o mundo, é uma vitória da luta pelo desenvolvimento soberano.

Um berçário da reindustrialização que se preconiza para o país.

Dali  sairão inovações e tecnologias que vão irradiar saltos de eficiência e produtividade em toda a rede de fornecedores nacionais do pré-sal.

É desse amplo arcabouço de medidas e salvaguardas que poderão jorrar os recursos do fundo soberano para erradicar as grandes iniquidades que ainda afligem a população brasileira.

Da carência na saúde, às deficiências na educação pública, por exemplo.

Tudo isso é sabido. Mas passa hoje por um corredor polonês de falsificação de perfil destinado a triturar a reputação da estatal, de seus dirigentes, de seu potencial econômico e de seu significado para a autoestima nacional.

Desqualificá-la é um requisito para reverter a blindagem em torno de uma riqueza, da qual as petroleiras internacionais e o privatismo de bico longo ainda não desistiram.

A Petrobrás passa por ajustes compreensíveis depois do gigantesco estirão desencadeado pelas descobertas do pré-sal. E do sacrifício –justificado–  de anos vendendo gasolina 20% abaixo do valor importado.

Com a inflação há quatro meses em queda, o preço do combustível será corrigido agora, sem risco de descontrole.

A gasolina, porém, é só o lastro oportunista de um pavio permanentemente  aceso contra a empresa.

A verdadeira intenção do bullying é outra.

Trata-se de promover uma alteração de perfil  no discernimento da própria sociedade.

Para  convencê-la da natureza prejudicial da presença do Estado na luta pelo desenvolvimento.

E a rejeitar, junto, quem a defende:  Dilma, favorita nas urnas de outubro, quando a Petrobrás completa 61 anos de vida.
http://www.cartamaior.com.br/?/Editorial/Alteracao-de-perfil-Lula-Dilma-Petrobras/31595

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