quinta-feira, 11 de setembro de 2014

"Há uma lenda de que sou contra os transgênicos e isso não é verdade". Discurso de Marina desmente Marina


A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT – AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) – Sr. Presidente, quero trazer a esta Casa, novamente, a polêmica dos transgênicos, que se reacende com uma série de debates nos meios de comunicação e na sociedade civil, os quais também deverão ocorrer no Congresso Nacional. 

Sr. Presidente, eu gostaria de alertar para o fato de que há várias iniciativas tramitando no Congresso: são mais ou menos dezoito na Câmara dos Deputados e duas nesta Casa, de uma das quais sou proponente. Assim, essa discussão sobre os Organismos Geneticamente Modificados (OGM) deverá tomar fôlego, pois temos uma série de novidades e de acontecimentos que podem redimensioná-la, ainda mais se considerarmos que o Executivo tem atuado para protelar a tramitação dessas matérias. 

Em 1997, apresentei uma proposta de moratória de dois anos para que a comunidade científica pudesse estudar melhor os possíveis efeitos dos transgênicos. Na época, o Presidente atualmente licenciado, Senador Jader Barbalho, tentou apensá-la, apenas, sob meu ponto de vista, para postergar o andamento da matéria. Retirei o projeto e o reapresentei em 1999, com uma nova versão, propondo que a moratória fosse de cinco anos. O Senador Lúcio Alcântara é o atual Relator dessa matéria e já chegamos a um avanço nas discussões, reduzindo o prazo de cinco anos para três, mas até o presente momento não foi apresentado o relatório de S. Exª na Comissão de Assuntos Sociais, o que aguardo, porque a discussão está novamente no centro dos debates, tanto dos meios de comunicação, quanto do Congresso Nacional. 

No meu entendimento, vem ocorrendo uma certa protelação, até mesmo por parte do Congresso Nacional e do Executivo – não digo de todos os segmentos e de todas as autoridades envolvidas –, e observamos também uma certa ansiedade, por parte das autoridades, com a liberação dos transgênicos, precipitada e de difícil compreensão. 

Os Ministérios do Meio Ambiente e da Saúde têm tido uma posição cautelosa. Mas os Ministérios da Ciência e Tecnologia e o da Agricultura, bem como a CTNBio, têm agido de forma pouco compreensível, já que essas instituições públicas deveriam se adequar ao que prescreve a Constituição Federal: não havendo a segurança quanto aos riscos para o meio ambiente e para a saúde humana, dever-se-ia agir de acordo com o princípio da precaução. Lamentavelmente, os Ministérios da Agricultura e da Ciência e Tecnologia, assim como a CTNBio, no meu entendimento, têm agido precipitadamente ao querer licenciar para cultivo os transgênicos até de forma exacerbada em nosso País. 

Já não tem a mesma postura o Poder Judiciário que, na prática, mantém uma moratória aos transgênicos – por decisão judicial, baseada principalmente no art. 225 da Constituição Federal e no Código de Defesa do Consumidor. Mesmo assim, em oposição, parte do Poder Executivo tenta açodadamente, por todos os meios, liberar a produção comercial dos transgênicos no País. 

O que vemos, portanto, é, de um lado, o Judiciário zelando pelo princípio da precaução no trato com a saúde pública e o meio ambiente, no interesse da sociedade, sob as mais variadas pressões políticas e corporativas, e, de outro lado, parte do Executivo – sobretudo os Ministérios da Agricultura e da Ciência e Tecnologia – com iniciativas no sentido de atender aos interesses pretensamente econômicos, mas que no fundo estão associados a grandes grupos transnacionais de biotecnologia que ambicionam o mercado brasileiro. 

Esse açodamento chegou ao ponto de o Ministério da Agricultura fazer estranhas declarações sobre a liberação dos OGMs no País, que afrontam o Judiciário em suas prerrogativas e ainda estimulam a desobediência à legalidade – como vem acontecendo no Rio Grande do Sul, onde alguns agricultores estão plantando, de forma clandestina, sementes transgênicas. 
A afronta ao Poder Judiciário resultou em despacho recente do Juiz Tourinho Neto – do Tribunal Regional Federal – intimando os responsáveis pela Pasta da Agricultura a formalmente prestarem esclarecimentos à Justiça. 

No entendimento do Ministério Público, uma medida provisória promulgada em dezembro passado e um decreto recém-editado sobre normas de rotulagem podem invalidar uma decisão judicial anterior sobre os OGMs. O Ministério Público e o juiz federal entendem que nenhum ato do Executivo tem poder legal para invalidar uma decisão judicial. 

Sr. Presidente, temos, ainda, alguns aspectos que nos levam a justificar e a concordar com o que vem fazendo a Justiça, principalmente a partir do Ministério Público, no sentido de optar pelo princípio da precaução. Para que se entenda qual é a polêmica que envolve os transgênicos, ressalto alguns aspectos. 

Os transgênicos são seres vivos que têm o seu genoma – o DNA – alterado. Acrescenta-se ou suprime-se um gene a um organismo de modo a alterar suas características originais, conferindo-lhe novas propriedades. 

Essa nova técnica vem-se implantando no mundo por multinacionais de sementes e agrotóxicos, muitas vezes apoiadas e seguidas por laboratórios públicos de pesquisa que vêem numerosas vantagens na utilização de alterações genéticas. Os argumentos mais difundidos baseiam-se no apelo de resolver o problema da fome no mundo e na redução no uso de agrotóxicos. 

No entanto, quem contesta esses argumentos não são apenas ecologistas radicais, como querem fazer pensar alguns. Existem pesquisadores ligados à FAO que asseguram que para alimentarmos os oitocentos milhões de famintos em todo o mundo não precisaremos de transgênicos agora. Eles dizem que esses organismos são caros e exigem estudos prévios e medidas de precaução quanto à saúde e ao meio ambiente. Com certeza, por não termos essa segurança, talvez não seja adequado corrermos os riscos, sob a argumentação de que estaríamos contribuindo para alimentar a população faminta do planeta, até porque sabemos que internacionalmente existe produção suficiente de grãos para suprir essa necessidade. Não existe, contudo, a distribuição adequada das riquezas. Por isso temos tantos famintos. Só no Brasil somam 50 milhões de pessoas abaixo da linha de pobreza. 

No Brasil, por decisão judicial, só é permitido o cultivo experimental de OGMs, e os licenciamentos têm-se baseado nos pareceres da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança. Além do EIA-RIMA, é exigido um Registro Especial Temporário (RET), que tem de ser fundamentado em avaliações agronômicas e de risco à saúde e ao meio ambiente realizadas pelos Ministérios da Agricultura, da Saúde e do Meio Ambiente. 

Mas a Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde assegurava, no início do ano, que não existia o Registro Especial Temporário para qualquer cultura transgênica em plantios experimentais no País. Ou seja, a CTNBio tem proferido pareceres favoráveis a esses testes de campo sem o parecer dos Ministérios afins – o da Saúde e do Meio Ambiente –, que são exatamente os responsáveis por uma avaliação sobre os prejuízos à saúde ou ao meio ambiente. 

Em abril passado, a Justiça concedeu liminar aos Procuradores Aurélio Rios e Alexandre Assis pela suspensão das lavouras experimentais de OGMs, por não terem Registro Especial Temporário. Segundo o Procurador Rios, o MPF poderia inclusive processar autoridades governamentais por improbidade administrativa. 

Apesar dessa determinação judicial, até o momento não se tem notícia de qualquer campo experimental desativado. Ao contrário, o Ministro Pratini de Moraes e seu Secretário Executivo Márcio Fortes têm declarado repetidamente que em breve será oficialmente liberada a produção comercial de OGMs no Brasil. 

A Medida Provisória de dezembro de 2000, sem respeitar o prazo de 5 dias para avaliação do Congresso Nacional, vincula o parecer técnico da CTNBio à permissão que cabe aos Ministérios da Saúde, da Agricultura e da Ciência e Tecnologia, numa tentativa de suprir deficiência legal alegada na decisão judicial que proíbe os transgênicos no mercado brasileiro. 

Com a mesma motivação, editou-se o Decreto nº 3.871, que deverá entrar em vigor em 31 de dezembro deste ano. Nos termos desse decreto, só serão rotulados os produtos que tenham recebido parecer técnico favorável da CTNBio e contenham acima de 4% de resíduos de OGMs em sua composição. Enquanto isso, o Parlamento Europeu adotou formalmente a moratória por três anos. A seguir, a União Européia baixou normas de rotulagem mais rigorosas, que obrigam a identificação de qualquer porcentagem de resíduo transgênico nos alimentos. Ou seja, no Brasil, está-se fazendo uma rotulagem que, do meu ponto de vista, é de fachada, porque só considera necessária a rotulagem se na composição dos alimentos houver cerca de 4% de resíduos de OGMs. Isso em cada produto. Mas não considera que, se houver 2% no milho, 2% na soja, isso já significaria um processo cumulativo para caracterizar a rotulagem. 

Além do mais, na Europa, em que há hoje toda uma preocupação com os OGMs, em função da experiência drástica que estão vivendo com o fenômeno da vaca louca, decidiram fazer a rotulagem para qualquer percentual de OGM na composição dos alimentos. 

De sorte que o Brasil está propondo uma forma de rotulagem que, sob o meu ponto de vista, é apenas uma espécie de medida “para inglês ver”. Retifico: para inglês ver não é, porque os europeus já estão bastante cuidadosos. No caso, é para os brasileiros verem. 

Se considerarmos que, no Brasil, não se tem o hábito de verificar no rótulo a composição dos alimentos, o problema se torna ainda mais grave, ou seja, essa medida da rotulagem aqui não tem o devido alcance. Mas poderíamos estar fazendo uma rotulagem em acordo com o que já vem acontecendo na Europa. 

A excessiva tolerância do Governo brasileiro para com as grandes empresas do setor, em detrimento dos princípios básicos de precaução, motivou um pedido de CPI e a formação de uma Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara dos Deputados. Essa Comissão atualmente realiza uma série de audiências públicas em que são analisados processos de liberação dos campos experimentais de transgênicos. 

Os transgênicos comercializados até o momento não foram gerados para serem mais produtivos, mas para resistir a herbicidas e/ou matar insetos: 76% dos transgênicos desenvolvidos até hoje são resistentes a herbicidas; 19% são cultivos inseticidas bt, que são plantas estéreis, ou seja, as sementes não se reproduzem. Essas plantas têm um controle absoluto por parte das multinacionais, e os produtores terão, a cada momento, de comprar as sementes, ficando numa dependência total das empresas e das transnacionais que as produzem. Finalmente, 7% combinam as duas características, isto é, são resistentes a herbicidas e são sementes que não se reproduzem. 

O cientista Charles Benbrook publicou trabalho em maio deste ano, demonstrando que a soja transgênica tem produtividade 2% a 8% menor que as variedades convencionais e exige, em média, de 11% a 30% mais agrotóxicos. 

Na Argentina, em apenas três anos, para uma mesma área plantada com transgênicos, o consumo de herbicida RR da Monsanto triplicou. As plantas saturadas com o herbicida são, posteriormente, utilizadas na alimentação de animais. A polinização cruzada entre plantas transgênicas e não-transgênicas tem provocado contaminações indesejáveis e imprevisíveis a determinados ecossistemas. Basta verificarmos que, na França, registram-se casos de contaminação com a couve, o milho e a soja. Nos Estados Unidos, o pólen do milho estéril da Monsanto, depositado em outras plantas por ação natural do vento, matou borboletas monarca que não eram pragas, ou seja, a planta é produzida para matar as pragas, mas acaba matando outras espécies. 

Na Alemanha, estudos divulgados, na semana passada, em campos de cultivo de canola transgênica, demonstraram que, nos intestinos de abelhas, foram encontradas bactérias com DNA alterado. Isso comprova que uma seqüência de DNA geneticamente alterada pode ser transferida para outro organismo que não seja planta. 

Porém, o caso que mais chamou a atenção deu-se no Canadá, em abril passado, quando um juiz sentenciou um agricultor a pagar milhares de dólares à Monsanto por “violar” o monopólio que aquela empresa gigante detém sobre uma determinada semente transgênica de canola. No Canadá e nos Estados Unidos, é ilegal que os agricultores reutilizem sementes patenteadas.

Alerto para o fato de que a dependência total dos agricultores dessas sementes que são patenteadas, que não podem mais contar com a velha fórmula dos agricultores tradicionais de fazerem o melhoramento natural das suas sementes, de armazenarem as melhores sementes para o plantio, pode levar até mesmo a uma crise no que se refere à alimentação no Planeta, porque, em vez de haver um estudo científico que possibilite às pessoas terem melhores sementes, realmente há sementes aparentemente melhoradas, mas estas são monopolizadas por essas empresas, e qualquer agricultor que delas queira lançar mão terá que pagar por elas. E aqueles, como no caso aqui citado, ocorrido no Canadá, que fizerem isso sem a compra, de moto próprio, poderão ser multados e condenados pela Justiça a pagar multas vultosas. 

Diante desse quadro todo que acabo de relatar, Sr. Presidente, há uma série de reações que vale a pena registrar aqui. Existe um raciocínio, por parte de alguns cientistas e até mesmo de alguns colegas, de que a visão crítica referente aos transgênicos seria atrasada, de ir contra a ciência, de não se querer o avanço científico. Refuto todas e quaisquer acusações dessa natureza. Não somos contra as experiências e os estudos que estão sendo feitos em campos experimentais. Somos contra que esses estudos e experimentos sejam feitos sem se cumprir a norma legal, sem a observância do devido aspecto de cautela diante de determinadas circunstâncias e do açodamento por parte de alguns segmentos do Governo em querer liberar para a comercialização o cultivo dos transgênicos. 

Então, há uma reação em todo o mundo. Note-se que a União dos Agricultores do Canadá pediu a moratória nacional à produção, importação e distribuição de alimentos transgênicos. Com o apoio dos produtores de trigo do Estado de Dakota do Norte, nos Estados Unidos, foi decretada moratória ao cultivo de trigo transgênico que a Monsanto pretende comercializar a partir de 2003. 

Em março deste ano, a União Nacional dos Agricultores dos Estados Unidos apoiou a moratória contra a introdução, certificação e comercialização do trigo geneticamente modificado, até que questões relacionadas à polinização cruzada, responsabilidade sobre danos, estoque, segregação e aceitação de mercado sejam devidamente analisadas e resolvidas. Isso está acontecendo nos Estados Unidos, no berço da Monsanto. 

O Congresso local do Estado de Indiana, nos Estados Unidos, definiu por decreto, no mês passado, direito dos agricultores guardarem sementes para replantio. 
No Japão, há uma movimentação no sentido de fazer o mesmo que hoje está sendo feito pela Comunidade Européia. 

A cautela européia tem base no traumático caso da “vaca louca”, em que os efeitos de uma experiência com ração animal, nos anos 80, produziu uma doença fatal – alimentou-se o gado bovino, herbívoro por natureza, com ração composta de proteína animal. 

Tenho certeza de que, à época, se aqueles que patentearam a ração com proteína animal para o gado na Europa fossem questionados, diriam que os críticos eram pessoas fundamentalistas, ambientalistas que não queriam o progresso e o avanço tecnológico. Também tenho certeza de que, se a mesma discussão tivesse sido introduzida aqui no Congresso ou aqui no Senado, muitos se levantariam para dizer que se trata de uma posição retrógrada, contra a ciência, que não quer o avanço tecnológico. Defenderiam que a ração com a proteína animal destinada a animais herbívoros não teria nenhum problema, que era um avanço da ciência. No entanto, a experiência mostra que essa ração fornecida a animais herbívoros por natureza constituiu-se num grande problema para a Comunidade Européia, acarretando a doença da vaca louca. 

Infelizmente, esses exemplos não são suficientes para os nossos modernizadores de plantão. A todo o momento, eles pensam que aquilo que acontece no “mundo desenvolvido” deve ser implementado no nosso País, ao arrepio da lei. Mesmo quando se questionam essas inovações tecnológicas em seus países de origem, mesmo quando eles já estão voltando atrás, certos brasileiros pensam que tudo isso deve ser implementado em nosso País, pois devemos passar por todos os processos históricos já experimentados por aqueles. 

Essa visão da História não como um processo cumulativo, mas como um processo linear é completamente equivocada. Alguns pensam que devemos passar por todas as experiências vividas por aqueles que nos antecederam. No entanto, a História é dialética e, por isso, não precisamos repetir, aqui no Brasil, as experiências fracassadas dos Estados Unidos e da Europa. Não podemos ser, pura e simplesmente, a lixeira desses inventos. 

No caso da multinacional Monsanto, por exemplo, a empresa já começa a perder o mercado europeu e corre o risco de perder o mercado japonês. Diante disso, ela não quer, em hipótese nenhuma, que o Brasil seja uma área livre de transgênicos, porque isso nos levaria a ser mais competitivos no mercado internacional. Eles gostariam, sim, que o Brasil fosse como a Argentina, o Canadá e os Estados Unidos, para que não tivéssemos chance de concorrer com eles. E realmente somos uma ameaça para a referida multinacional, porque a nossa soja, mesmo com a hipótese de que boa parte dela esteja contaminada pelo cultivo clandestino, é mais vantajosa para os importadores europeus do que a soja proveniente do Canadá e dos Estados Unidos. Tal fato ocorre porque, quanto à soja brasileira, são menores os investimentos para os testes de controle da qualidade e da quantidade dos OGMs. 

Diante do exposto, Sr. Presidente, temos uma vantagem diferencial em termos econômicos. Não sei por que o Governo brasileiro não revê sua estratégia econômica, já que a Argentina, o Canadá, os Estados Unidos não têm mais condições de serem zonas livres de transgênicos. Só o Brasil tem esse potencial, e deveríamos aproveitá-lo, em vez de contaminar nossa produção, comprometendo, talvez, o futuro da nossa soja. 

Dos três maiores produtores mundiais de soja, o Brasil é o único sem transgênicos. Há, no entanto, denúncias no sentido de que agricultores gaúchos estejam plantando soja transgênica clandestinamente, o que faz com que os europeus exijam testes também da soja brasileira, ainda assim com custo bem menor que a segregação, controle e certificação, possível apenas parcialmente, dos produtos americanos e argentinos. 

Como a Europa constitui-se no maior importador de grãos do planeta, a preferência pelo Brasil fez a exportação nacional triplicar nos últimos cinco anos. Segundo o diretor da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais, Sérgio Mendes, "antes não vendíamos entre setembro e março, que é o período da safra americana”. Agora, mesmo no período da safra americana, estamos vendendo porque temos esse diferencial de qualidade ao qual já me referi anteriormente. 

Tal sucesso ameaça os concorrentes, que se apressam em divulgar denúncias de plantios clandestinos e a pressionar o Governo brasileiro pela liberação imediata dos transgênicos no Brasil, alternando ameaças de desobediência às determinações judiciais com discursos pró-modernidade e progressos científicos ­ ora por parte de representantes dos grupos transnacionais que investem nos organismos modificados, ora por parte de setores do Executivo Federal. Contudo, devo ressaltar aqui, até por uma questão de justiça, que o Ministério do Meio Ambiente, assim como o Ministério da Saúde, têm tido uma posição cautelosa; mas vejo açodamento por parte do Ministério da Agricultura e da Ciência e da Tecnologia. 

Sr. Presidente, quero ainda informar que houve decisão judicial pela destruição dos cultivos e dos experimentos que estão sendo feitos, por não contarem com o registro especial provisório. Todavia, no Estado do Paraná, o Ibama, ao invés de cumprir a determinação judicial, deu um prazo de 10 dias para os produtores. Ontem, em conversa com o Presidente do Ibama, Dr. Casara, dei conhecimento a ele dessa denúncia que havia chegado a mim, e ele determinou que seja cumprida a decisão judicial. Disse também que as autoridades responsáveis por seu cumprimento não podem conceder prazos às empresas, possibilitando que estas consigam tempo para talvez se livrar da referida decisão judicial. 

Não quero aqui fazer uma guerra santa contra os transgênicos. Pelo contrário, só quero que o Brasil pense estrategicamente, que respeite a nossa legislação, que esteja atento ao que diz a nossa Constituição no que concerne ao princípio da precaução. Igualmente, que as autoridades competentes não fiquem fazendo o jogo das multinacionais, que já estão observando que a Comunidade Européia já instituiu a moratória de três anos, já estabeleceu a rotulagem para qualquer quantidade de transgênicos em seus produtos. O Japão também está fazendo uma discussão no sentido de não querer os transgênicos no seu país. Contudo, no Brasil, que poderia ser uma zona livre de transgênicos, investiremos numa tecnologia que não está mais sendo aceita nas demais regiões do planeta. Até mesmo nos Estados Unidos e no Canadá, a opinião pública está bastante crítica em relação a esses produtos que contêm OGMs. 

Dessa sorte, faço aqui um apelo em favor de meu projeto da moratória, que não é mais de cinco anos, mas de três anos, porque fizemos uma equiparação com o que está ocorrendo na Europa: eles pediram três anos de moratória, e também adotaríamos o mesmo prazo. E tenho certeza de que os produtores de grãos no Brasil, aqueles que pensam estrategicamente, aqueles que não querem apenas fazer o jogo das multinacionais saberão aproveitar essa oportunidade de sermos uma zona livre de transgênicos. Com isso, poderemos abastecer o mercado europeu, que tem hoje uma visão bastante crítica em relação a essas “inovações científicas” que causam alguns prejuízos, como o que aconteceu com a ração com proteína animal destinada a animais herbívoros por natureza e que hoje padecem da doença da vaca louca. 

Somos um País com megadiversidade. Por isso, jamais poderemos introduzir sementes estéreis sem conhecer exatamente as repercussões nos ecossistemas, que poderão ser irreversivelmente prejudicados. Não podemos dispensar a polinização natural das plantas, efetivada pelos ventos ou pelos insetos. 

Aproveitando a presença do Líder do Governo, faço um apelo para que o projeto da moratória possa tramitar, com todo o respeito que tenho pelo meu Colega, Senador Lúcio Alcântara. Quero também fazer este apelo ao Senador, já que a Relatoria está com ele. Sei que ele é uma pessoa sensível às questões ambientais e, com certeza, agirá de acordo com o desejo da opinião pública nacional e também dos setores especializados, que fazem uma crítica responsável com relação a esse açodamento do Ministério da Agricultura e do Ministério da Ciência e Tecnologia. 

O Sr. Romero Jucá (Bloco/PSDB – RR) – Permite-me V. Exª um aparte? 

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT – AC) – Ouço V. Exª, Senador Romero Jucá. 

O Sr. Romero Jucá (Bloco/PSDB – RR) – Senadora Marina Silva, gostaria de fazer o registro de que o Governo e sua Liderança vão buscar o debate, a finalização dessa questão, que está sendo discutida mundialmente e interessa ao País. V. Exª pode ficar certa de que buscaremos o entendimento no sentido de defender o nosso País. 

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT – AC ) – Agradeço o aparte de V. Exª. Envidarei todos os esforços para votarmos, o quanto antes, esse projeto. 

Se as autoridades brasileiras tivessem uma compreensão mais estratégica dessa problemática, estariam fazendo uma série de discussões junto ao setor produtivo, no sentido de orientar como deverá ser o comportamento dos nossos agricultores, para que não venham a comprar gato por lebre, já que as empresas produtoras dessas sementes geneticamente modificadas, para não afundarem sozinhas, querem, a todo custo, fazer com que eles embarquem na canoa dos transgênicos. Elas têm medo, tenho certeza, de que o Brasil constitua uma grande alternativa de grãos que não estejam contaminados pelos OGMs, porque poderíamos fazer concorrência com as suas sementes, que realmente começam a sofrer uma série de críticas e cuidados por parte dos segmentos mais conscientes em relação ao meio ambiente e à saúde. 

Agradeço ao Presidente. Extrapolei o tempo, mas senti a necessidade de fazer este pronunciamento, porque estamos em uma discussão que considero altamente importante do ponto de vista ambiental e social e no que se refere à vantagem econômica que poderemos ter, ao nos instituirmos como zona livre de transgênicos. 

http://www.senado.gov.br/atividade/pronunciamento/detTexto.asp?t=316593

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